Com lágrimas nos olhos, Mohammed al Sabbagh gritou ao telemóvel implorando à sua sobrinha para "manter-se forte" enquanto ela definhava sob os escombros em Gaza.

A chamada aconteceu no início do calvário de três dias vivido por Hala Hazem Hamada, de 15 anos, que finalmente foi resgatada esta terça-feira após um ataque mortal israelita que deixou seis dos seus familiares mortos, incluindo os seus pais.

Soldados israelitas chegaram no sábado ao complexo residencial onde a família de Hala se refugiou, vinda do norte de Gaza, nos arredores da cidade de Khan Yunis, ao sul.

O Exército israelita afirmou ter vasculhado "infraestrutura terrorista" na área e detido supostos "terroristas".

Hala disse à AFP que os soldados pediram aos moradores por altifalante que deixassem as suas casas, mas antes que ela e a sua família pudessem fazê-lo, "a casa começou a desabar sobre nós", destruída por um trator.

O Exército israelita não respondeu nesta quarta-feira a um pedido de comentário sobre os acontecimentos.

"Os atiradores dispararam contra todos na família, exceto a minha irmã e eu", acrescentou Hala. "A minha irmã Basant disse-me 'estou com medo, salva-me. Não consigo mexer-me. Tenho escombros sobre os meus pés e o meu pai está em cima da minha perna, não consigo mover-me'".

Depois, Basant caiu e Hala ficou sozinha, esperando por horas antes de ser resgatada. Basant, de 19 anos, foi uma das seis mortas.

A guerra em Gaza começou com o ataque do movimento islamista Hamas em 7 de outubro, que deixou cerca de 1.160 mortos em Israel, principalmente civis, segundo um balanço da AFP baseado em números israelitas.

A resposta israelita matou pelo menos 30.717 pessoas, a maioria mulheres e crianças, de acordo com o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas.

Um jornalista da AFP gravou quando Mohammed al Sabbagh dava palavras de encorajamento à sua sobrinha pelo telefone. "Fica a salvo e mantém-te forte. Se houver algo à tua volta, come para manteres-te firme até que cheguemos até ti", disse.

"Eu juro por Deus, não sabemos como alcançar-te [mas] estamos tentar. Não te preocupes, vamos chegar." Mas a resposta de Hala foi desanimadora. "O meu pai está coberto de sangue. Ele estava a respirar mas agora parou", contou.

Nesta quarta-feira, Hala relatou o resgate à AFP a partir de uma cama de hospital na cidade de Rafah, no sul.

"Começaram a remover os escombros e a cortar as barras de aço até me retirarem. Quando o fizeram, colocaram-me numa maca", lembrou.

Embora não tenha sofrido ferimentos graves, ela estava a tentar recuperar fisicamente após tanto tempo sem comida nem água, ao mesmo tempo em que lidava com o trauma e a perda que sofreu.

"Sobrevivi, mas quero ver a minha família pela última vez", expressou. "Vi a minha irmã e o meu pai, mas eles não foram retirados. Ainda estão sob os escombros. Quero vê-los pelo menos para me despedir".