A 11 de fevereiro de 2007, o ‘sim’ venceu o referendo sobre a despenalização da Interrupção Voluntária da Gravidez mas, à semelhança das duas anteriores consultas populares nacionais, não foi juridicamente vinculativo, uma vez que não cumpriu o ponto 11 do artigo 115.º da Constituição que estabelece que o “referendo só tem efeito vinculativo quando o número de votantes for superior a metade dos eleitores inscritos no recenseamento”.

Questionados pela agência Lusa, todos os partidos com assento parlamentar rejeitaram alterar este critério. O PS, BE e PAN foram perentórios na recusa de referendos sobre questões de direitos fundamentais enquanto o PSD considerou esta posição “absolutamente demagógica”.

O deputado do PSD e antigo ministro da Presidência, Luís Marques Guedes, sustentou que “a regra da ‘vinculatividade’ do referendo não deve ser alterada porque fazê-lo é transformar o próprio modelo do sistema político português”.

No entanto, os sociais-democratas consideram que faz sentido “alterar a lei do referendo em matérias como o referendo constitucional e a proibição que atualmente existe dos referendos poderem coincidir com atos eleitorais”.

No PS, a secretária-geral adjunta, Ana Catarina Mendes, sublinhou a importância de dar “maior credibilidade à política”.

Neste sentido, apesar de  do referendo neste momento, o PS reconhece “a necessidade de os partidos políticos, os movimentos e as associações estarem cada vez mais junto dos cidadãos e poderem levar a uma maior participação dos cidadãos”.

Já José Manuel Pureza, deputado e dirigente do BE, considerou que a fraca adesão às consultas populares não se prende “predominantemente com uma questão de lei”, embora o BE “não feche a porta a alterações legislativas que afinem o regime do referendo”, referindo que “a vinculatividade dos 50% + 1 é um mecanismo de prudência” que deve ser mantido.

“A utilização do referendo para criar ruído político faz com que a generalidade das pessoas desconfie da sua utilização”, lamentou o dirigente bloquista.

Pelo CDS-PP, o líder da bancada parlamentar, Nuno Magalhães recusou uma alteração à lei “no sentido de procurar fazer uma vinculação artificial”, uma vez que disse não acreditar “em soluções legislativas feitas à medida e que venham ao encontro” da vontade política dominante.

“Essa reflexão não foi feita pelo partido. Agora, do ponto de vista da atitude, se a questão for suscitada e se revisitando a lei chegarmos à conclusão de que algum tipo de disposições não tenham funcionado tão bem, estamos disponíveis pelo menos para avaliar”, assegurou o centrista.

O deputado do PCP António Filipe começou por explicar que não há nenhuma posição assumida pelo PCP sobre esta questão, mas recordou que, “politicamente, o resultado do referendo foi sempre considerado vinculativo, apesar de juridicamente nenhum o ter sido”.

“Não foi por acaso que essa norma foi consagrada já que considera menos legítimo constitucionalmente um referendo em que as pessoas não participem. Faz sentido que a Constituição tenha feito essa exigência”, justificou.

“Os Verdes”, através da parlamentar Heloísa Apolónia, a norma da ‘vinculatividade’ também não deve ser alterada, apesar de considerar que “esta questão é muito mais formal porque os resultados dos referendos acabam por ditar a opção política”, independentemente de o resultado não ter valor jurídico.

Já André Silva, o deputado único do PAN, defendeu que se deve manter esta norma “precisamente para vincular qualquer decisão e sobretudo pelos resultados das anteriores votações”, considerando que os referendo são ferramentas “com uma importância que deve ser contextualizada e devem servir para reforçar uma cultura mais democrática e participativa”.

Os três referendos nacionais realizados até hoje em Portugal após o 25 de Abril de 1974 — dois sobre a despenalização do aborto e um sobre a regionalização — não tiveram efeito vinculativo, uma vez que não registaram a votação de mais de metade dos eleitores inscritos.

No entanto, o poder político acabou sempre por seguir o resultado dessas consultas, ora travando a despenalização do aborto e a regionalização (ambos em 1998) ora avançando com a descriminalização do aborto (2007).