“Para estabelecer o nexo de causalidade entre a violação dos deveres de informação, por parte do intermediário financeiro, e o dano decorrente da decisão de investir, incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir”, lê-se na decisão do STJ, datada do passado dia 06 de dezembro e que visa “uniformizar a jurisprudência”, face às diversas interpretações da lei em decisões da primeira instância.

A decisão – avançada hoje pelo Jornal de Notícias (JN) e a que a agência Lusa teve acesso – dividiu os juízes conselheiros do Supremo, muitos dos quais votaram vencido, e, segundo o advogado de vários ex-clientes do BPN, tornará muito difícil aos lesados virem a recuperar o dinheiro investido.

Em declarações ao JN, o advogado Eugénio Marinho estima que “90%” dos mais de 100 lesados ainda com processo em curso na justiça irão agora perder as ações interpostas contra o EuroBic, que em 2011 comprou (enquanto BIC) o BPN, nacionalizado em 2008.

Nos termos da decisão do STJ, “no âmbito da responsabilidade civil pré-contratual ou contratual do intermediário financeiro […], incumbe ao investidor, mesmo quando seja não qualificado, o ónus de provar a violação pelo intermediário financeiro dos deveres de informação que a este são legalmente impostos e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informação e o dano”.

“Se o Banco, intermediário financeiro – que sugeriu a subscrição de obrigações subordinadas pelo prazo de maturidade de 10 anos a um cliente que não tinha conhecimentos para avaliar o risco daquele produto financeiro nem pretendia aplicar o seu dinheiro em ‘produtos de risco’ – informou apenas o cliente, relativamente ao risco do produto, que o ‘reembolso do capital era garantido (porquanto não era produto de risco’, sem outras explicações, nomeadamente, o que eram obrigações subordinadas, não cumpre o dever de informação aludido no artigo 7.º, n.º1, do CVM [Código dos Valores Mobiliários]”, refere.

Considerando que “o nexo de causalidade deve ser determinado com base na falta ou inexatidão, imputável ao intermediário financeiro, da informação necessária para a decisão de investir”, o Supremo determina, contudo, que, para estabelecer esta relação causal, “incumbe ao investidor provar que a prestação da informação devida o levaria a não tomar a decisão de investir”.

Até agora, segundo o Supremo, “os Autores não lograram provar qualquer destes factos”, pelo que “não se verifica que qualquer facto dado como provado tenha operado […] que as deficiências da informação do BPN tenham funcionado como condição desencadeadora do prejuízo do não reembolso do capital”.

“Para que tais deficiências pudessem funcionar como condição do dito prejuízo, seria necessário provar que, caso tivesse sido recebida informação completa, clara e objetiva […], o Autor não teria subscrito as obrigações”, acrescenta.

Ao JN, Eugénio Marinho refere que “a prova do ilícito sempre teve de ser feita”. Já quanto ao nexo de causalidade, “havia duas teses, e vingou aquela que é mais penosa para o lesado”, lamentou.

Os ex-clientes do BPN que recorreram à justiça têm alegado que, quando subscreveram as obrigações emitidas pela Sociedade Lusa de Negócios (SLN), na altura proprietária do banco, pensavam tratar-se de uma espécie de depósito a prazo, mais rentável, mas seguro.

Por sua vez, o EuroBic tem argumentado que a hipótese de insolvência é um risco alheio às características do produto e que, por isso, a informação então prestada aos investidores foi suficiente.

De acordo com o JN, “só entre janeiro de 2018 e dezembro de 2020, o Tribunal da Relação de Lisboa apreciou pelo menos 20 processos, dos quais 16 ganhos pelos lesados e quatro pelo EuroBic”.

“Doze tinham sido decididos de forma oposta pela primeira instância, permitindo, por isso, recurso para o STJ”, escreve o jornal, acrescentando que, “atendendo às diversas interpretações da lei, a maioria dos processos ficou a aguardar a fixação da jurisprudência”, o que agora ocorreu.

Como resultado, cada ação judicial será, agora, decidida em conformidade com a posição do Supremo.