Segundo o Requerimento de Abertura de Instrução (RAI) apresentado pelo seu advogado, Germano Marques da Silva, e a que a Lusa teve acesso, o ex-ministro da Defesa requer a inquirição, para "prova dos factos alegados", de António Costa, do chefe de Estado Maior-General das Forças Armadas (CEMGFA), Almirante Silva Ribeiro, do ex-CEMGFA António Pina Monteiro, do embaixador de Portugal na NATO, Almeida Sampaio, e do tenente-general António Martins Pereira, entre outros.
Em maio, António Costa confirmou, numa resposta por escrito à comissão de inquérito parlamentar, que teve conhecimento, na manhã de 12 de outubro de 2018, do “memorando” sobre a operação da Polícia Judiciária Militar para a recuperação do material furtado em Tancos.
Da leitura do documento, Costa retirou que revela “o objetivo preciso de recuperar o material furtado”, a “preocupação em salvaguardar a identidade de um informador” e “indicia que a Polícia Judiciária Militar procurou ocultar à Polícia Judiciária o conhecimento desta operação”.
O primeiro-ministro negou ter tido consciência em algum momento de que a Polícia Judiciária Militar estaria a “desenvolver uma investigação paralela” visando a recuperação do material furtado.
António Costa confirmou também a reunião de 12 de outubro, em que Azeredo Lopes lhe mostrou o documento da PJ Militar, afirmando que ficou “com a convicção” de que o ex-ministro “nunca o tinha visto anteriormente”.
O RAI apresentado agora pela defesa de Azeredo Lopes tem 250 páginas e nelas - de acordo com Germano Marques da Silva - o arguido "procurou mostrar neste longo requerimento como é absolutamente infundada a acusação contra si deduzida pelo Ministério Público".
"Os factos que lhe são imputados não passam de meras conjeturas, gravemente infundadas, não são suportadas em provas juridicamente relevantes", diz o RAI assinado pelo advogado, no qual se alega ainda que Azeredo Lopes é "vítima de grave injustiça" e que o "tribunal há de reconhecê-lo e declará-lo e a história dirá o porquê da acusação".
O ex-ministro da Defesa Azeredo Lopes e o antigo diretor da PJ Militar Luis Vieira, acusados no caso do furto e achamento das armas em Tancos, foram dois arguidos que pediram a abertura de instrução, uma fase facultativa do processo, dirigida por um juiz, e que serve para os arguidos contestarem a acusação e assim tentarem evitar ir a julgamento.
A instrução do processo de Tancos será dirigida pelo juiz João Bártolo.
No RAI, a defesa do ex-ministro da Defesa, após considerações técnico-jurídicas, contrapõe à acusação que no processo de Tancos Azeredo Lopes "não está a ser perseguido pela violação dos seus deveres enquanto ministro da Defesa", mas "está a ser perseguido pelos crimes de outras pessoas, que, na opinião do MP, são crimes resultantes, ou consequência, da presumida mas totalmente falsa violação dos deveres do ministro da Defesa Nacional".
A defesa rebate também os crimes imputados a título singular a Azeredo Lopes (abuso de poderes e denegação de justiça) pelos factos relacionados com o Memorando de 20 de outubro de 2017, em que a acusação parece apontar para a omissão de denúncia ou participação (disciplinar e/ou criminal) por parte de Azeredo Lopes.
"No essencial, a acusação baseia-se, sobretudo, num ponto fundamental: O de que Azeredo Lopes alegadamente sabia do plano de investigação paralelo ou clandestino que estaria a ser desenvolvido pelo PJ Militar, e nada teria feito para o impedir", observa Germano Marques da Silva, que, após outras considerações, conclui que "independentemente da falta de fundamentação da acusação, não há sequer fundamento legal" para imputar o crime de abuso de poder, porque Azeredo Lopes, enquanto ministro da Defesa, não foi "funcionário" e são os funcionários públicos que são "obrigados a denunciar os crimes de que tenham conhecimento no exercício das duas funções".
Além de rebater todos os crimes imputados, a defesa requer no RAI a junção de documentos, incluindo movimentos bancários de Azeredo Lopes e a agenda do ex-ministro da Defesa de agosto de 2017. Requer ainda que seja declarada a separação do seu processo em cumprimento do Código de Justiça militar, dado ser "a conexão ilegal".
O processo de Tancos tem 23 pessoas acusadas, entre as quais Azeredo Lopes, que se demitiu do cargo em outubro de 2018 na sequência das revelações e da polémica em torno do caso.
Aos arguidos são imputados crimes como terrorismo, associação criminosa, denegação de justiça, prevaricação, falsificação de documentos, tráfico de influência, abuso de poder, recetação e detenção de arma proibida.
Nove dos 23 arguidos foram acusados de planear e executar o furto do material militar dos paióis nacionais e os restantes 14, entre os quais Azeredo Lopes, da encenação que esteve na base da recuperação do equipamento. O ex-ministro da Defesa foi acusado de prevaricação e denegação de justiça, abuso de poder e favorecimento pessoal.
O caso do furto das armas em Tancos foi divulgado pelo Exército a 29 de junho de 2017 com a indicação de que ocorrera no dia anterior, tendo a alegada recuperação do material de guerra furtado ocorrido na região da Chamusca, Santarém, em outubro de 2017, numa operação que envolveu a PJ Militar, em colaboração com elementos da GNR de Loulé.
Vários militares da GNR de Loulé foram acusados no processo.
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