“Logo na manhã seguinte à publicação do referido parecer [da IGF], 9 de março, os meus advogados contactaram a TAP”, para averiguar os montantes líquidos a devolver, disse Alexandra Reis, na comissão de inquérito à TAP, acrescentando que insistiu pelo menos três vezes junto da companhia aérea para que lhe faça chegar aquela informação. “Continuo a aguardar essa indicação para que se possa proceder à devolução”.

"Eu vou devolver", declara. "Não quero um euro que não seja devido", mesmo sendo, de um ponto de vista jurídico, "altamente discutível que decorridos mais de 12 meses sobre a atribuição da indemnização, eu tenha a obrigação de a devolver".

"Mas mesmo assim, como afirmei, irei devolver", sublinha, estando apenas a aguardar o montante líquido.

Questionada sobre se antes da audição reuniu com algum membro do PS, Alexandra Reis respondeu negativamente, acrescentando que não reuniu com nenhum membro de qualquer partido.

No que toca à sua saída da companhia, declara que aceitou “sair de uma empresa com total boa-fé", entregando-se com todo o seu compromisso. Mas esclarece que não tomou "a iniciativa de sair", simplesmente acedeu "a uma solicitação da TAP".

"Pediram-me para sair da empresa", diz Alexandra Reis. "A CEO informou-me que queria que eu saísse da empresa. Entendi aquele pedido... confesso que talvez ainda não entenda perfeitamente as razões que o motivaram, mas entendi que me estavam a pedir da empresa, não me estavam a pedir para renunciar a um mandato".

“Eu quero que saias da empresa”, foi o que, segundo Alexandra Reis, a presidente executiva da TAP lhe disse, tendo deixado claro que queria que saísse não só de administração, mas da empresa e que lhe pediu “confidencialidade sobre o assunto” numa conversa que foi presencial.

Quando a presidente executiva da companhia aérea lhe pediu para sair da empresa, foi “numa reunião muito curta”, explica. "Ela falou na primeira pessoa, não me disse que era uma decisão de equipa, e pediu-me confidencialidade", transmitindo que o Governo estava de acordo.

A ex-secretária de Estado detalhou que a presidente executiva a informou, em 25 de janeiro de 2022, que pretendia distribuir os seus pelouros e terminar os seus vínculos à empresa, "de administradora e de trabalhadora" e que iria contratar uma sociedade de advogados para tratar do processo.

"Acedi no dia seguinte, 26 de janeiro, a essa solicitação, porque não queria de forma alguma criar um problema institucional no seio da comissão executiva da TAP", realçou.

Dizendo que não está a par sobre quem do Governo sabia desta decisão, relata que perguntou a Christine Ourmières-Widener se o Governo estava “ok” com esta decisão e que a resposta que obteve foi “claro” que estava.

“Não tenho dúvidas que foi a vontade da CEO, esta é a minha convicção pessoal, a CEO queria que eu saísse da empresa. Confesso que tenho dúvidas sobre os motivos”, afirmou a ex-administradora da companhia aérea.

Alexandra Reis disse que não ficou claro, para si, na altura, as razões para a presidente executiva, Christine Ourmières-Widener, querer que a então administradora cessasse todas as funções que desempenhada na TAP e adiantou que, num telefonema cordial com o então secretário de Estado do Tesouro, Miguel Cruz, este pareceu-lhe “muito surpreendido” com a sua saída.

“Entretanto li o relatório da IGF, onde li divergências irreconciliáveis, ontem [terça-feira] ouvi falar de organização, ouvi falar de perfil, por isso para mim não são claras as razões. O que posso dizer é que, relativamente à minha atuação na empresa, sempre tive uma relação cordial e de trabalho com todos os membros do Conselho de Administração e da Comissão Executiva, que me parece normal que haja algumas diferenças de opiniões sobre alguns assuntos, parece-me até salutar, […] sempre o fiz de forma muito construtiva”, salientou.

A ex-secretária de Estado disse não considerar “de todo verdade” que aquelas divergências tivessem que ver com o plano de reestruturação, sublinhando que participou na sua elaboração.

No entanto, admitiu ter expressado preocupações sobre a operacionalização de um aumento de 30% das receitas e que não acreditava que fosse possível voar toda a capacidade inscrita no plano, revista em alta em dezembro de 2021.

“Tinha havido uma alteração ao plano de reestruturação que me deixava preocupada e que, por isso, eu de forma muito transparente e entendendo que eram aqueles os meus deveres e responsabilidades, naturalmente, levantei as minhas dúvidas e deixei claro que a empresa tinha de ter um mecanismo de flexibilidade e gestão de risco adequados”, explicou.

A também ex-secretária de Estado disse ainda que, enquanto membro da comissão executiva da companhia aérea manifestou sempre de forma construtiva as suas visões, “mesmo quando estas não eram coincidentes com as da nova CEO”.

A ex-administradora começa por explicar que "o contrato da CEO verte as condições que foram acordadas entre a CEO e a tutela". A tutela pediu à TAP que redigisse "um contrato para dar suporte àquelas condições comerciais que estavam acordadas, nas quais se incluía a possibilidade de a CEO estar representada noutras organizações, e a TAP o que fez foi, solicitando apoio jurídico externo, solicitou uma redação de um contrato que vertesse aquelas condições".

"Aquele contrato foi submetido à tutela, verificado e depois disso a CEO assinou-o", esclarece. "Eu e o Ramiro Sequeira assinámos também, porque na altura éramos os dois elementos presentes na comissão executiva da empresa".

A ex-administradora da TAP declara ainda que não falou sobre a saída da empresa, nem sobre a indemnização de meio milhão de euros, com o ministro das Finanças, Fernando Medina, quando foi convidada para o Governo.

“Quando fui convidada para secretária de Estado, não falámos do meu processo de saída da TAP, nós não falámos sobre a indemnização”, afirmou em resposta ao deputado Bernardo Blanco, da IL.

O deputado liberal perguntou à ex-secretária de Estado do Tesouro como é que Fernando Medina conhecia as razões para a saída da TAP, embora tenha dito que não sabia da indemnização, ao que Alexandra Reis respondeu apenas: “Não sei”.

Já questionada pela deputada bloquista Mariana Mortágua se alguma vez tinha falado com Fernando Medina antes do convite para secretária de Estado, Alexandra Reis disse que teve apenas uma reunião na Câmara Municipal de Lisboa, quando Fernando Medina era autarca.

Esta versão é a mesma do ministro das Finanças, que, em janeiro, no parlamento afirmou crer que esteve com Alexandra Reis "enquanto presidente da Câmara Municipal de Lisboa, uma vez, acompanhada pela CEO da TAP, a propósito de um pedido que foi feito à Câmara Municipal de Lisboa, de apoio a diligências no âmbito do plano de reestruturação”.

Em resposta ao deputado social-democrata Paulo Rios de Oliveira, Alexandra Reis adiantou que, quando falou com o ex-ministro das Infraestruturas sobre o convite de Fernando Medina para o Governo, Pedro Nuno Santos já sabia.

Relativamente às "tensões" com o administrador financeiro, apontadas por Gonçalo Pires e por Christine Ourmières-Widener, a ex-administradora da TAP defendeu que divergências de opinião são normais. Garantindo que sempre manteve uma relação cordial com todos os seus colegas e com a comissão executiva, recorda apenas um momento de tensão com o CFO, depois de o responsável ter pedido tarefas à sua equipa, que ficou "confusa", tendo abordado posteriormente o assunto numa reunião. Mas esse é "o único momento", não tem mais nenhuma situação de tensão, nem com a comissão executiva, "e muito menos com o CFO".

Alexandra Reis elencou algumas divergências de opinião, transmitidas à restante equipa de gestão, que se prenderam, por exemplo, com a mudança da sede, à qual se opunha por representar encargos acrescidos, ou com contratos de 'leasing' de aviões.

Contrariamente a Christine Ourmières-Widener, que ontem admitiu sentir muitas pressões políticas a dificultar o seu trabalho, Alexandra Reis diz: "Nunca senti pressão política".

Alexandra Reis diz ainda que teria renunciado aos cargos na TAP, sem contrapartida, se o ex-ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, ou o ex-secretário de Estado, Hugo Mendes, lhe tivessem dito que preferiam que renunciasse.

“Se na altura o senhor ministro, ou o senhor secretário de Estado me tivessem dito que preferiam que eu renunciasse, eu teria renunciado, sem contrapartida”, afirmou a ex-administradora da TAP, em resposta ao deputado socialista Hugo Costa, na comissão de inquérito à companhia aérea.

A também ex-secretária de Estado disse que sentiu sentido de urgência por parte da presidente executiva, Christine Oumières-Widener, relativamente à sua saída, admitindo que, na altura, fez uma “leitura totalmente pessoal” para aquela urgência: “porque ia haver eleições e ela não sabia qual era o resultado das eleições”.

Alexandra Reis disse ainda que foram contratados novos quadros para a companhia aérea, com melhores condições, que “não escondiam” proximidade à presidente executiva.

Questionada sobre as nacionalidades, Alexandra Reis respondeu que eram franceses.

“Alguns diretores para algumas áreas eram relativamente transparentes no tipo de relação que tinham com a CEO. […] Penso que era franceses”, afirmou.

Alexandra Reis revela também que a presidente executiva da TAP quis demitir o motorista que falou sobre o uso do carro da empresa ao serviço de Ourmières-Widener para transportar familiares seus, justificando com a falta de vacinação contra covid-19.

Durante a inquirição da deputada do Bloco de Esquerda Mariana Mortágua, Alexandra Reis explicou que, em 21 de dezembro de 2021, a presidente executiva abordou-a sobre um motorista que não estava vacinado contra a covid-19 e que, por isso, não poderia continuar na empresa.

De acordo com Alexandra Reis, trata-se do mesmo motorista que partilhou “com alguma candura” que um outro motorista estaria a fazer uma deslocação “não diretamente para a CEO”.

Mariana Mortágua tinha perguntado se tinha havido alguma retaliação a este motorista por ter falado.

“Ele nunca seria despedido por não se ter vacinado, porque a vacinação em Portugal não é obrigatória e, por isso, a TAP nunca iria despedir ninguém por não se ter vacinado, isso não iria acontecer”, explicou a ex-administradora da companhia aérea, acrescentando que chegou a ser equacionada a mudança de funções do trabalhador em causa.

Após diligências levadas a cabo por Alexandra Reis, “o motorista manteve a sua função naquele lugar, porque muito rapidamente entendeu que a vacinação ia ser importante para que pudesse continuar a desempenhar aquelas funções”.

“O senhor presidente do Conselho de Administração impôs muito rapidamente uma regra relativa à utilização das viaturas e dos motoristas para situações pessoais, a generalidade dos administradores não o fazia”, acrescentou a ex-secretária de Estado.

Questionada mais tarde pelo deputado Filipe Melo, do Chega, se tinha conhecimento de uma relação familiar entre o referido motorista e um presidente de um sindicato da TAP, Alexandra Reis disse que soube da relação já depois de sair da empresa.

Este assunto surgiu na sequência de perguntas de Mariana Mortágua sobre “tensão” com a presidente executiva “relacionada com a contratação de pessoas”, referida na audição por Alexandra Reis.

“A partir de junho de 2021, a minha expectativa era que, estando o redimensionamento da empresa feito, tendo sido atingidas as métricas previstas no plano de reestruturação, […] no meu entendimento, é que a partir daquela data era muito importante que a empresa tivesse estabilidade e tranquilidade, que as pessoas que decidiram ficar na empresa, mesmo com corte salarial, tivessem a estabilidade de saber que o redimensionamento tinha terminado”, explicou a ex-administradora.

Segundo Alexandra Reis, “houve algumas situações onde pode ter sido sugerido que a pessoa A não era a pessoa certa, tinha de sair”.

“Eu, na altura, entendia que tinha de se encontrar soluções para aquela pessoa dentro da organização”, realçou a ex-administradora.

Já questionada sobre se a razão para Oumières-Widener querer que deixasse a TAP se prendia com a rejeição de uma proposta comercial apresentada à TAP por uma empresa do marido da CEO, Alexandra Reis disse não ter “nenhuma evidência disso” e que o assunto nunca foi discutido com a presidente executiva.

*Com Lusa