O confinamento parcial entrou hoje em vigor em 121 concelhos de Portugal continental onde há "risco elevado de transmissão da covid-19", aplicando-se o dever de permanência em casa, exceto para deslocações autorizadas, como compras, trabalho, ensino e atividade física.
Todavia, dada a situação, existem medidas especiais. Nestes 121 municípios, é permitida a realização de cerimónias religiosas e espetáculos, seguindo as regras da Direção-Geral da Saúde (DGS), e a nível laboral torna-se obrigatório o desfasamento horário, bem como a adoção do regime de teletrabalho sempre que as funções em causa o permitam, entre outras.
No que diz respeito a esta última parte, têm surgido algumas dúvidas. Por exemplo, quem paga as despesas extra em casa, como o custo da eletricidade? Apesar de as novas regras entrarem hoje em vigor, não há até agora indicações específicas para este caso.
Segundo a Resolução do Conselho de Ministros n.º 92-A/2020, publicada a 2 de novembro, existem alguns pontos a considerar:
- O empregador deve dar ao trabalhador "condições de segurança e saúde adequadas à prevenção de riscos de contágio decorrentes da pandemia da doença covid-19, podendo, nomeadamente, adotar o regime de teletrabalho";
- "Sem prejuízo da possibilidade de adoção do regime de teletrabalho nos termos gerais previstos no Código do Trabalho, este regime é obrigatório quando requerido pelo trabalhador, independentemente do vínculo laboral e sempre que as funções em causa o permitam", em situações concretas:
- Se o trabalhador, mediante certificação médica, se encontrar abrangido pelo regime excecional de proteção de imunodeprimidos e doentes crónicos;
- Se o trabalhador tiver deficiência com grau de incapacidade igual ou superior a 60 %;
- Se o trabalhador tenha filho ou outro dependente a cargo que seja menor de 12 anos, ou, independentemente da idade, com deficiência ou doença crónica, que, de acordo com as orientações da autoridade de saúde, seja considerado doente de risco e não possa frequentar a escola.
- O teletrabalho é também obrigatório, "independentemente do vínculo laboral e sempre que as funções em causa o permitam, quando os espaços físicos e a organização do trabalho não permitam o cumprimento das orientações da DGS e da Autoridade para as Condições do Trabalho".
- Quando não for possível adotar o regime de teletrabalho, "podem ser implementadas, dentro dos limites máximos do período normal de trabalho e com respeito pelo direito ao descanso diário e semanal previstos na lei ou em instrumento de regulamentação coletiva de trabalho aplicável, medidas de prevenção e mitigação dos riscos decorrentes da pandemia":
- Adoção de escalas de rotatividade de trabalhadores entre o regime de teletrabalho;
- Trabalho prestado no local de trabalho habitual com horários diferenciados de entrada e saída;
- Adoção de horários diferenciados de pausas e de refeições.
Todavia, as indicações que surgiram até ao momento não explicam todas as questões que estão a ser levantas. Ontem, a Presidência da República anunciou que Marcelo Rebelo de Sousa promulgou o diploma, mas ainda não se sabe o seu conteúdo.
Aos parceiros sociais, o Governo já tinha referido a intenção de criar um enquadramento para resolver problemas que surgem quando um empregador refere que não tem condições para o teletrabalho. Na proposta de lei a que o Público teve acesso, o Governo não identifica a quem cabe o pagamento de algumas despesas, nem como é que o trabalhador deve fazer para as reclamar — e em causa estão os custos de água, luz ou internet, cujos consumos podem aumentar porque são transferidos da empresa para casa.
Nesse projecto de lei, é referido que o empregador "deve disponibilizar os equipamentos de trabalho e de comunicação necessários" para que os trabalhadores possam estar em teletrabalho. Se não for possível — e o trabalhar consinta — as funções podem ser realizadas através dos meios que o trabalhador detenha, mas "competindo ao empregador a devida programação e adaptação".
Ao Público, Gonçalo Delicado, advogado na área do direito laboral na sociedade Abreu Advogados, refere que a empresa deveria disponibilizar alguns equipamentos, entre eles: Internet, uma mesa de trabalho, uma cadeira, o computador, uma impressora ou os consumíveis relacionados, por exemplo.
"Se um trabalhador não tiver uma cadeira ou uma secretária para trabalhar em casa em condições que entende que são as necessárias para a prestação da actividade, pode solicitá-las ao empregador", explica. Todavia, em alguns casos, pode não bastar à empresa entregar os equipamentos ao trabalhador para estarem garantidas "as condições necessárias" para a prestação da atividade.
No que diz respeito aos consumos de água e luz, o advogado refere ainda que está em causa o artigo 168.º do Código do Trabalho, que prevê que "na falta de estipulação no contrato, presume-se que os instrumentos de trabalho respeitantes a tecnologias de informação e de comunicação utilizados pelo trabalhador pertencem ao empregador, que deve assegurar as respectivas instalação e manutenção e o pagamento das inerentes despesas".
Para reclamar o pagamento dos custos acrescidos, o trabalhador deve provar que esse aumento "advém" do exercício da actividade em teletrabalho, explica Gonçalo Delicado ao jornal.
Apensar das questões previstas, há muitas ainda que continuam em aberto. Por exemplo, qual o valor mensal ou o limite das contas que poderiam ser pagas pelo empregador? E como se fazem as contas dos gastos extra? E o subsídio de refeições, como fica? Advogados, empregadores e trabalhadores aguardam respostas por parte do Governo.
Comentários