Na quarta sessão do julgamento do processo conexo e separado da Operação Marquês, realizado no Juízo Criminal de Lisboa, o advogado José Baptista Neto, que trabalhou para o GES desde o Brasil, admitiu ter prestado assistência a Ricardo Salgado e à mulher, Maria João Bastos Salgado, para a aquisição de terrenos que viriam a ser escriturados em 2005 para a construção de uma “casa diferenciada” das outras daquele condomínio.
Mais tarde, segundo revelou a testemunha, o casal – casado com “separação total de bens” – voltou a contactá-lo para tratar da avaliação da casa que veio a ser construída nos lotes 20 e 21 daquele empreendimento na sequência de um projeto assinado pelo arquiteto Marcelo Montoro. “Aquela casa não tem vista para o mar e é mais isolada. É maior e mais sofisticada do que as existentes”, acrescentou o advogado de 67 anos.
“Recordo-me de ser contactado para avaliação da casa, em 2011, em agosto ou setembro. [Ricardo Salgado] pediu-me que fizesse duas avaliações. Como é de difícil acesso, não é muito fácil aqui na Bahia encontrar quem queira ir, mas fizemos duas avaliações com profissionais conceituados. Fui eu que contactei os dois corretores imobiliários”, frisou, adiantando que as avaliações oscilaram entre “nove e 10 milhões de reais” e que foi ele que pagou as avaliações “devidamente autorizado” pelo arguido.
O testemunho de Baptista Neto veio corroborar a tese da defesa de Ricardo Salgado de que a transferência de 3.967.611,00 euros (originalmente 4,9 milhões de francos suíços) com origem numa conta do banco Pictet de Henrique Granadeiro para a conta titulada pela sociedade ‘offshore’ Begolino, controlada pelo antigo banqueiro, corresponderia aproximadamente ao valor atribuído nas avaliações do imóvel e que se destinaria à sua compra.
O argumento viria a ser reforçado pelo testemunho do responsável por uma das avaliações, Rogério Lima Souza. De acordo com a testemunha, a casa teve uma avaliação de 9,5 milhões de reais, um valor que corresponderia em 2011, segundo a contestação da defesa de Ricardo Salgado, a cerca de 5,5 milhões de dólares ou, mais concretamente, a 3.925.619,83 euros.
“Avaliei em 9,5 milhões de reais, mas não sabia quem eram os proprietários. Era um condomínio com muita procura naquela época, um condomínio ‘premium’ e só com gente de classe alta”, frisou o avaliador, que disse não conhecer pessoalmente o antigo líder do GES.
Já durante a manhã foi efetuada a audição de Rui Silveira, advogado e antigo membro do conselho de administração e da comissão executiva do BES. Sempre ligado ao pelouro jurídico da instituição, esta testemunha veio, essencialmente, defender que o poder de decisão não era exclusivo de Ricardo Salgado.
“Havia troca de impressões no Conselho Superior [do GES]. O trabalho de redação deste documento [regulamento do Conselho Superior] foi resultado da discussão de propostas: havia propostas de Ricardo Salgado, de Mário Mosqueira Amaral, do comandante Ricciardi, …”, salientou o advogado, enfatizando que “havia uma circulação grande de informação”.
O julgamento prossegue na próxima segunda-feira, dia em que será ouvida como testemunha a mulher do antigo banqueiro, Maria João Bastos Salgado, além das audições agendadas de Avelino Pereira Alves, João Pinho Cardão, Inácio Falcato, Isabel Vaz e Ricardo Charneca.
Ricardo Salgado responde neste julgamento por três crimes de abuso de confiança, devido a transferências de mais de 10 milhões de euros no âmbito da Operação Marquês, do qual este processo foi separado.
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