“Estamos a ponderar a possibilidade de pedirmos a demissão do presidente da Câmara de Setúbal. No dia 20 de abril questionámos a maioria CDU na Câmara de Setúbal sobre este assunto e apelámos a que a situação fosse alterada, até por uma questão de sensibilidade das pessoas que fugiram da guerra, para que não fossem recebidas por russos”, disse à agência Lusa o vereador do PSD Paulo Calado.

“A confirmar-se o que vem hoje no jornal Expresso, o caso é ainda mais grave, porque os ucranianos estão a ser recebidos por russos pró-Putin”, acrescentou o autarca social-democrata, considerando que se trata de uma “questão de Estado” que deve ser investigada pelas autoridades portuguesas.

O deputado e vereador socialista do PS na Câmara de Setúbal, Fernando José, também considera que houve “falta de sensibilidade” da maioria CDU e defende que se trata de uma situação que tem de ser revista rapidamente.

“É uma situação que tem de ser revista e alterada com caráter de urgência”, disse Fernando José à agência Lusa, adiantando que houve associações de ucranianos que se disponibilizaram para fazer o trabalho de ligação com os refugiados, mas que “não obtiveram resposta do município”.

Segundo revelou hoje o jornal Expresso, pelo menos 160 refugiados ucranianos já terão sido recebidos por Igor Khashin, antigo presidente da Casa da Rússia e do Conselho de Coordenação dos Compatriotas Russos, e pela mulher, Yulia Khashin, funcionária do município setubalense.

De acordo com o Expresso, Igor Khashin, líder da Associação dos Emigrantes de Leste (Edintsvo), subsidiada desde 2005 até março passado pela Câmara de Setúbal, e a mulher terão, alegadamente, fotocopiado documentos de identificação dos refugiados ucranianos, no âmbito da Linha de Apoio aos Refugiados da Câmara Municipal de Setúbal.

De acordo com o Expresso, Igor Khashin e a mulher terão também questionado os refugiados sobre os familiares que ficaram na Ucrânia, mas a Câmara Municipal de Setúbal garante que “nunca foi feita tal pergunta”.

O jornal Expresso refere ainda que Igor Khashin é um dirigente associativo com dupla nacionalidade, que se apresenta como “gestor de projetos”, e que as associações a que terá estado ligado estavam nos sites da Ruskyi Mir e da Rossotrudnichestvo, instituições estatais criadas pelo Kremlin para divulgar a cultura e o mundo russos, mas que, segundo fontes citadas pelo jornal, “podem servir de cobertura a elementos dos serviços secretos” da Rússia.

Contactada pela agência Lusa, a Câmara de Setúbal comprometeu-se a reagir ainda hoje em comunicado.

No parlamento, o PSD anunciou já também que vai pedir a audição parlamentar do presidente da Câmara de Setúbal e da embaixadora da Ucrânia, e solicitar esclarecimentos, por escrito, ao gabinete do primeiro-ministro.

“A ser verdade esta notícia, o PSD repudia absolutamente e considera inaceitável esta atitude por parte das autoridades locais, neste caso a Câmara de Setúbal, e de todas as entidades envolvidas”, afirmou o vice-presidente da bancada parlamentar Ricardo Baptista Leite, em declarações aos jornalistas no parlamento.

O PSD, exige, por um lado, que “sejam imediatamente interrompidas quaisquer atividades desta natureza”, dizendo que a situação ocorrida no passado na Câmara de Lisboa ainda sobre a presidência de Fernando Medina “já deveria ter servido de lição” para não facilitar a passagem de informação “aos invasores da Ucrânia”.

“E o PSD entende que tem de haver esclarecimentos: iremos fazer um pedido de audição conjunta (Comissão de Assuntos Constitucionais e Comissão de Negócios Estrangeiros) ao presidente da Câmara de Setúbal, mas também à embaixadora da Ucrânia em Portugal, que de certo modo denunciou o que se está a passar”, anunciou.

O PSD irá ainda dirigir uma pergunta escrita ao gabinete do primeiro-ministro, António Costa, que tem a tutela do Alto Comissariado para as Migrações.

“Tem de dizer de forma perentória se mantém a confiança nestas associações que têm alegados agentes pró-russos a atuar no nosso país, não pode haver complacência nesta matéria e falta de clareza no posicionamento de Portugal”, defendeu, salienttou que estas famílias são compostas “maioritariamente por mulheres e crianças”.

O deputado acrescentou que a matéria pode até vir a ser motivo de uma investigação judicial, mas disse querer ouvir primeiro as explicações quer nas audições parlamentares que requereu, quer do gabinete de António Costa.

Mas o presidente do PSD, Rui Rio, defendeu que deve ser esclarecida a situação do acolhimento aos refugiados russos na Câmara Municipal de Setúbal, preferindo ser prudente e não recorrer já à palavra investigação.

Questionado pelos jornalistas no parlamento, Rio disse querer ter “alguma prudência” em relação à notícia hoje divulgada pelo semanário Expresso.

“Aquilo lá está obriga a que se esclareça, não vou dizer investigue, que é uma suspeita brutal. Se realmente havia alguém ligado ao regime russo a questionar ucranianos sobre eles e, principalmente, aos familiares que lá ficaram, isso seria insustentável”, considerou.

“Foi assim, não foi assim, isso tem de ser esclarecido, ainda não ia para a palavra investigar”, acrescentou Rio.

PCP diz que acolhimento a refugiados em Setúbal é feito com "critérios de integração"

O PCP sustentou hoje que o trabalho desenvolvido com imigrantes no município de Setúbal, liderado por um autarca eleito pela CDU, “caracteriza-se por critérios de integração”, rejeitando exclusões ou “sentimentos xenófobos” no acolhimento a refugiados.

Numa curta resposta enviada à agência Lusa, o PCP refere que “o trabalho com imigrantes que há muito se desenvolve no município de Setúbal caracteriza-se por critérios de integração e amizade entre os povos onde não prevalecem nem exclusões nem sentimentos xenófobos”.

O partido argumenta que num momento em que “se impõe um reforço do apoio aos refugiados, em particular aos ucranianos, esta conceção humanista é ainda mais importante”.

Líder do PCP questiona se Setúbal "foi caso único"

O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, defendeu hoje que a primeira questão que se coloca no caso do acolhimento de refugiados pela câmara municipal de Setúbal é saber se "é um caso único"

Questionado pelos jornalistas no parlamento, Jerónimo de Sousa disse que, tanto quanto sabe, existe “um conjunto de câmaras que naturalmente são solidárias com os imigrantes, com os refugiados, sempre, mas sempre solidários com essas situações”.

O secretário-geral comunista defendeu que “a primeira pergunta que se coloca é de facto se isto é um caso único ou se existe uma generalidade de associações que são solidárias com os imigrantes”, após questionado se o PCP vai acompanhar os pedidos de audição no parlamento do presidente da Câmara de Setúbal anunciados por quase todos os partidos.

“Portanto não percebemos o enfoque em relação à câmara” de Setúbal, acrescentou.

Questionado se esta é uma questão sensível, dado que os dois países estão em guerra, o secretário-geral do PCP referiu que “aquela associação, aqueles que lá estão associados convivem bem uns com os outros”, ressalvando no entanto não ter “informações precisas”.

Já se esta situação pode prejudicar o PCP, Jerónimo disse desconfiar que “esse é o objetivo”.

“Mas que não é verdade, tendo em conta que existe por parte de diversas instituições essa solidariedade com aqueles que vêm para o nosso país”, defendeu.

Já se o Governo deverá esclarecer a situação, Jerónimo de Sousa disse que “sim, convém esse esclarecimento”.

“Mas eu acho que é possível esclarecer”, afirmou o secretário-geral comunista.

O presidente da Câmara Municipal de Setúbal, André Valente Martins, do Partido Ecologista "Os Verdes", foi eleito pela lista da CDU (PCP/PEV/ID) nas últimas eleições autárquicas.

Antes de retomar o debate parlamentar sobre o Orçamento do Estado para 2022, Jerónimo de Sousa, acompanhado pela líder parlamentar, Paula Santos, e pelo deputado Bruno Dias, saíram do gabinete do Grupo Parlamentar do PCP, tendo-se cruzado nos corredores com os membros do Governo.

Nessa altura, o líder comunista conversou, durante alguns minutos, com o primeiro-ministro, longe dos microfones dos jornalistas.

Chega e IL pedem audição do presidente da câmara de Setúbal

A Iniciativa Liberal requereu hoje a audição parlamentar urgente do presidente da Câmara de Setúbal para esclarecer as notícias “extremamente graves” de que o acolhimento de refugiados naquela autarquia está a ser feito “por pessoas ligadas a organizações russas”.

Em declarações aos jornalistas nos passos perdidos do parlamento, a deputada da Iniciativa Liberal (IL) Joana Cordeiro referiu que o partido “está a acompanhar com extrema preocupação” as notícias que têm chegado “pela comunicação social do acolhimento que está a ser feito na Câmara de Setúbal aos refugiados ucranianos”, referindo-se à edição do Expresso que refere que “esse acolhimento está a ser feito por pessoas ligadas a organizações russas que defendem o regime de Putin”.

“Isto é extremamente grave e temos que apurar o que se passa e por esse motivo a IL vai convocar com caráter de urgência o presidente a Câmara de Setúbal, André Valente Martins, à primeira comissão para que explique o que se está a passar na câmara de Setúbal”, anunciou.

André Valente Martins, do Partido Ecologista "Os Verdes", foi eleito pela lista da CDU (PCP/PEV/ID) nas últimas eleições autárquicas. Para os liberais é importante perceber “se de facto nesta altura o PCP está a favor da paz ou está a favor do agressor”.

A IL vai ainda pedir a audição do presidente da Associação de Ucranianos em Portugal para esclarecer “se esta situação se passa no resto do país”.

Também o Chega vai requerer a audição na Assembleia da República do presidente da Câmara Municipal de Setúbal para prestar esclarecimentos sobre uma “situação deveras preocupante”.

“Pretendemos chamar o presidente da Câmara Municipal de Setúbal ao parlamento para prestar declarações”, afirmou o deputado Bruno Nunes, eleito por Setúbal, em declarações aos jornalistas.

O deputado do Chega defendeu que também o Presidente da República “deve tomar uma posição sobre este assunto”.

“Tivemos hoje conhecimento de mais uma situação lamentável que coloca em causa a segurança de alguns refugiados ucranianos, que ao chegarem ao nosso território, nomeadamente no concelho de Setúbal, aparentemente e pelas notícias que tivemos conhecimento, foram acompanhados no seu processo de entrada no país por elementos pró-russos que terão feito inclusive chegar informações acerca das pessoas, acerca dos seus familiares ao Kremlin”, afirmou Bruno Nunes.

O deputado do Chega considerou esta situação “deveras preocupante”.

“Setúbal não é comunista, não pode ser comunista nem pode ter esta visão pró-russa”, salientou.

Livre e PAN também defendem esclarecimentos na Assembleia da República

O deputado único do Livre defendeu hoje que são necessários esclarecimentos na Assembleia da República sobre o acolhimento de refugiados ucranianos em Setúbal e pediu formação dos funcionários das autarquias em matéria de direitos humanos.

“Acompanhamos esta situação com muita preocupação e pediremos esclarecimentos, inclusive aqui [no parlamento] em sede da primeira comissão [comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias], se houver oportunidade para isso, mas também há aqui uma responsabilidade nacional de todo o encaminhamento dos refugiados pela administração pública”, disse Rui Tavares, nos Passos Perdidos do parlamento, em Lisboa, sem esclarecer se vai requerer uma audição urgente do autarca de Setúbal ou de elementos do Governo.

O deputado do Livre argumentou que o acolhimento de refugiados tem de ser acompanhado “com muita cautela”.

“As câmaras municipais, o Livre vem dizendo há muitos anos, devem ter pelouros de direitos humanos, devem dar formação de direitos humanos aos seus funcionários. Não devem deixar questões de direitos humanos a cargo de não funcionários”, completou.

Na ótica do parlamentar estão em causa eventuais riscos para os refugiados que acabaram de chegar ao país e para os familiares que ficaram na Ucrânia: “A Federação Russa tem histórico de espionagem, de recolha de informações da sua própria diáspora Portugal tem de ser um porto seguro para estas pessoas”.

O PAN defendeu igualmente que o parlamento deve ouvir o presidente da Câmara Municipal de Setúbal, André Martins, considerando estar-se perante uma "violação grosseira" dos direitos dos ucranianos.

Em declarações aos jornalistas nos Passos Perdidos da Assembleia da República, em Lisboa, a deputada única do PAN, Inês Sousa Real, disse que o partido está “a ponderar, evidentemente, apesar da autonomia do poder local, convocar o presidente da Câmara para que possa prestar todos os esclarecimentos, porque é demasiado grave aquilo que se passou”.

“É uma violação grosseira dos seus direitos [dos refugiados ucranianos]”, disse a porta-voz do Pessoas-Animais-Natureza.

Bloco questiona governo sobre o acolhimento dos refugiados em Portugal

O BE questionou hoje o Governo sobre as condições em que está a ser feito o acolhimento dos refugiados em Portugal e se está garantida “a idoneidade do processo”, pretendendo saber se tem conhecimento da situação de Setúbal concretamente.

“O Bloco de Esquerda endereçou à senhora ministra dos Assuntos Parlamentares, responsável pela matéria do acolhimento dos refugiados, uma pergunta para esclarecer os termos da notícia que hoje foi tornada pública que dá conta de que refugiados ucranianos, que saíram da Ucrânia por motivo da guerra desencadeada pela Rússia, estão a ser recebidos em condições que lhes cria constrangimentos”, disse aos jornalistas o líder parlamentar bloquista, Pedro Filipe Soares.

De acordo com o dirigente do BE, esta pergunta dirigida ao ministério liderado por Ana Catarina Mendes “tem um duplo objetivo”, o primeiro dois quais “esclarecer a situação em concreto” relativa à Câmara de Setúbal e “se o Governo tem dela conhecimento, se a vai fiscalizar, que consequências é que dela tira”.

“E uma segunda bastante mais abrangente e de importância reforçada que é a intervenção que o Governo está a ter em todo o processo de acolhimento dos refugiados vindos da Ucrânia”, acrescentou.

Na análise de Pedro Filipe Soares, a responsabilidade deste processo, desde a sua execução às suas garantias, é do Estado português, não podendo o Governo português “delegar sem garantir a idoneidade desse processo e das entidades que nele participam”.

“Nós queremos que a senhora ministra esclareça a participação do Governo e que garanta a idoneidade do processo e a salvaguarda dos interesses e garantias de todos os refugiados recebidos e que merecem a resposta do Governo”, afirmou.

Questionado sobre as iniciativas apresentadas por outros partidos, como a audição do presidente da Câmara de Setúbal, da embaixadora da Ucrânia em Portugal ou da Associação de Ucranianos em Portugal, o líder parlamentar do BE adiantou que os bloquistas as vão acompanhar, mas deixou um alerta sobre os timings.

“Creio que elas têm a dificuldade de haver agora um hiato de trabalhos parlamentares no que toca a trabalhos de comissões que apenas têm para auscultação o processo orçamental, tudo o resto virá posteriormente”, explicou.

Na análise do BE, a pergunta que enviaram através do parlamento é o modelo “mais rápido” para conseguirem ter “alguma resposta e para exigir uma ação de quem tem a tutela da matéria que é o Governo português”.

(Artigo atualizado às 16:22)