Dirigindo-se a eurodeputados, em Bruxelas, num debate sobre a «Bússola Estratégica», o documento que vai definir a futura política de segurança e defesa do bloco europeu, atualmente a ser negociado pelos 27 com vista à sua adoção em março, o chefe da diplomacia europeia salientou a importância de a Europa reforçar as suas capacidades e autonomia estratégica, dando a tensão a Leste como exemplo das ameaças que pairam sobre a Europa.

“Enfrentamos desafios. A Europa está em perigo. Antes, quando se dizia isto, alguns riam-se, mas agora já se riem menos”, observou o Alto Representante, admitindo que quando a nova «bússola» começou a ser esboçada ninguém tinha noção da dimensão dos desafios que o bloco europeu enfrenta, pois “não se passava nada nas fronteiras orientais da Europa e a situação no Sahel era bem melhor do que é agora”.

Apontando então a tensão entre a Ucrânia e a Rússia como o mais recente exemplo de que a segurança da Europa está ameaçada, Josep Borrell aludiu a outros teatros de conflitos, designadamente no Médio Oriente, na região do Indo-Pacífico, a atual situação política nos Balcãs Ocidentais, e até o ciberespaço.

O chefe da diplomacia europeia indicou que as discussões ao nível de ministros da Defesa e dos Negócios Estrangeiros sobre a «bússola» prosseguem, pois falta designadamente “muito trabalho por fazer relativamente à definição de cenários, estruturas de comando e controlo, custos comuns, planificação antecipada e um processo de tomada de decisões mais flexível” relativamente à criação de uma força de 5.000 efetivos, mas manifestou-se confiante de que haja um documento pronto em março para ser adotado pelos chefes de Estado e de Governo dos 27.

“O que está claro é que necessitamos de aumentar a nossa capacidade de atuar rapidamente e de forma decidida, e os acontecimentos recentes, aqui e ali, demonstram-no claramente”, concluiu.

Os ministros da Defesa e dos Negócios Estrangeiros da UE tiveram já este ano mais uma discussão sobre a futura estratégia de defesa, por ocasião de uma reunião informal em Brest, França, entre 12 e 14 de janeiro, tendo na ocasião o ministro da Defesa, João Gomes Cravinho, indicado que a mais recente versão do documento já incorpora “algumas preocupações portuguesas”, mas salientando que Portugal espera ainda uma maior atenção ao oceano Atlântico.

Gomes Cravinho voltou a salientar a importância deste documento, pois, “pela primeira vez, a UE assume-se como tendo relevância geopolítica e explica como essa relevância se deve demonstrar nos próximos quatro, cinco anos” e disse acreditar na sua adoção em março, como previsto, mas se possível com algumas alterações.

“Esta versão nova que temos agora é uma versão melhorada, incorporou algumas preocupações portuguesas, nomeadamente um reforço das partes dedicadas à segurança marítima, mas acreditamos que até março ainda pode sofrer algumas alterações positivas”, disse, referindo-se ao mais recente ‘esboço’ do documento apresentado pelo Alto Representante Josep Borrell.

Gomes Cravinho explicou que, na atual versão do documento, “o Atlântico está um pouco ausente”, o que não faz sentido, dada a sua importância.

“Temos o Mediterrâneo, temos referências ao Índico e ao Indo-Pacífico, falta-nos referências muito claras ao Atlântico, que é um oceano da maior importância geoestratégica para a Europa e que é cada vez mais um espaço de contestação e de concorrência entre grandes potencias, e por isso faz sentido que esteja presente”, disse.

João Gomes Cravinho não deixou, contudo, de saudar a convergência entre os 27 numa matéria, de segurança e defesa, que não era por regra consensual.

“Creio que aquilo que nós verificamos agora é que o grau de convergência entre os europeus é tal que começamos a falar de aspetos de pormenor, e isso significa que não há risco de o documento não ser adotado em março”, disse.