Enquanto passeava pela Festa do Livro nos jardins do Palácio de Belém, em Lisboa, com o ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, interrogado se já leu o artigo de Cavaco Silva publicado na quarta-feira de manhã no jornal 'online' Observador, o chefe de Estado respondeu repetidas vezes: "Não li".

Marcelo Rebelo de Sousa alegou que ainda não teve tempo, mas assegurou que não deixará de ler o texto do seu antecessor: "Ah, isso nunca perco. Eu aprendo sempre com os sucessivos presidentes da República. E aprenderei com os próximos, se estiver vivo muito tempo".

"Mas não li, ainda não li. Também desde já digo o seguinte: vou ler, vou interiorizar e não vou comentar, porque eu nunca comento antigos presidentes da República nem futuros presidentes da República", acrescentou.

Por sua vez, Pedro Adão e Silva afirmou perante os jornalistas: "O ministro da Cultura foi muitos anos, como sabem, comentador. Agora já não se dedica ao comentário. Mas eu leio sempre tudo, sou um leitor compulsivo".

Num artigo em forma de carta aberta a António Costa, intitulado "Fazer mais e melhor do que Cavaco Silva", o ex-chefe de Estado felicitou António Costa pela maioria absoluta do PS nas legislativas de 30 de janeiro, passados quatro meses, pedindo desculpa pelo atraso.

"Foi uma vitória da sua pessoa como líder do PS. Somos agora colegas no que à conquista de maiorias absolutas diz respeito", escreveu Cavaco Silva.

Depois, recordando o período em que governou também com maioria absoluta – entre 1987 e 1995 – Cavaco Silva desafiou o primeiro-ministro a "fazer mais e melhor" nesta legislatura com as condições de que dispõe.

O antigo presidente de PSD reclamou ter governado com "muita persistência" e "espírito de diálogo" para estabelecer "consensos importantes" com a oposição, destacando as revisões constitucionais de 1989 e 1992, e com "intenso, profundo e frutuoso diálogo" com os parceiros sociais, referindo que "foram assinados quatro acordos de concertação social".

Admitindo que nalguma medida "a falta de apoio do PS a algumas das reformas" possa ser atribuída "à inabilidade ou à insuficiência de diálogo", Cavaco Silva acrescentou: "Sendo conhecida a sua vontade de fazer reformas e habilidade no diálogo com o maior partido da oposição no sentido de as concretizar, estou certo que, com o seu governo de maioria absoluta, tudo correrá na perfeição".

"Nenhum partido, nenhuma organização sindical, empresarial, social, cultural ou ambiental se queixará de falta de diálogo e de abertura do governo para aceitar as suas propostas; as reformas que o país urgentemente necessita serão feitas em clima de toda a tranquilidade política e a decadência relativa do país em termos de desenvolvimento será revertida", prosseguiu, sempre falando diretamente para o primeiro-ministro.

Cavaco Silva associou a governação até agora de António Costa a uma "asfixia da democracia" e à ideia de que, "para os socialistas, o Estado é deles", declarando-se certo de que isso irá mudar.

"Agora, retirado da vida política ativa mas preservando os meus direitos cívicos, estou certo de que, encerrada a fase da 'geringonça', o seu governo de maioria absoluta fará mais e melhor do que as maiorias de Cavaco Silva", rematou o antigo Presidente da República.