“Mais de mil milhões de pessoas no mundo são obesas”. O preocupante número entrou no primeiro parágrafo da intervenção de Nuno Couto em pleno palco central da Web Summit.

Um em cada oito habitantes do planeta, cerca 13% da população mundial é obesa, contabilidade que “facilmente dobra se adicionarmos pessoas em risco de obesidade”, atirou para a discussão durante o “Travar a epidemia da obesidade” onde falou no Meo Arena de “uma perspetiva fresca” sobre o tema, ângulo onde entra “a ciência”, mas não só, anunciou.

“A dieta e o exercício sozinhos são importantes para a saúde, mas não são suficientes para manter um peso ideal. E não é a resposta sozinha para a obesidade”, referiu, a “única doença” que coloca todo o peso no doente.

“400 milhões de crianças e adolescentes vivem com peso a mais ou obesidade”, acrescentou, reforçando “que não estamos a fazer um bom o trabalho na prevenção e na educação dos nossos filhos”, alertou ainda.

A quem é obeso é quase sempre apontada a “falta de vontade ou falta de motivação”, mas “sabemos que a obesidade é uma doença multifatorial”, classificou o vice-presidente do departamento internacional de terapia para a obesidade na Novo Nordisk. Um coeficiente onde entra “o nosso ADN genético e metabólico, fatores psicológicos e socioeconómicos”, introduziu o responsável da farmacêutica dinamarquesa que desenvolve a semaglutido, substância batizada de Ozempic, para o tratamento da diabetes tipo 2 e Wegovy, usado para combate à obesidade.

Habituados a viver debaixo de estigmas e situações estigmatizantes pelo peso a mais, crianças e adultos, homens e mulheres, Nuno Couto acenou uma boa nova na cimeira tecnológica de Lisboa. “Há terapias que são importantes para os médicos ajudarem as pessoas com obesidade a melhorar a saúde”. 

A jornada yo-yo da obesidade

Português nascido na África do Sul, Nuno Couto viajou até à “jornada da obesidade” a que se chama a “yo-yo”, um caminho no qual “inevitavelmente, há um momento de quem convive com a obesidade, motivado, quase alcançou o limite de perda de peso, faz exercício, segue a dieta perfeita, mas, lentamente, recupera o antigo peso”, descreveu.

“Precisamos entender a raiz disto”, transmitiu. E explicou. “O nosso corpo regista como peso saudável que considera ideal, acontece cedo, aos dois ou três anos”, sublinhou. “Mas depois, mudamos de vida, de país, escola, os nossos pais divorciam-me e esse ponto sobe facilmente e é super difícil descer”, registou.

“Quando se perde uma grande quantidade de peso, o nosso cérebro diz-nos que estamos em perigo. Estamos a lutar com a nossa biologia. A dieta e o exercício são importantes, mas não são a única resposta”, relembrou.

“O que a medicina faz é que ajuda a lidar com o sentimento de fome, o medicamento suprime o apetite e significa que há menos calorias ingeridas”, observou. “Isso pode dar ao paciente a sensação de que está a começar a subir a montanha. Isso é um ciclo virtuoso e positivo”, descreveu.

Uma conversa na Web Summit não seria a mesma se não se falasse de dados e a tecnologia. “IA, apps, Big Data, é uma oportunidade tremenda”, traçou.

“Mas se nós não abraçarmos o princípio, essa perspetiva e seguir a ciência, vamos acabar por desenvolver mais apps que são melhores versões de planos de exercício, acabaremos por procurar melhores maneiras de manter as pessoas em dieta, mas não estamos a abordar o problema, isso é só para o yo-yo”, asseverou.

“Acho que essa oportunidade de olhar esses sinais e ajudar as pessoas na sua vida do dia a dia. Podemos fazer isso com uma compreensão profunda dos dados, juntar tudo isso e fazê-lo, personalizado para aquele paciente”, elucidou. “Entender os antecedentes do paciente, a perda de peso e os seus hábitos. E a única forma de fazer isso é através dos dados, mas ainda não vi um bom exemplo disso”, atirou, reforçando a necessidade de “integrar a medicação”.

“A medicina sozinha não será suficiente, a tecnologia sozinha não será suficiente”

“O que nem sempre percebemos é que tendemos a valorizar a componente de gestão do peso no tratamento da obesidade”, alertou Nuno Couto. “A obesidade está ligada a 200 outras doenças. Precisamos começar a valorizar mais componentes além da perda de peso, além da gestão do peso”, comunicou.

“Muitas pessoas dirão, ok, reconheço que existe uma associação entre diabetes e obesidade, mas o que muitas pessoas ainda não sabem, e é igualmente importante, há uma conexão profunda com doenças cardíacas, cancro e isso significa que o tratamento para a obesidade pode, potencialmente, ajudar com 20% de todos os custos de saúde originado por esta condição”, comentou.

Nesse sentido, Nuno Couto traçou cenários de sucesso para o futuro. “Fazer cair as taxas de obesidade em todo o mundo, em adultos e crianças”, indicou. “Segundo, parar de colocar a culpa na pessoa que vive com a doença, parar de estigmatizar quem tudo faz para viver de forma saudável”, acrescentou. “E terceiro, integrar medicina e tecnologia para que possamos chegar a essa compreensão profunda do que os pacientes precisam no dia-a-dia”, apontou.

“A medicina sozinha não será suficiente, a tecnologia sozinha não será suficiente. Há desafios, as pessoas com obesidade têm uma expectativa de vida mais baixa, menor qualidade de vida e nós damos a oportunidade de encontrar uma solução. Temos uma oportunidade, nas nossas mãos, para mudar o mundo”, anunciou o responsável da Novo Nordisk ao convidar “todos a pensar sobre essa perspetiva fresca sobre a obesidade, abraçando a ciência”, finalizou.