A ação dos militares gerou especulação quanto a um golpe de estado, mas os apoiantes dos militares disseram tratar-se de uma “correção sem derramamento de sangue”, escreve a Associated Press.
Soldados armados em veículos blindados estão hoje estacionados em pontos-chave da cidade de Harare, enquanto os residentes formam longas filas nos bancos para levantar dinheiro, uma operação de rotina num país em crise financeira.
As pessoas olham para os seus telefones para ler sobre a tomada do exército, enquanto outros se deslocam para o trabalho ou para as lojas.
Num discurso à nação após a tomada do controlo da televisão estatal, o major general Sibusiso Moyo disse esta madrugada que o objetivo da ação são os “criminosos” que rodeiam o Presidente, Robert Mugabe, e que os militares pretendem assegurar que a ordem do país é restaurada.
Não foi divulgado o paradeiro de Robert Mugabe, de 93 anos, e da sua mulher, Grace Mugabe, de 52, mas o casal estará alegadamente sob custódia. “A sua segurança está garantida”, disse Moyo. “Nós desejamos deixar bem claro que isto não é um golpe militar”, disse.
“Estamos apenas a visar criminosos em torno dele [Robert Mugabe] que cometem crimes que estão a causar sofrimento económico e social no país, de modo a levá-los à justiça”, afirmou o exército através dos ‘media’ estatais.
“Assim que tivermos cumprido a nossa missão, esperamos que a situação volte à normalidade”, acrescentou Moyo.
O porta-voz do exército pediu às igrejas para rezarem pelo país e instou as outras forças de segurança a “cooperarem para o bem da nação”, advertindo que “qualquer provocação terá uma resposta adequada”.
Todas as tropas receberam ordens para retornarem ao quartel imediatamente, disse Moyo. A transmissão da televisão passou da sede da ZBC para perto de um subúrbio de Harare, em Borrowdale.
Durante a noite, pelo menos três explosões foram ouvidas na capital, Harare, e veículos militares foram vistos nas ruas.
A embaixada dos Estados Unidos está hoje fechada ao público e encorajou os cidadãos a procurarem refúgio, citando “a continuada incerteza política ao longo da noite”.
A embaixada britânica emitiu um aviso similar, citando “relatórios de atividade militar invulgar”.
O Zimbabué vive pela primeira vez uma divergência aberta entre o Presidente, que dirige o país desde 1980, e o exército.
A tensão escalou na semana passada depois de Mugabe ter despedido o seu vice-presidente e aliado de longa data, Emmerson Mnangagwa, de 75 anos, que tinha estreitas ligações com os militares.
Na segunda-feira, o chefe das Forças Armadas, o general Constantino Chiwenga, condenou a demissão do vice-presidente do país, e avisou que o exército poderia “intervir” se não acabasse a “purga” dentro do Zanu-PF, partido no poder desde a independência do Zimbabué, em 1980.
O partido Zanu-PF, de Mugabe, reagiu no dia seguinte ao aviso sem precedentes, acusando o chefe das Forças Armadas de “conduta de traição”, afirmando que as críticas do general Constantino Chiwenga se destinavam “claramente” a perturbar a paz nacional e demonstravam uma conduta de traição, “já que foram feitas para incitar à sublevação”.
Mnangagwa, há muito considerado o delfim do Presidente, foi humilhado e demitido das suas funções e fugiu do país após um braço-de-ferro com a primeira-dama, Grace Mugabe.
Figura controversa conhecida pelos seus ataques de cólera e dirigente do braço feminino do partido do marido, Grace Mugabe tem muitos opositores, tanto no partido, como no Governo.
Com este afastamento, fica na posição ideal para suceder ao marido, que, apesar da idade avançada e da saúde frágil, foi nomeado pela Zanu-PF como candidato às eleições presidenciais de 2018.
Governo recomenda aos portugueses que evitem zonas de grande concentração em Harare
O Governo português recomendou hoje aos portugueses que vivem em Harare, no Zimbabué, cuidados redobrados nas deslocações para o centro da cidade e que evitem zonas de grande concentração de pessoas, depois da agitação vivida durante a madrugada.
Em declarações à agência Lusa, o secretário de Estado das Comunidades, José Luis Carneiro, disse que as informações que as autoridades portuguesas dispõem indicam que se trata de "acontecimentos circunscritos à dimensão política e aos atores políticos do Zimbabué" e que "não está a alastrar à restante comunidade".
"No entanto, todos os cuidados devem ser tomados, nomeadamente nas deslocações ao centro da cidade, evitando zonas de grande concentração de pessoas", afirmou o responsável.
"Estamos em contacto com os serviços consulares, que por sua vez estão em contacto com serviços consulares da União Europeia e a acompanhar o evoluir da situação", afirmou José Luis Carneiro, que disse que nesta circunscrição residem cerca de 1.000 portugueses.
Entretanto, os serviços da embaixada portuguesa em Harare estão a enviar mensagens aos residentes portugueses informando que, devido à situação no país, aconselham a manter a calma e evitar agrupamentos. Sugerem ainda que sejam evitadas deslocações ao centro da cidade.
África do Sul está contra qualquer alteração inconstitucional de regime
O presidente da África do Sul, Jacob Zuma, manifestou-se hoje contra qualquer mudança de regime “inconstitucional” no Zimbabué, onde o exército lançou durante a noite e madrugada uma operação destinada a “eliminar criminosos” próximos do Presidente, Robert Mugabe.
Numa declaração da presidência sul-africana lê-se que Zuma está “muito preocupado” com a situação e expressou a esperança de que os desenvolvimentos no Zimbabué não “levem a uma alteração inconstitucional do Governo”.
Zuma exortou ainda as autoridades e o exército zimbabueano a “resolverem amigavelmente o impasse político” atual”.
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