A 13ª edição da Volvo Ocean Race (VOR), a mais longa e difícil prova de circum-navegação por equipas, arrancou ontem de Alicante, Espanha, rumo a Lisboa, onde deverá chegar no final da semana.
A zona ribeirinha e o porto da capital da província com o mesmo nome transformaram-se numa autêntica fortaleza náutica com milhares de amantes da vela a invadirem a zona portuária para verem a saída das sete embarcações que participam nesta aventura que dá a volta ao globo, por mar.
Num espetáculo cénico digno de honras olímpicas, antes de entrarem nos novos Volvo Race 65, veleiros todos iguais com 20 metros e nove toneladas, skippers e tripulantes das equipas desfilaram entre o público, respondendo ao chamamento do speaker de serviço.
Ao todo, 62 velejadores, homens e mulheres do mar que compõem cada uma das tripulações, “marcharam” acompanhados de sete repórteres que seguem a abordo para acompanhar a regata ao longo dos 80 mil quilómetros (45 mil milhas náuticas), passando por 11 cidades distribuídas por 11 países espalhado por cinco continentes.
Uma demonstração de unidade espanhola nas varandas da cidade
Num momento algo conturbado da história de Espanha, com algumas bandeiras espanholas penduradas nas varandas das habitações próximas da marginal da segunda cidade mais importante na comunidade de Valência, com inscrições espanholas a deambularem pela “Race Village”, o rei emérito espanhol Juan Carlos mergulhou entre a multidão, percorreu todo o pontão e despediu-se da equipa nacional, a Mapfre, capitaneada pelo campeão mundial e olímpico Xabi Fernández.
Com muita animação à partida da edição 2017-2018 da VOR — bandeiras e camisolas das diversas equipas e um momento musical em solo firme pela voz, à capela, do grupo português Spell Choir (que viajou com a convite da equipa Turn the Tide on Plastic) —, a saída dos barcos da baía de Alicante foi ainda acompanhada, por mar, por diversas embarcações de recreio e mirones mais ou menos VIP’s e, pelo ar, por sete aviões da ‘patrulha águia’, que desenharam no céu azul de Alicante as cores encarnada e amarela da bandeira de Espanha.
Foi também para o céu que as atenções se viraram ao anúncio escutado nos altifalantes. Um avião Airbus A330 da transportadora aérea Hi Fly, pintado com as cores da embarcação Turn the Tide on Plastic, equipa com bandeira portuguesa e das Nações Unidas que navega com o patrocino da Fundação Mirpuri e da Ocean Family Foundation (OFF), vai passar durante a prova uma mensagem de sustentabilidade, preservação e limpeza dos oceanos e luta contra o plástico.
Uma portugalidade nunca antes vista em 44 anos da volta ao mundo
O barco com bandeira portuguesa que nasce do investimento da Fundação Mirpuri (organização sem fins lucrativos do empresário e filantropo português Paulo Mirpuri, presidente da Fundação e da Mirpuri Investments, que detém a Hi Fly) não é a única demonstração de portugalidade nesta viagem planetária por água.
A bordo das embarcações seguem três portugueses, espalhados por duas equipas: Bernardo Freitas e Frederico Melo vestindo a causa dos oceanos no barco português, sendo que só o primeiro saiu a bordo, e ainda António Fontes. Este último inicialmente destacado para a Scallywag, primeira equipa de Hong-Kong a participar na Volvo Ocean Race, mas que viria a “saltar” à última hora para holandesa AkzoNobel, após uma história que meteu uma decisão de um tribunal, saída e reintegração do skipper e agradecimentos à mistura.
Com efeito, Simeon Tienpont que tinha sido substituído nos últimos dias por Brad Jackson, foi reintroduzido como líder da tripulação por decisão de um tribunal arbitral holandês. Uma decisão que não caiu bem no seio de parte da tripulação e levou a algumas “saídas” da equipa na viagem para Lisboa. Para colmatar as baixas Tienpont “pescou” o português António Fontes na novata tripulação de Hong-Kong, seguindo com a equipa até Lisboa. “Agradecemos ao dono da equipa Sun Hung Kai Scallywag, Seng Huang Lee e ao skipper David Witt por nos emprestar António Fontes para esta primeira etapa”, lê-se no site da equipa. Entretanto, outro português, Diogo Cayola, integrou a equipa de mar do barco com bandeira holandesa, reencontrando o compatriota na capital portuguesa.
O Volvo 65 da equipa chinesa Dongfeng despediu-se de Alicante, onde decorreu uma regata à vista da população, na liderança, depois de uma mudança na rota da etapa inicial decidida pela organização e que acrescenta mais um toque de portugalidade à regata. As embarcações vão contornar Porto Santo e a Madeira — um palco que começa a ganhar peso nos eventos náuticos (recebeu em junho o Extreme Sailing Series) — antes de rumarem a Lisboa e entrarem no rio Tejo no final da semana, cumprindo uma regata costeira.
Permanecerão na Doca de Pedrouços, local onde estará situada a “Race Village” e onde está a base permanente do boatyard (estaleiro) da VOR, instalado nos antigos armazéns da Docapesca, local onde os sete veleiros que vão dar a volta ao mundo passaram por um refit (remodelação) antes da prova. Ali permanecerão até à partida para a segunda etapa, que liga Lisboa à Cidade do Cabo, na África do Sul, prevista para 5 de novembro.
À beira de completar 44 anos, a mais dura regata à volta do mundo mostra um até agora inédito peso português e surge também com um toque mais feminino fruto da grande mudança introduzida que obriga, pela primeira vez, todas as tripulações a terem pelo menos uma mulher a bordo. “Elas” estão espalhadas, mas é a equipa de bandeira portuguesa a elevar uma mulher, Dee Caffari, ao estatuto de skipper e a dar iguais oportunidades aos dois sexos (cinco mulheres e cinco homens), ou não fosse essa também outras das mensagens com que viaja.
O big brother de Alicante. 24 horas, sete dias da semana a acompanhar a volta ao mundo de barco
Como os barcos em pleno mediterrâneo a aproximarem-se do atlântico, tudo é monitorizado a partir de um centro de apoio permanente em Alicante, casa de partida da regata e posto de vigia durante toda a prova.
Ali, desde que toda a “cidade itinerante” da VOR se instalou em Alicante até chegar a Haia, na Holanda, em finais de junho de 2018, as sete embarcações que percorrem 11 etapas em 11 países, navegando um total de mais de 80 mil quilómetros (45.000 milhas náuticas) são vigiadas por uma equipa permanente de “pelo menos três pessoas”, que funciona num regime “24/7”, ou seja, todos os dias, informou fonte oficial da prova.
Com o mapa mundi das previsões climatéricas e da observação em tempo real de eventuais acidentes com as embarcações, no centro que é uma espécie de NASA tudo é acompanhado ao minuto e é ali que todas as decisões são tomadas, dos resgates, à gestão de crise passando pela telemedicina aos velejadores caso tal seja necessário.
*Os jornalistas viajaram a convite da Fundação Mirpuri e da equipa Turn the Tide on Plastic
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