Rafaela Costa, 16 anos, praticante de skate há quatro e uma promessa nacional na sua categoria, conta que a modalidade olímpica lhe trouxe um objetivo na vida. A atleta lamenta, contudo, sentir-se muitas vezes vítima de segregação e violência verbal quando pratica as suas manobras nas ruas do Porto, como já aconteceu na zona dos Clérigos.

“Aconteceu comigo nos Clérigos há pouco tempo, com um segurança de lá”, conta.

Além da violência verbal e da sensação de não se sentir bem-vinda nos espaços públicos, Rafaela Costa assume que encontrou no skate a melhor arma para ser livre e sem medo de assumir o seu estilo.

A ‘rider’ de ‘skateboard’ gostaria de ver o Porto ganhar uma praça destinada ao skate, bem como um parque coberto para treinos nos dias de chuva e frio.

Miguel Oliveira, 19 anos, ‘rider’ há cinco anos, revela que já vivenciou várias situações “menos agradáveis” durante as práticas nos espaços públicos do Porto. A mais recentemente foi quando chegou à zona dos Clérigos e viu um segurança a agarrar um camarada e levar o seu skate para o interior da loja.

“Eu tentei intervir e tentei tirar o skate da mão do segurança e ele atacou-me”, disse Miguel Oliveira, assumindo que foi magoado “mas não muito”. O argumento para o segurança usar da força foi estarem a andar de skate nos Clérigos, mas, segundo Miguel Oliveira, estavam sentados a tirar fotos e nem sequer estavam a manobrar o skate.

Em resposta, por escrito, à Lusa, fonte da Torre dos Clérigos explicou que nesse episódio recente, os seguranças sentiram-se “na obrigação de zelar pela segurança do equipamento, dos seus visitantes e pela integridade física dos vários jovens skaters (…), que lá realizavam as suas manobras e filmavam”.

Para os responsáveis da Torre dos Clérigos é importante a “salvaguarda e preservação do património”, “segurança dos próprios ‘skaters’ e dos visitantes aos Clérigos, e, “sobretudo, a salvaguarda de pessoas com deficiência, por se tratar de uma entrada e saída prioritária e, por isso, dizem aplicar “uma consciência mais ativa e uma redobrada atenção para a utilização indevida da zona da porta lateral do complexo, situada na Rua da Assunção, que tem uma estrutura em ferro, para proteger equipamentos perigosos e salvaguardar a segurança das pessoas que por lá circulam”.

Bernardo Castro pratica há nove anos skate e também denuncia que foi abordado pela polícia e por transeuntes, que o acusarvam de fazer barulho.

“O skate ainda é visto um pouco como sendo praticado por arruaceiros”, assume Bernardo Castro, acreditando, todavia, que esse paradigma venha a alterar-se agora que modalidade teve estreia olímpica em Tóquio2020.

Pedro Fraga, 40 anos, pratica skate desde criança e também sofreu situações pouco agradáveis no Porto na presença dos seus filhos, em que seguranças ou cidadãos o ameaçaram que lhe “rebentavam a cara toda”.

“Chegaram até a ameaçar com violência física, embora não tenham chegado a bater, porque nós nos afastámos”, disse Pedro Fraga, lamentando que as situações que estão a suceder acontecem por falta de locais no Porto para a prática da modalidade na rua e em espaços adaptados.

Para Jorge Apolinário, professor de skate e praticante há 12 anos, as pessoas não gostam do barulho do skate a bater no chão, não gostam quando o skate lhes vem parar às pernas e ficam “chateadas” porque não percebem a frustração dos skaters a tentar fazer as manobras.

“A mentalidade das pessoas ainda não vê o skate como um desporto olímpico, mas o skate pode bem ser uma tábua de salvação para se fugir à marginalidade. Ao entrarem nesta competitividade, faz com que ganhem independência, criando objetivos para chegarem mais longe, dá-lhes autoconfiança e sentem-se mais confortáveis em tudo na vida”.

Pedro Fraga, pai de dois campeões nacionais de skate, Madu e Pacal, também considera que o skate é fulcral para os jovens atletas perceberem que após uma queda há que saber reerguer.

“O skate é aquele desporto que eles têm que falhar, errar e levantar, tentar de novo. Acho que lhes dá uma perspetiva muito boa para a vida, transpor todos os obstáculos”.

Mariana Tamayo, 16 anos, skater há quase dois anos, confirma a perspetiva de Pedro Fraga e confessa que a cultura urbana do skate transformou a sua vida para melhor.

“Mudou completamente. Antes ficava quase sempre em casa, não tinha um desporto muito certo. Agora, com o skate, dou-me com muito mais pessoas. E não é só o desporto em si, é a ‘vibe’ inteira à volta. É tudo malta fixe, que nos permite sermos nós próprios, sem rótulos”, defendenndo que um único skate no Porto é insuficiente para tantos praticantes, principalmente porque o espaço está muitas vezes lotado e/ou com aulas, o que não permite treinos para a comunidade skater de forma simples.

Os campeões nacionais Madu, 12 anos, e Pacal, 10 anos, concordam com Mariana Tamayo.

Madu conta que o skate o ajudou a fazer “mais amizades” e que quando está “chateado” o melhor remédio é colocar-se em cima da tábua com rodinhas e rodopiar pelas ruas.

O problema maior para a modalidade no Porto é a falta de sítios para poôr o skate a rolar, principalmente no inverno. O atleta revela que muitas vezes quando anda de skate na rua é expulso dos sítios.

O irmão, Pacal, conta que se pudesse pedir ao presidente da Câmara do Porto, Rui Moreira, uma prenda neste Natal queria um “parque de skate coberto”.

Madu, por seu turno, pede um skate parque ‘indoor’ e uma praça “fixe”.

Mariana e Rafaela defendem que o melhor presente que Rui Moreira lhes poderia dar também era um parque de skate coberto para os dias chuvosos.

A prática de skate no Porto faz-se, principalmente, na Batalha, Centro Português de Fotografia, Torre dos Clérigos, Casa da Música e Fonte dos Leões.