Corria o ano de 1986. Portugal integrava a lista de países presentes no Mundial do México. Durante o estágio em solo mexicano rebenta o caso “Saltillo.
Eliminados na fase de grupo, já em território nacional, a revolução que deu origem ao 25 de Abril do futebol português produziu um primeiro efeito: uma fuga em massa dos jogadores envolvidos. Os “Infantes”, como foram apelidados na altura, abdicaram de representar a seleção portuguesa.
O tempo ajudou a sarar feridas, muitos voltaram a vestir a camisola das Quinas, mas dois jogadores, no auge das respetivas carreiras, não o fizeram. Diamantino e Carlos Manuel (o homem do pontapé de Estugarda e que colocou o país num mundial 20 anos depois de Inglaterra 1966), dupla do meio-campo na seleção e no Sport Lisboa e Benfica. Renunciaram. Não voltaram.
Antes, Eurico Gomes, o único jogador português campeão pelos “Três Grandes”, internacional em 38 ocasiões, voltou as costas à seleção por divergências com o então treinador Otto Glória. Cumpriu o último jogo num particular com a Itália, em abril de 1985.
Numa viagem ao passado recente, Fábio Coentrão, lateral esquerdo do Sporting Clube de Portugal (cedido pelo Real de Madrid), 52 jogos oficiais por Portugal, a quatro dias do anúncio da convocatória para o Campeonato do Mundo Rússia 2018 apresentou a renúncia temporária à seleção nacional.
Uma pausa feita após “uma época muito desgastante” que o levaram a sentir “não estar nas condições necessárias para representar a seleção numa prova com a exigência do campeonato do Mundo”, escreveu, então, numa nota enviada ao selecionador. Deixou uma promessa. “Jamais virarei as costas ao meu País, e espero poder vir a representar a nossa Seleção mais vezes no futuro”. Tal, no entanto, não aconteceu.
Estes são alguns exemplos de jogadores em Portugal que deixaram de vestir a mais importante camisola do país ainda com algo, ou muito, para dar ao futebol português.
Rafa, 29 anos, o jogador que parece estar sempre zangado com o mundo, colocou ontem ponto final na seleção nacional alegando motivos do foro pessoal. Fê-lo por escrito. Para a história ficam 25 jogos de Quinas ao peito, um campeonato da Europa (2016) e uma Liga das Nações (2019).
Por esse mundo fora não faltam exemplos de entregas precoces de camisolas nacionais antes do crepúsculo das respetivas carreiras. Entregam seja por lesão, divergências com equipas técnicas, dedicação em exclusivo aos clubes, motivos pessoais e outros. As chuteiras só anos mais tarde foram ou serão penduradas.
Um dos casos mais mediáticos foi a saída temporária de Leo Messi, astro argentino a atuar então no Barcelona e hoje um dos craques do PSG.
Após a derrota na final Copa América, mais uma, em junho de 2016, o capitão albi-celeste, de 29 anos, após falhar uma penalidade, em declarações aos jornalistas, disse: “Lutei muito, tentei, são quatro finais e não consegui ganhar. Fiz todo o possível. Dói mais que para qualquer um, mas é evidente que não é para mim. Chega. Desejava mais que ninguém um título com a seleção e infelizmente não aconteceu”, lamentou.
Não durou muito tempo este virar de costas. “Amo demasiado o meu país e esta camisola”, escreveu num comunicado quase três meses depois do adeus.
Para muitos outros, o adeus às seleções foi definitivo, enquanto continuaram a espalhar arte dos relvados com as camisolas de quem lhes paga o salário.
Com pragmatismo germânico, depois da má campanha da Alemanha no Euro 2020, Toni Kroos renunciou à seleção. Nas redes socais, o médio de 31 anos, 106 internacionalizações, admitiu que a decisão já estava tomada há algum tempo e anunciou querer dedicar-se em exclusivo ao Real Madrid.
De forma distinta despediu-se o seu colega de equipa, Philipp Lahm. O capitão da Mannschaft, 113 internacionalizações, 30 anos, saiu pela porta grande após a conquista do Mundial 2014, o terceiro do seu palmarés em 10 anos de representação da seleção alemã.
Divergências com a equipa técnica terão estado na origem da decisão de Samir Nasri. A gota de água aconteceu em 2014, quando o internacional francês ficou de fora dos eleitos para o Mundial 2014 e, aos 27 anos, decidiu renunciar à seleção gaulesa.
Os motivos pessoais foram elencados por Franck Ribéry, após o Mundial de 2014, no Brasil. O internacional francês cumpriu 88 jogos com o Galo ao peito.
Depois do Europeu de 2004, realizado em Portugal, Paulo Scholes, médio inglês, anunciou a retirada da “Rosa” com apenas 29 anos. A vida familiar e a carreira no Manchester United falaram mais alto.
As lesões atiraram para a reforma antecipada Alan Shearer, 29 anos, avançado inglês.
Francesco Totti, deixou a squadra azurra também por problemas físicos, dedicando-se em exclusivo à AS Roma. Retirou-se da seleção italiana em 2007, cerca de um ano depois da conquista o Mundial de 2006, na Alemanha. A despedida do clube do coração, a prioridade, aconteceu aos 40 anos.
Por fim, entre muitos outros exemplos, Gerard Piqué, internacional espanhol, anunciou a despedida em 2016 mas só concretizada dois anos depois, em 2018, no seguimento da eliminação nos oitavos de final no Mundial 2018, frente à Rússia. O cansaço da crítica e o peso das suas posições políticas na questão da Catalunha e os atritos com Luiz Henrique pesaram na decisão.
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