"Há elementos de tensão que são graves, designadamente entre países europeus muito próximos de nós, como é o Reino Unido e a Rússia. (...) Em comunicado que saiu anteontem [terça-feira], exprimimos total solidariedade para com o Reino Unido e pedimos que sejam apuradas as responsabilidades e sejam responsabilizados os autores desse ataque, que envolveu o uso de arma química na Europa, pela primeira vez, aliás, em muitos anos", disse Augusto Santos Silva à agência Lusa.

O ministro dos Negócios Estrangeiros falava à saída de uma reunião em Lisboa com o grande imã da Mesquita de Al-Azhar, do Cairo, xeque Ahmed Mohamed el-Tayeb.

"É evidente que esse ataque teve autores que devem ser encontrados e responsabilizados", insistiu Santos Silva.

O ex-espião duplo de origem russa Serguei Skripal, 66 anos, e a filha Yulia, 33, foram encontrados inconscientes no dia 04 de março, num banco num centro comercial em Salisbury, no sul de Inglaterra, e estão hospitalizados em “estado crítico, mas estável”.

Na segunda-feira, numa intervenção no parlamento, Theresa May considerou “muito provável” que a Rússia tivesse sido responsável pelo duplo envenenamento.

Dois dias depois, May anunciou a “suspensão de contactos bilaterais” com Moscovo e a expulsão de 23 diplomatas russos, decisão que a embaixada russa em Londres classificou como "hostil", "inaceitável" e "injustificada".

O secretário-geral da NATO (aliança militar da qual Portugal faz parte), Jens Stoltenberg, disse hoje que os aliados não querem uma nova Guerra Fria, apelando ao diálogo político e classificando como “muito sério” o caso dos envenenamentos ocorridos no Reino Unido e imputados a Moscovo.

Já os líderes de França, Alemanha, Estados Unidos e Reino Unido repudiaram hoje, em conjunto, a utilização do agente neurotóxico Novichok contra Sergei Skripal e a filha como uma “violação do direito internacional” e uma “ameaça à segurança de todos”.

Questionado pela Lusa sobre se as intervenções da Rússia nas democracias do Ocidente (através de ciberataques, interferências nos processos eleitorais ou guerra híbrida) podem trazer um ambiente de maior risco, Augusto Santos Silva recordou que este é o resultado de um percurso iniciado em 2014, com a anexação da Crimeia por parte de Moscovo.

"Desde 2014 a situação mudou consideravelmente por causa da anexação da Crimeia por parte da Rússia, que é - à luz do direito internacional - uma ação ilegal, que põe em causa a soberania territorial de um país europeu, a Ucrânia. E também os acontecimentos no Donbass criaram e criam elementos de conflitualidade muito preocupantes, porque existem mesmo na nossa Europa, na nossa mais próxima vizinhança a Leste", sublinhou.

Segundo a ONU, desde o início do conflito no Donbass, na primavera de 2014, já foram mortas mais de 10.000 pessoas na região leste da Ucrânia, onde se situam as províncias separatistas de Donetsk e Lugansk).

O conflito envolve forças leais ao governo ucraniano e separatistas pró-russos, alegadamente apoiados por Moscovo.