Das alterações na duração dos contratos a termo e do período experimental, temas que têm estado em especial destaque no debate político, a mudanças menos referidas como as alterações nos bancos de horas, a criação de uma Contribuição Adicional por Rotatividade Excessiva e a criação da medida CONVERTE+ para apoiar empresas que reduzam a precariedade dos contratos procurámos saber junto de Benedita Gonçalves, advogada e associada coordenadora da Vieira de Almeida & Associados (VdA), o que vai mudar na vida de trabalhadores e de empresas.

O que muda no regime da contratação a termo?

A duração máxima dos contratos de trabalho a termo é diminuída, passando a ser de dois anos para os contratos a termo certo e de três anos para os contratos a termo incerto.

Além disso, não obstante o limite máximo de três renovações se manter inalterado, a duração total das renovações não poderá, agora, exceder a duração do período inicial de duração do contrato. Por exemplo, se o contrato inicial for celebrado por nove meses,  continuam a poder ser feitas no máximo três renovações, mas estas, no total, não podem perfazer mais do que nove meses. Com a introdução desta limitação, a única forma de aproveitar a duração máxima dos dois anos, é celebrar o contrato a termo inicial pelo período de um ano.

Quanto aos trabalhadores à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração assinalam-se alterações significativas?

Sim, por um lado, aumenta-se a duração do período experimental de 90 para 180 dias. Por outro, a contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego e desempregados de longa duração deixa de ser motivo admissível para a celebração de contratos de trabalho a termo.

Estas novidades legislativas revelam-se, em certa medida, num contrassenso quando postas em prática. Enquanto que, por um lado, se percebe a intenção do legislador em restringir o recurso aos contratos a termo, por outro, fica esta intenção um pouco aquém do pretendido quando se sujeitam estas duas categorias de trabalhadores a um período experimental de 180 dias, em que qualquer uma das partes pode, livremente, pôr termo ao contrato, sem invocação de qualquer motivo, nem pagamento de pagamento de qualquer indemnização.

Os estágios contam para o período experimental?

Os estágios passam a contar para o período experimental desde que sejam realizados para mesma atividade e a favor da mesma entidade empregadora.

Estas alterações aplicam-se aos contratos de trabalho já em vigor?

Não. Estas alterações aplicam-se apenas aos contratos celebrados a partir da presente data.

Qual a duração dos contratos de muito curta duração?

Assiste-se ao alargamento da duração de 15 para 35 dias dos contratos de muito curta duração e a generalização deste tipo de contratos a todos os sectores, desde que se verifique um acréscimo excecional de atividade e se trate de empresa cujo ciclo anual apresente irregularidades decorrentes do respetivo mercado ou de natureza estrutural que não seja passível de assegurar pela sua estrutura permanente.

O que muda relativamente à formação profissional?

Os trabalhadores passam a ter direito a um número mínimo de 40 horas anuais de formação profissional.

Quais as principais alterações no trabalho temporário?

Procede-se a um alargamento dos casos em que o trabalhador temporário poderá invocar a qualidade de trabalhador sem termo da empresa utilizadora, designadamente nas situações de cedência sem contrato assinado ou falta de menções obrigatórias, o que vai obrigar a um maior cuidado por parte das empresas que se socorrem desta modalidade de contratos de trabalho.

Quais são os impactos da nova lei na figura do banco de horas?

O banco de horas individual, aquele instituído por acordo entre a entidade empregadora e o trabalhador, é eliminado. Os acordos atualmente existentes cessarão, obrigatoriamente, a 30 de setembro de 2020.

Já a possibilidade de se instituir um banco de horas grupal mantém-se. Contudo o seu modo de implementação numa empresa sofre alterações – a lei passa, agora, a exigir a realização de um referendo aos trabalhadores que passará pela elaboração de um projeto, sua publicitação, comunicação obrigatória ao serviço com competência inspetiva do ministério responsável pela área laboral (atualmente a ACT) e aos representantes dos trabalhadores, com 20 dias de antecedência relativamente à data do referendo e finalmente a aprovação do projeto por, pelo menos, 65% dos trabalhadores abrangidos.

Quais são as alterações mais relevantes no regime da proteção da Parentalidade?

Uma medida de aplaudir é, sem dúvida, a maior proteção conferida aos trabalhadores com filhos com doença oncológica.

Para além disso, assiste-se a um alargamento do leque de direitos de que os trabalhadores beneficiam ao abrigo deste regime, como o aumento do período de gozo obrigatório da licença parental exclusiva do pai que passa de 15 para 20 dias úteis e o direito a dispensas ao trabalho para consultas de procriação medicamente assistida, entre outros.

O Código Contributivo é também alvo de mudança?

No plano contributivo, é criada uma Contribuição Adicional por Rotatividade Excessiva para as empresas que apresentem um peso anual de contratação a termo superior ao indicador aplicável ao setor de atividade em que se inserem. Esta taxa entrará em vigor a 1 de janeiro de 2020 e terá uma aplicação progressiva até ao máximo de 2%. Isto significa que uma empresa que tenha um número de trabalhadores com contratos a termo superior à média do seu setor de atividade será alvo desta contribuição adicional paga em sede de Segurança Social. Esta taxa será paga pela primeira vez em 2021, devendo ser liquidada no prazo de 30 dias a contar da notificação a efetuar pelos serviços da Segurança Social.

A par das novidades no Código do Trabalho, existe alguma outra medida do Governo que promova o combate à precariedade?

Sim, foi criada muito recentemente, pela Portaria n.º 323/2019, de 19 de setembro, a medida “CONVERTE+”, que surge do compromisso do Governo em combater a precariedade e reforçar a dignificação do trabalho.

Esta medida traduz-se num apoio transitório à conversão de contratos de trabalho a termo em contratos de trabalho sem termo, desde que estas conversões sejam realizadas entre o dia 20 de setembro de 2019 e 31 de março de 2020, através da concessão, à entidade empregadora de um apoio financeiro equivalente a quatro vezes a remuneração base mensal prevista no contrato de trabalho sem termo.

As empresas interessadas em concorrer a esta medida devem apresentar a sua candidatura junto do IEFP, I.P. até ao dia 31 de março de 2020.

Estas alterações são aptas a combater, como se pretende e anuncia, a precariedade?

Apesar de todas as limitações em matéria de requisitos formais, temporais e substantivos à contratação a termo, Portugal continua a ser um dos países da União Europeia que regista uma das maiores taxas de contratação com recurso a formas de contratos não permanentes e, apesar destas alterações, não antevejo grandes mudanças. Na minha opinião, o problema reside, não no facilitismo do regime jurídico na contratação com cariz temporário, mas antes na inflexibilidade que persiste nos despedimentos. A evolução neste domínio tem sido praticamente nula, o que naturalmente estimula as empresas a evitar os vínculos permanentes.