Os trabalhadores de empresas que recorreram ao lay-off vão receber com atraso os salários devidos em abril porque a Segurança Social não teve capacidade de processar todos os pedidos realizados. O atraso nos pagamentos às empresas foi assumido pelo ministro da Economia e a situação deverá estar regularizada durante a primeira quinzena de maio. Há ainda "erros" nos processos de candidatura ao lay-off, mas enquanto a Ministra do Trabalho atribui falhas às empresas, a Bastonária da Ordem dos Contabilistas fala de incapacidade da Segurança Social.

"Não existiu capacidade da Segurança Social para processar devidamente todos os processos que foram enviados" à Segurança Social. A afirmação é da bastonária dos contabilistas, que rejeita assim que seja dos contabilistas a culpa dos atrasos que se vão sentir este mês. Uma afirmação que o ministro da Economia corrobora, tendo afirmado em entrevista à SIC que "foi virtualmente impossível à máquina da Segurança Social conseguir processar" todos os pedidos.

Segundo o ministro foram efetuados pagamentos nos dias 24 e 28 de abril, e serão realizados mais pagamentos a 30 a 5 de maio, correspondentes a pedidos efetuados até ao dia 10 de abril. Os pedidos feitos para lá desta data a Segurança Social não conseguiu processar. Pedro Siza Vieira adiantou que o Governo trabalhará no sentido de regularizar a situação na primeira quinzena de maio. O objetivo inicial era ter estes pagamentos feitos antes do final do mês de abril, assumiu.

Mas as versões divergem sobre o que está a provocar estes atrasos.

No passado dia 24 de abril, a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, disse que milhares de empresas que aderiram ao regime de lay-off teriam de corrigir os seus processos para aceder aos apoios. Em causa estavam cerca de 10 mil casos com informação em falta, como por exemplo o IBAN.

No entanto, Paula Franco, Bastonária da Ordem dos Contabilistas Certificados, contraria esta afirmações da ministra. Em declarações ao Correio da Manhã, a Bastonária adianta que "até agora todos os processos de que a Ordem tem conhecimento, e que foram recusados, estão todos corretos".

A bastonária, em declarações à Renascença, reitera que "houve um resvalar do prazo de pagamento para maio e é isso que tem de ser dito, independentemente da forma como os processos foram enviados. Inclusivamente os contabilistas receberam notificações a dizer: 'o seu processo está bem, mas envie outra vez'. Ora, isto não é, obviamente, admissível".

Estes erros vão afetar mais de 11 mil empresas, desconhecendo Paula Franco o número de trabalhadores abrangidos e que poderão ver os seus salários atrasados.

Em causa está, diz, o sistema escolhido pelo para a entrega e análise dos pedidos. "Ter um sistema baseado em ficheiros PDF e Excel zipados tem tudo para correr mal", sinaliza ao Correio da Manhã.

"Na semana passada o problema era a falta de IBAN [número que identifica a conta bancária da empresa para a qual será transferido o dinheiro], esta semana a Segurança Social Direta está a pedir aos empresários para enviarem, de novo, os documentos que aqueles serviços já têm", adiantou ao diário.

Ainda sobre a falta de IBAN — um dos problemas sinalizados pela ministra do Trabalho nas candidaturas — Paula Franco desmente: "O IBAN estava introduzido. Houve aqui mais uma vez, por parte, da Segurança Social, um perder de tempo a notificar as empresas sobre este aspeto, que não estava correto. As empresas tinham o IBAN registado, portanto houve ali um erro na leitura por parte da Segurança social e isso é importante que se admita".

A bastonária dá ainda conta de mais um problema, nomeadamente ao nível da aplicação de coimas por atrasos no pagamento das prestações à Segurança Social.

Ao Correio da Manhã explica que as empresas tinham de pagar até ao dia 20 de março as contribuições à Segurança Social relativas ao mês de fevereiro. No entanto, o prazo foi adiado para 30 de março por causa da pandemia de covid-19. Mas o Ministério do Trabalho aplicou coimas às empresas que não fizeram o pagamento até dia 20 e o incumprimento impede que o pedido de apoio ao lay-off seja analisado pela Segurança Social.  "Existiu uma enorme falta de humildade", lamentou Paula Franco.

No total foram analisados mais de 62 mil candidaturas de empresas ao regime de lay-off, mas a Segurança Social só aprovou os pedidos de cerca de 38 mil. As restantes foram rejeitadas ou ainda estão em avaliação.

Segundo o gabinete da ministra Ana Mendes Godinho, a Segurança Social vão ser pagas até ao dia 05 de maio as compensações relativas ao ‘lay-off’ simplificado a 61,7% das empresas que pediram até ao início de abril este apoio criado no âmbito da crise causada pela pandemia covid-19. Assim, o apoio será pago a 38.465 empresas, correspondentes a 359 mil trabalhadores.

Segundo os dados do ministério, 15,1% dos pedidos (9.458) foram indeferidos por vários motivos, entre eles porque as empresas não tinham a sua situação contributiva regularizada ou não tinham certificação do contabilista ou por não cumprirem as regras da data de início do apoio. Foram ainda rejeitados 3,1% dos pedidos (1.946) por estarem incorretamente instruídos ou por faltar a indicação do IBAN. Os restantes pedidos “estão em análise”, diz o gabinete da ministra.

O tema tem gerado celeuma. As estimativas iniciais do ministro da Economia apontavam para cerca de um milhão de trabalhadores apoiados pelo regime de lay-off, número muito distante dos 359 mil trabalhadores agora apontados por Ana Mendes Godinho. Neste sentido, o CDS-PP já exigiu explicações ao Governo, sinalizando ainda a necessidade de este "ser diligente a simplificar os processos para que as pessoas possam efetivamente receber os apoios”, de forma a que não sejam "razões processuais" a impedir que tal aconteça.

(Notícia atualizada às 11:46)