O encontro foi marcado para as 09:30 no Estadio Nacional do Jamor, em Oeiras, seguindo depois para a Avenida da Liberdade, em Lisboa, onde os primeiros carros começaram a chegar ao som de apitos e buzinas cerca das 11:00.

As viaturas ficaram estacionadas no sentido ascendente da Avenida da Liberdade, junto à rua Alexandre Herculano, sempre sob a vigilância policial, e os motoristas e parceiros, em marcha lenta a pé, deslocaram-se, primeiro, à sede da Bolt, para entregar o caderno de encargos.

Em declarações aos jornalistas, Diogo Fernandes do movimento TVDE (transporte de passageiros em veículos descaracterizados a partir de plataforma eletrónica) explicou que o protesto de hoje é o seguimento daqueles que têm acontecido há três semanas consecutivas, às quartas-feiras, e que irá continuar até terem resposta por parte das plataformas às reivindicações.

De acordo com o caderno de encargos, a tarifa mínima que cobre os custos de serviço está fixada nos 70 cêntimos por quilómetro.

Na sede da Bolt, o grupo teve um primeiro contratempo, pois a segurança do edifício deixou a comitiva subir até aos escritórios, mas no local a rececionista disse que a sede da empresa já não era ali.

Depois de explicarem a situação ao restante grupo, a comitiva saiu em direção aos escritórios da Free Now, na Duque de Loulé, e, com escolta policial, ocupou uma das faixas de rodagem subindo até ao topo da avenida.

No local, a comitiva subiu até aos escritórios, mas não conseguiu entregar a documentação. Quando o grupo já se encontrava junto aos restantes companheiros, o diretor-geral da Free Now desceu e acabou por marcar uma reunião para quinta-feira.

Para a parte da tarde está marcada a passagem pelos escritórios da Uber, a primeira das operadoras a entrar no mercado nacional.

“São muitas falhas que a Lei 45/2018 tem que não são cumpridas e a própria lei não foi feita com o rigor exato para criar postos de trabalho e a sustentabilidade das empresas que investem no país”, disse Diogo Fernandes, sublinhando que a lei não deveria ter sido criada sem que os parceiros e os motoristas tivessem sido ouvidos.

Para este motorista, atualmente o valor pago pelas plataformas [Operadores Uber, Bolt e Free Now] “não é justo, nem cobre todos os custos associados, quer à manutenção das viaturas, ao criar de emprego, aos ganhos e aos salários”.

Outra das reivindicações em cima da mesa para este movimento TVDE é que a lei “seja cumprida e alterada em alguns pontos”, nomeadamente nos vínculos laborais, pois há motoristas a trabalhar “sem recibos verdes, a receber rendimento mínimo”, denunciou.

“Acima de tudo mais fiscalização e uma tarifa mínima. O que é fundamental para a sustentabilidade do negócio neste momento e para o qual estamos aqui na luta, por melhores condições de trabalho”, frisou.

Diogo Fernandes lembrou ainda que “as pequenas e médias empresas pagam taxas e tachinhas e poucas ajudas recebem”, frisando que os pequenos empresários podem “criar postos de trabalho e tirar pessoas do fundo de desemprego”, mas sem ajudas não o conseguem fazer.

“É muito chocante termos motoristas a passar dificuldades, a passar fome, porque estão a trabalhar e não conseguem pagar as suas despesas, tirar o seu salário. Temos seguros a rondar 2.500 e 3 mil euros, pagamos manutenção das viaturas para prestar um serviço aos nossos clientes de excelência e qualidade e, com estes preços fixados, o que vai acontecer é que o serviço vai piorar, já tivemos queixas nesse sentido”, explicou.

Ivone Isidro, motorista TVDE há cerca de dois anos e meio, disse à Lusa que atualmente “há um livre-arbítrio” sobre a forma em que podem trabalhar, explicando que muitas vezes está “mais de 12 horas ao volante”.

“Quando comecei, uma viagem do aeroporto a Cascais podia ser 25/30 euros, agora talvez seja 20 euros. É uma diferença enorme desde que comecei”, frisou, salientando ainda o valor dos combustíveis que tem vindo a subir nos últimos tempos.

“O preço agora é baixíssimo. Perdemos muitos motoristas com a pandemia, embora possa por vezes não parecer”, disse ainda.

A Lusa contactou as três operadoras acerca do protesto, tendo fonte oficial da Uber dito “respeitar o direito que todos têm de se manifestar com respeito pela segurança e ordem públicas”.

A mesma fonte salientou ainda que ouve “constantemente os motoristas e parceiros para melhorar a sua experiência na aplicação”.

“Sabemos que tanto motoristas como utilizadores valorizam um serviço fiável, seguro e que faça sentido do ponto de vista económico, e mantemo-nos empenhados em trabalhar para continuarmos a ser a aplicação de escolha de todos”, pode ler-se na nota enviada à Lusa.

Por seu lado, fonte oficial da Free Now manifestou a sua solidariedade para com as revindicações dos motoristas “por melhores condições” e refere que desenvolveram “uma série de iniciativas com o intuito de estimular e elevar a fasquia global do setor”.

“Podemos avançar que subimos a tarifa mínima por viagem, de 2,50 euros para 3 euros, e eliminámos tarifas ‘low cost’, ao contrário dos nossos concorrentes, no sentido de tentarmos mitigar a precariedade e as baixas remunerações associadas à carreira de motorista TVDE”, indica a empresa.

A Free Now refere ainda que está disponível para receber os representantes dos trabalhadores e ouvir as suas reivindicações.

“Aliás, já recebemos outras organizações do setor no passado precisamente com o intuito de se atingirem consensos que permitam uma melhoria generalizada do setor”, aponta.

A Lusa questionou também a Bolt, mas, até ao momento, não obteve resposta.

Atualmente, são três as operadoras a trabalhar no país: Uber, Bolt e Free Now, esta última criada a partir da MyTaxi (serviço de transporte em táxis através de uma aplicação de telemóvel) e que integra também os TVDE da antiga Kapten.

A lei n.º 45/2018 permitiu um período transitório de quatro meses de adaptação aos operadores de plataformas, sendo que os quatro que operavam então em Portugal – Uber, Cabify, Taxify (agora Bolt) e Kapten (marca que começou a sua atividade em Portugal como Chauffeur Privé) – ficaram todos legalizados.

Em maio de 2021, o Governo, através do secretário de Estado da Mobilidade, Eduardo Pinheiro, reconheceu que a 'lei Uber' deveria sofrer alterações, tendo em conta que, em alguns aspetos, o desenvolvimento da atividade dos TVDE “não foi ao encontro do espírito legislador aquando da elaboração da lei”.

Estava prevista para o final do ano passado, tendo em conta que a lei deverá ser objeto de avaliação decorridos três anos sobre a respetiva entrada em vigor, a apresentação de um relatório com uma avaliação do setor, o que acabou por acontecer agora após alguns atrasos, tendo já sido enviado pelo Instituto da Mobilidade e dos Transportes para a Autoridade da Mobilidade e dos Transportes.

(Artigo atualizado às 18:03)