Faltavam cerca de 20 minutos para o limite do prazo quando João Leão entregou o Orçamento do Estado para o próximo ano a Ferro Rodrigues, Presidente da Assembleia da República. Aos jornalistas, o ministro das Finanças disse ontem que esta proposta orçamental está centrada "na recuperação económica e social do país". "É um Orçamento apostado no relançamento da atividade económica com mais investimento, mais investimento público e mais investimento privado", reiterou. Hoje, como é habitual, o ministro apresentou o documento ao país.

De referir que esta proposta foi construída tendo por base as seguintes premissas:

  • A economia portuguesa deverá crescer 4,8% em 2021 e 5,5% em 2022
  • A taxa de desemprego portuguesa descerá para os 6,5% no próximo ano
  • O défice das contas públicas nacionais deverá ficar nos 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2021 e descer para os 3,2% em 2022
  • A dívida pública deverá reduzir-se para 126,9% do PIB este ano e 122,8% no próximo ano

Entre as medidas a destacar neste orçamento está o desdobramento dos escalões de IRS, que vão passar de sete para nove; um aumento nas pensões equivalente ao valor da inflação deste ano (0,9%) ou o fim do pagamento especial por conta. Encontre aqui um guia sobre as medidas deste orçamento e perceba como estas vão mexer com a sua carteira.

Eis o essencial da apresentação do ministro das Finanças do OE2022:

Sobre as "contas certas" de 2021 as perspectivas para 2022

  • Primeiro, o ministro fez um balanço sobre 2021 e a resposta que o Orçamento em curso permitiu dar à pandemia: "Portugal foi o primeiro país a atingir 85% da sua população com vacinação completa contra a covid-19. Esta é uma conquista da maior importância (...). Se por um lado o sucesso da vacinação permite virar a página da crise pandémica, o OE2021, que estamos a executar, deu-nos instrumentos para enfrentar esta crise com maior resiliência. Na frente de combate à covid-19 não regateámos qualquer esforço de respostas. No Serviço Nacional de Saúde reforçámos o número de profissionais de uma forma sem precedentes (...), há hoje mais 29 mil profissionais de saúde do que há seis anos; também não poupámos esforços na proteção dos rendimentos das famílias e no apoio às empresas, os 8 mil milhões de euros de medidas extraordinárias evitaram o descalabro no mercado de trabalho; (...) tivemos a primeira emissão de dívida pública a dez anos com taxas de juro negativas, as taxas de juro baixas permitiram-nos poupanças muito significativas com o serviço da dívida, na ordem dos 3 mil milhões de euros anuais".
  • É neste quadro, diz o ministro, que surge a proposta do Orçamento do Estado para o próximo ano: "num quadro de contas certas e de confiança". "A proposta de Orçamento do Estado para 2022 que apresentámos na Assembleia da República é assente em dois grandes eixos: o primeiro é o de recuperação económica assente no investimento e no PRR, da recuperação das empresas e do apoio à capitalização, da recuperação de rendimentos das famílias e do retomar a trajetória de aumento de rendimentos iniciada em 2016, da recuperação da atividade programada do SNS e das aprendizagens na Educação. Ao mesmo tempo, este é o OE da resposta aos desafios estratégicos que o país enfrenta a médio prazo: desafios demográficos, de combate à desigualdade e ao nível da transição climática".
  • O crescimento estimado para este e para o próximo ano "permite retomar a trajetória de convergência com a Zona Euro interrompida pela crise pandémica. É este forte crescimento que nos permite superar o nível do PIB pré-pandemia já no próximo ano, ficando 1,3% acima do registado em 2019".
  • "Se Portugal estava melhor preparado para a chegada à crise isso deveu-se ao rigor nas contas públicas, não abdicaremos no futuro de uma gestão responsável das contas públicas. Porque sem contas certas não há futuro. (...) Há um ano, num cenário de grande incerteza, apresentámos um orçamento para 2021 que muitos duvidaram ser possível cumprir, mas uma vez mais estamos a cumprir com os portugueses ao mesmo tempo que respondemos à pandemia em todos as suas dimensões e mantemos as contas certas, condição essencial para termos futuro e segurança".
  • Na resposta ao "pós-crise", o Governo destaca cinco áreas de atuação: reforço de rendimento das famílias (578 milhões de euros); apoio ao relançamento das empresas (2.610 milhões); investimento público no âmbito do Plano de Recuperação e Resistência (1.026 milhões); aumento de salários na Administração Pública (780 milhões) e recuperação da atividade na saúde e educação (1.600 milhões).

O orçamento "dos jovens, das famílias e da classe média"

  • Dentro das medidas de reforço de rendimentos, o ministro destaca o "pacote do IRS no valor de 235 milhões de euros, que inclui várias medidas, entre as quais a criação de dois novos escalões, tornando o IRS mais progressivo e, portanto, mais justo". Contas feitas, o governo estima entre 2018 (quando se iniciou a revisão de escalões) e 2022 um "alívio fiscal para as famílias de mais de 500 milhões de euros".
  • Segundo o ministro, "este é um orçamento que presta uma atenção especial aos jovens. Por isso, dentro do pacote de IRS, propomos alargar o IRS Jovem de três para cinco anos e abranger os trabalhadores independentes. A idade limite passa de 26 para 28 anos para jovens que tenham concluído o doutoramento. Vamos ainda prolongar o programa regressar por mais dois anos, permitindo um alívio de 50% em sede de IRS a cidadãos portugueses que vivam no estrangeiro e decidam regressar ao nosso país".
  • Já no âmbito dos apoios à natalidade, "o pacote do IRS prevê o alargamento da majoração da dedução fiscal a partir do segundo filho para 900 euros até aos 6 anos. Esta majoração será alcançada de forma faseada, em dois anos".
  • Concluindo, diz João Leão, o pacote de IRS "constitui uma descida transversal de impostos com enfoque na classe média, nos jovens e nas famílias com filhos".
  • É neste contexto que se cria também "a Garantia para a Infância, para apoiar as famílias com crianças e jovens com menos de 18 anos". Esta garantia é "composta por medidas que visam reforçar o apoio ao rendimento destas famílias", entre as quais o "reforço o abono de família no primeiro e segundo escalão".
  • Para o governo, "a grande prioridade deve ser o combate à pobreza infantil", pelo que, no âmbito desta "Garantia para a Infância" cada criança em situação de pobreza receberá, em 2023, 1200 euros por ano, 100 euros por mês, "o que implica um aumento fortíssimo do abono de família para estas crianças". A evolução é progressiva, sendo que em 2022 o valor fixa-se nos 70 euros por mês.
  • João Leão destacou ainda o aumento previsto das pensões, no valor de 10 euros, para os pensionistas que recebam até 658 euros por mês.

O orçamento para as empresas e trabalhadores

  • Já no que toca às empresas, o governo prevê dotar o fundo de capitalização e resiliência com 1.300 milhões de euros provenientes do PRR. Também se prevê a capitalização do banco de fomento com 250 milhões de euros. Juntam-se a estes valores 900 milhões de euros de apoios a fundo perdido em incentivos e subsídios à empresas para fomentar a inovação, a digitalização as qualificações e a descarbonização do tecido empresarial português. Contam-se ainda 160 milhões de euros em isenções fiscais.
  • No que concerne o investimento público associado ao PRR, estima-se que este represente 1.026 milhões de euros, sendo  de destacar 171 milhões em habitação; 234 milhões em saúde; 98 milhões ao nível das qualificações e competências; 104 milhões  na transição climática e 354 milhões na transição digital. Isto, diz o ministro, "colocará o investimento público acima dos 3%".
  • O Governo estima que o salário médio da administração pública aumente cerca de 2,5%. Esta estimativa é feita tendo por base um aumento de 0,9% do salário, aos quais acresce 1,6% outras valorizações (como progressões, promoções e revisão de carreiras).

Uma palavra para o SNS

  • "A despesa em saúde não é despesa, é um investimento", disse o ministro, salientando que o orçamento para 2022 prevê aumentar a dotação do Serviço Nacional de Saúde em 700 milhões de euros. Isto traduz-se, diz, na contratação de profissionais de saúde e no reforço da autonomia dos hospitais para suprirem necessidades de pessoal".

E agora a educação...

  • "A escola pública soube reinventar-se nos piores momentos da crise pandémica, mantendo a atividade letiva de milhares de alunos mesmo com novos métodos e recursos pedagógicos. Agora estamos a concretiza o plano de recuperação das aprendizagens que prevê um investimento de 900 milhões de euros em dois anos letivos, para reforçar os recursos humanos e equipar melhor as escolas com recursos digitais"

Em jeito de conclusão,  João Leão resume a forma como o governo olha para esta proposta do Orçamento:

  • "Este é um orçamento para o presente e para o futuro, porque não hipotecamos a nossa credibilidade externa, que permite conciliar o aumento do rendimento e do investimento, com uma gestão responsável das finanças públicas. Este é um orçamento bom para os portugueses, rigoroso e sustentável, no qual todos os portugueses se podem rever".

Ministro responde às perguntas dos jornalistas

  • João Leão reforça a importância de ver este orçamento aprovado na Assembleia da República: "Acreditamos que este orçamento tem condições para ser aprovado (...) é um orçamento decisivo para o país numa fase importante, que vai permitir ajudar o país a recuperar rapidamente da crise, que tem instrumentos muito robustos para reforçar o investimento público e privado e para melhorar o rendimento das famílias. Não seria nesta fase compreensível que o país não tivesse este instrumento tão importante para a sua recuperação". No entanto, assume que o documento agora apresentado ainda será alvo de negociações: "o governo sempre se mostrou disponível para no âmbito parlamentar para fazer uma discussão com os partidos para o viabilizar". Mas, por outro lado, reforça que muitas das preocupações dos tradicionais parceiros do governo estão já endereçadas nesta proposta.
  • Sobre o aumento de 0,9% na função pública, em linha com a inflação, João Leão foi questionado se os funcionários do Estado não vão acabar por perder poder de compra em 2022. Nesta matéria, o ministro realçou que o aumento do poder de compra não decorre apenas do aumento geral do salário, pelo que se prevê um aumento médio dos ganhos para estes profissionais em 2022 superior a 2,5%.
  • Já sobre o aumento extraordinário de 10 euros para pensões até cerca de 670 euros, este está previsto que se inicie em agosto de 2022. O ministro adiantou ainda que as pensões até dois IAS (cerca de 878 euros) terão em 2022 uma atualização próxima de 1% em janeiro.
  • Sobre a CP, que não foi abordada na intervenção inicial do ministro, "está prevista a maior aquisição de sempre de automotoras na CP".
  • Questionado sobre o "mau ambiente" entre ministros pela alegada falta de disponibilidade de João Leão para outras matérias que não o orçamento, o ministro comparou o último anos a uma "guerra", com "grandes exigências do ponto de vista financeiro".
  • Questionado sobre o número de profissionais com que o SNS será reforçado com o investimento previsto de 700 milhões de euros, o ministro não foi concreto, optando por fazer um balanço: desde 2016 nós temos mais 29 mil profissionais, é como se o SNS no seu todo aumentasse 25%", disse.
  • Sobre o aumento do salário mínimo — matéria que não é decidida no âmbito do Orçamento do Estado — está previsto um aumento "em linha com o de anos anteriores", e que o governo "cumpra com o objetivo de chegar, em 2023, aos 750 euros de salário mínimo".
  • O ministro confirmou ainda que "não está prevista neste orçamento nenhuma transferência para o Novo Banco" via Fundo de Resolução, sem porém adiantar detalhes sobre a matéria. De referir que o Novo Banco já consumiu até ao momento 3.293 milhões de euros de dinheiro público ao abrigo deste mecanismo de capitalização, estando ainda 112 milhões de euros pendentes de uma averiguação complementar pelo Fundo de Resolução.
  • Sobre a TAP e o seu plano de reestruturação, João Leão adiantou que "neste momento a percepção que existe é que não há nenhuma razão para que esse plano seja recusado pela União Europeia" — o orçamento prevê uma injeção de 1.988 milhões de euros na TAP este ano e de 990 milhões em 2022.
  • O efeito do desdobramento dos escalões do IRS vai ser refletido nas novas tabelas de retenção na fonte a aplicar em 2022 e que o Governo quer que estejam em vigor em janeiro. A informação foi avançada por António Mendonça Mendes, secretário de Estado Adjunto e dos Assuntos Fiscais: “esperamos publicar o despacho das tabelas de retenção na fonte a tempo de em janeiro já estar em vigor”, disse.

(Notícia atualizada às 14:14)