O regresso do Imposto Sucessório tem sido defendido pela associação de esquerda Causa Pública, que tem na direcção nomes como Paulo Pedroso, ex-ministro do Trabalho e da Solidariedade socialista, Alexandra Leitão, deputada e ex-ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública do PS, ou Ana Drago, ex-deputada pelo Bloco de Esquerda.
A Associação Portuguesa de Contribuintes (APC), criada no final do ano passado, é contra este imposto, que considera "perigosamente um desincentivo à poupança e ao investimento. Num país tão descapitalizado e com tão baixos níveis de poupança como Portugal, seria nefasto".
Além disso, "a tributação sobre património acarreta sempre um problema de liquidez dos herdeiros, uma vez que o imposto tem de ser pago em dinheiro, quando a herança pode não ser composta por dinheiro suficiente para pagar o valor do imposto", obrigando os herdeiros a alienar bens como imóveis ou sociedades familiares para pagar o imposto.
E, em resposta à proposta do economista Alexandre Mergulhão, que defende que "Portugal deveria equacionar a reinstituição deste imposto, desta vez sobre as grandes heranças, com uma taxa um pouco acima dos 28%", a APC lembra alguns números: "Em 2016, numa amostra que inclui a generalidade dos países da Europa Ocidental, os EUA, Canadá e Austrália, a receita fiscal do imposto sucessório e de doações não ultrapassava os 0,7% do PIB, havendo países onde não ultrapassa os 0,1% do PIB".
"Nenhuma igualdade virá daqui", diz o economista António Nogueira Leite, que considera que "há uma problema de literacia, as pessoas não percebem realmente o efeito das coisas. Na realidade, vamos provavelmente taxar apenas uma parcela mínima daqueles que estão entre os ricos e a classe média, o que é irrelevante para a redistribuição de riqueza. E há uma data de efeitos negativos".
Entre os efeitos negativos estão o facto de "afectar poucas pessoas e não as pessoas certas, mesmo para quem acredita que os ricos têm de pagar mais, porque os contribuintes mais sofisticados fogem para fora. E a receita era insignificante, os custos de gestão eram mais elevados do que a receita fiscal". Por isso, em 2004, no governo de Durão Barroso, riscou-se o Imposto Sucessório do mapa.
Basicamente, o que este tipo de impostos faz "é punir aqueles que pouparam para os seus descendentes. Enfim, esta medida poderá ser explicada pela Psicologia, mas certamente não pode ser explicada com argumentos económicos", diz o ex-secretário de Estado do Tesouro e das Finanças (governo Guterres). "Mas o português médio adora impostos altos, desde que não seja ele a pagá-los. Se todos à minha volta pagarem mais, fico contente. Têm um sentimento negativo sobre a riqueza dos outros".
Portugal "não tem imposto sobre as heranças, mas tem o AIMI — Adicional ao Imposto Municipal sobre Imóveis, que é quase a mesma coisa", considera o ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais Carlos Lobo (governo Sócrates). O AIMI surgiu em 2017 para substituir o Imposto de Selo, que tributava de forma individual imóveis acima de um milhão de euros, e é aplicado em Setembro a quem a 1 de Janeiro tenha um património imobiliário de valor avultado.
"É a Esquerda, são os adeptos de Piketty [economista francês que se tornou figura de destaque internacional com o livro "O Capital no século XXI"]. São os novos tipos da academia que estão completamente iludidos com as ideias de Piketty sobre as assimetrias sociais. Mas é completamente idiota, porque até Piketty diz que é meramente teórico, impossível de aplicar na prática. Mas ninguém lê a literatura toda", explica Carlos Lobo.
A extinção do imposto sucessório foi integrada numa vasta revisão da tributação do património, assente em estudos, que levou à inclusão das transmissões gratuitas no âmbito do Imposto do Selo a uma taxa fixa de 10% e à criação de uma isenção aplicável aos herdeiros legitimários. Foi igualmente criado um regime de avaliação recorrente do património imobiliário com um impacto relevante da tributação do património imobiliário na sua aquisição e alienação onerosa.
Por outro lado, "a sociedade actual é global, com elevada mobilidade de capital e de pessoas, levando a que impostos sucessórios potenciem situações de dupla ou tripla tributação em função da localização do autor da sucessão, dos herdeiros e dos próprios bens herdados, sendo possível que, no limite, os impostos devidos sejam superiores ao valor dos bens herdados", alerta a APC.
"Esta mobilidade de pessoas e bens tem vindo a acentuar a concorrência entre Estados pela atração de capital e pessoas, pelo que a tributação em matéria de impostos sobre património constitui um entrave a essa captação", acredita a associação liderada por Paulo Carmona, presidente do Fórum de Administradores e Gestores de Empresas.
Sobre o imobiliário, ainda, a APC recorda que "Portugal já contempla quatro impostos (IMT e Imposto do Selo, na compra, IMI na retenção e IRS/IRC sobre a mais-valia na venda). Com o regime fiscal actual, em que o valor atribuído aos imóveis recebidos por herança corresponde ao Valor Patrimonial Tributário (VPT) à data do óbito, os herdeiros acabam sujeitos a IRS nos ganhos entre o valor de venda e o VPT à data do óbito", pelo que pode até afirmar-se que já existe "um imposto sucessório escondido".
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