Os convidados podiam não ser muitos para a importância do noivo e estrelato da noiva, mas incluíram, além de dois ministros britânicos, personalidades tão diversas como o banqueiro Rothschild, industriais tão poderosos que o vulgo nem conhece, Sir Bob Geldof, Sir Michael Caine, toda a família Jagger e até a ex do ex da noiva, Bianca Jagger. Há que assinalar ainda os editores do “Sun”, do “Daily Mail” e do “Times”, o Presidente da News Corporation, braço armado de Murdoch nos Estados Unidos, o escritor Tom Stoppard, o filósofo corporativo Alain de Botton, o fotógrafo estrela da década de 60, David Bailey e o Rolling Stone Bill Wyman.

Senhores bem na vida que casam com senhoritas bem apessoadas é o que não falta neste mundo. Ainda há pouco anunciaram o noivado, ou o ménage a deux, o riquíssimo escritor Mário Vargas Llosa, 80 anos (a fazer dia 28), e a sempre jovem Isabel Presley, plastificada nos sessentas.

O que espanta, ou pelo menos chama a atenção desde chiquérrimo enlace, são as diferenças de vivência e personalidade dos noivos.

Ela, Jerry Hall, texana de Gonzalez, alta e esbelta – apinocada com um vestido branco azulado de Vivienne Westwood, que se diz ter custado oito mil libras – começou como modelo, e nessa qualidade partilhou um apartamento em Paris com Grace Jones e Jessica Lange, até se juntar ao icónico ilustrador António Lopez, o que a lançou definitivamente. Mas chegou mesmo à fama em 1974, quando Brian Ferry lhe deu um anel de noivado e a colocou na capa do antológico album “Siren”, dos Roxy Music. Tem ainda no currículo a originalidade superlativa de ter deixado Ferry para juntar os Prada com Sir Mick Jagger – que por sua vez tinha deixado a superlativa Bianca. Terão feito um casamento não reconhecido pela lei inglesa em 1977, no Bali e tiveram quatro filhos. A música dos Stones “Miss You”, de 1978, foi feita por Mick para Jerry, assim como rock injuriado de Brian Ferry, “Kiss and Tell”, em 1988.

Enfim, uma musa.

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Depois do divórcio do casamento duvidoso com Sir Mick, em 1999 (pela brejeira alegação de que ele a enganava) Jerry desapareceu no mapa, o que não é bom sinal para quem vive da luz. Eis senão quando, em Outubro do ano passado, Jerry conhece Robert, e os passarinhos voltaram a chilrear, os coelhinhos a namorar e as revistas sociais a fotografar.Mas, se Jerry Hall faz parte da espuma dos acontecimentos sociais, Robert Murdoch representa as águas profundas da media militante do capitalismo mais anti-social. Representa, não, é.

Nascido na Austrália, Robert começou na empresa local do pai News Limited e, passo a passo, tornou-se o maior empresário individual de media de que há memória. Só isso. Como?

Em 1969, desembarcou em Inglaterra, comprou os moribundos “News of The World” e “The Sun” e transformou-os nos tablóides mais ordinários e mais vendidos da Grã Bretanha. De caminho, destruiu completamente o sindicato dos tipógrafos e torceu o braço aos jornalistas, criando paralelamente condições de trabalho precárias para a imprensa e uma imprensa virada para o escândalo sem restrições. A luta com os tipógrafos, com Murdoch apoiado por legislação da sua grande amiga Margareth Tatcher, ficou conhecida nos anais das lutas sindicais britânicas como “o episódio de Wapping”.

Em 1985 comprou o conservador e envelhecido “Times” britânico e passou a defender as causas ultra-liberais. Tornava-se claro que a agenda de Murdoch não era o mundo fechado do jornalismo, mas sim a militância politica. Logo apontou as baterias para o mercado mais apetitoso dos Estados Unidos, onde já tinha o tablóide de escândalos “New York Post”.

Para encurtar uma longa história, hoje Murdoch é dono da 20th Century Fox (cinema) da Fox (televisão), Harper Collins (livros) “Wall Street Journal” (a bíblia diária do conservadorismo económico) e tem ainda conglomerados de media na Austrália, Canadá e Nova Zelândia.

A Fox News, a que não temos acesso em Portugal, porque aqui aquelas diatribes não fariam sentido, é o canal de tv mais reaccionário dos Estados Unidos (e, quiçá, do mundo), apresentando opiniões como notícias, sem qualquer preocupação com a verdade dos factos. Para dar um exemplo, entre milhões, um comentador de primeira linha (Glenn Beck) disse num debate: “Não gosto de futebol. Futebol é um desporto socialista, anti-americano.” Ora o futebol, como todos nós sabemos, foi inventado pela classe alta inglesa nos colégios exclusivos de Eton e Winchester e, durante as suas primeiras décadas, era exclusivo dos meninos de boas famílias, inclusive em Portugal, onde começou com o Clube Lisbonense e o Porto Cricket.

Mas na Fox é assim; alguém diz um disparate, e ninguém se preocupa em contestar ou verificar, desde que esse disparate esteja nos conformes do ideário político de Murdoch.

Entre condições laborais e editoriais impostas aos jornalistas e as toneladas de opinião criadas todos os dias para a televisão, rádio e imprensa, Murdoch, sozinho, pode ser considerado o maior vilão da história da comunicação.

Recentemente, em 2011, a batata ia-lhe rebentando nas mãos, quando veio a lume que os seus jornais ingleses usavam métodos inaceitáveis para obter material – ao ponto de gravar ilegalmente os telefonemas duma miúda que tinha sido raptada e assassinada. As investigações provaram que o “News of The World” e o “Sun” tinham gravado telefonemas de políticos importantes e figuras sociais, como o príncipe William, famílias de soldados mortos no Afeganistão e outros particulares que pudessem dar notícia. Também comprava informações da polícia e de todas as autoridades que a tal se prestassem.

Murdoch disse que não sabia de nada, o que é evidentemente impossível, e quem deu a cabeça ao cepo foram os seus directores, inclusive a chefe maior, Rebekah Brooks.

Rebekah essa que, ainda ruiva, mas envelhecida, esteve no casamento de sexta feira – dia em que foi anunciado que voltaria a dirigir o império de Murdoch na Grã Bretanha.

E assim voltamos ao casamento, e não será decente emitir juízos de valor, quer quanto ao enlace, quer quanto aos noivos.

Por acaso, pois a inspiração tem a ver com Jane Austen, acaba de sair um romance da especialista em literatura Helena Vasconcelos que se chama “Não há tantos homens ricos como mulheres bonitas que os mereçam”.

Jerry Hall é uma delas, com certeza.