
Infelizmente, essa lucidez sobre o que realmente importa tem uma duração diminuta. De repente, voltamos a estar em ânsias porque alguém disse não sei o quê; entregamos os pontos à ansiedade ou, pior ainda, mergulhamos numa eterna insatisfação que corrói. O estado depressivo ainda assim tem como se resolver, a insatisfação crónica é o pior dos males.
Quando alguém morre, alguém de quem gostamos ou que admiramos, alguém que nos acrescentou em conversas e riso, percebemos, mais uma vez, que estamos de passagem, somos de ínfima importância. O tal grão de areia.
No estado em que o mundo se apresenta, a todos os níveis, a morte tem apenas a doçura de poupar a algumas realidades a que estamos sujeitos (leia-se, Trump e afins). Todos merecíamos ser poupados a mais sofrimento. Talvez por isso, a vida empurra e seguimos.
Tenho um amigo que mantém um caderno de mortes: aponta os nomes dos que lhe morreram, só esta forma de o dizer — alguém que nos morre — é suficiente para perceber que a morte é vivida com um certo egoísmo.
Não faz mal que assim seja, é o reconhecimento de que alguém nos faz falta, fará para sempre. Afastamos as crianças dos rituais da morte e essa super proteção — coitadinhos, são muito novos — não lhes dá hipótese de participar na dor. Gostaríamos de poupar as crianças ao sofrimento ou deveríamos ter a inteligência de as ensinar a lidar com o que perturba?
De novo, a morte tem o condão de suscitar as perguntas mais díspares. Depois, a vida segue e, infelizmente, não tomamos conta das respostas pelas quais tanto ansiamos.
Comentários