Esta Conferência sobre Alterações Climáticas está dentro do programa das Nações Unidas que culminou, ao fim de anos de esforços de várias partes e da má vontade de outras, com o Protocolo de Kioto, em 1997, e com o Acordo de Paris, em 2015. Para encurtar uma longa história, há anos que a comunidade científica acompanha com crescente alarme as mudanças climáticas provocadas pelo Homem. Embora haja algumas vozes discordantes, a esmagadora maioria dos especialistas considera que estas mudanças são graves, ao ponto de em 1992 as Nações Unidas terem promulgado uma Convenção-Quadro sobre a Mudança de Clima, assinada por 165 países, em que se propunham várias medidas para, se não inverter a situação, pelo menos atrasá-la.
As inúmeras promessas feitas pelos participantes ao longo dos anos, nunca chegaram ao ponto de acabar com emissão dos chamados “gases de estufa” provocada pelos humanos como objectivo imediato; o máximo a que se chegou, no apogeu de consciência ambiental da Conferência de Paris, foi uma redução para níveis de temperatura (provocada pelos gases de estufa) de “apenas” 1,5 graus centígrados acima dos valores pré-industriais. Isto porque, segundo os cientistas, uma subida de dois graus centígrados de temperatura média mundial acima desses valores pré-industriais (isto é, de 1880, ano em que se começou a medir) provocaria mudanças climáticas catastróficas e irreversíveis. Mas os 195 países presentes em Paris só conseguiram concordar em reduzir a emissão de gases de estufa “o mais depressa possível” e “fazer o que estivesse ao seu alcance para não ultrapassar os dois graus centígrados de aquecimento global.” Ou seja, afirmações de boa vontade e promessas futuras. Números, nada. Aliás, falou-se em chegar a zero de emissões de gases de estufa em 2050 – valor que voltou a ser referido agora em Katowice – mas não é preciso ser cientista nem economista para perceber que, do modo como a população cresce e as “necessidades de consumo aumentam, este valor é impraticável".
A questão é que reduzir a emissão de dióxido de carbono (e outros, como o metano, o óxido nitroso e os fluorcarbonetos) tem um custo muito alto. As grandes economias, que emitem muito, teriam de reduzir os seus hábitos de consumo enraizados; e as economias sub-desenvolvidas não têm capital nem tecnologia para investir numa mudança dos combustíveis que usam.
Enquanto isso, as emissões de dióxido de carbono continuam a crescer rapidamente. Em 2010 foram 32 mil milhões de toneladas; em 2014 já iam em 40 mil milhões, um crescimento de 2,3% em relação a 2013.
A escolha desta Conferência em Katowice já é uma espécie de humor negro em relação ao problema. A cidade é o centro de produção de carvão da Polónia, uma forma de energia da qual o país depende completamente. Katowice é uma paisagem industrial ao estilo do final do século XIX, com as suas enormes chaminés fumegantes e milhares toneladas de carvão a céu aberto. Os operários são em parte pagos com carvão, com o qual aquecem as suas casas. Nos invernos desta latitude, o aquecimento não é um conforto, é uma questão de sobrevivência. É impensável que a Polónia possa diminuir a sua produção de gases de estufa a médio prazo.
Há os que não podem, e há os que não querem. Os Estados Unidos abandonaram oficialmente os objectivos do Acordo de Paris em 2016. E agora, em Katowice, Estados Unidos, Rússia e Arábia Saudita recusaram-se a assinar qualquer objectivo. Ou seja, duas super-potências e o sexto país mais poluidor do planeta (a Arábia Saudita), não querem acreditar nas evidências que provocam.
A Conferência era para acabar sexta-feira, mas os participantes decidiram continuar a discutir até segunda. Não faltaram, nem faltarão, discursos de pânico e promessas de melhorar a situação. A palavra irreversível é cada vez mais premente. Mas cada vez se torna mais evidente que a irreversibilidade é irreversível...
A questão aterradora da subida excessiva de temperatura tem ainda a componente de precisar duma contenção universal. A Islândia já usa energia 100% renovável, mas a Islândia tem 330 mil habitantes e uma baixa industrialização. A China, com uma população de mil trezentos e oitenta e seis milhões de utilizadores e em plena expansão industrial, usa 58% de carvão e 35% de renováveis. A Índia, com mil trezentos e trinta e nove milhões de quase-famintos, está na situação oposta: os camponeses continuam a fazer queimadas de milhões de hectares para preparar a terra para o plantio. E a industrialização, que é urgente, não terá grande oportunidade de ser limpa.
A história da ilha de Páscoa é interessante: quando houve o primeiro contacto com europeus, em 1722, a ilha não tinha vegetação e contava com cerca de três mil habitantes esfomeados e centenas de totens inexplicáveis. Posteriormente descobriu-se o que se tinha passado. Inicialmente a ilha estava coberta de palmeiras e vegetação. Num período de colheitas escassas, os habitantes começaram a construir os totens, para o que precisavam de abater uma grande quantidade de árvores para o seu transporte das montanhas para a costa. Quanto mais árvores abatiam, mais o clima ficava inóspito e mais totens eles construíam para pedir abundância aos deuses. Finalmente, quando já não havia árvores, destruiram a sua frota de canoas de madeira, eliminando a possibilidade de saírem da ilha. Talvez mais totens trouxessem a chuva e a reflorestação. Quando sabemos desta história, ficamos a pensar como este povo isolado foi vítima da sua ignorância e não viu a destruição que se estava a infligir.
Que o mundo global e tecnológico, em que todos os povos estão em contacto, possa entrar numa estupidez semelhante, dá que pensar.
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