Escrevo este texto inspirada pelas palavras da Helena Magalhães. Não li os seus argumentos, apenas a breve descrição que introduziu numa publicação no Facebook. Não chega para saber o que está escrito mas é suficiente para imaginar. Nesta era moderna de sites, blogs e partilhas públicas nos sites de redes sociais, achamos que conhecemos o outro só porque este publica umas fotografias assim ou assado. Também conversámos sobre isto há dias, admiradas com o facto de pessoas nos escreverem considerando saber muito sobre a nossa vida. Não sabemos nada uns dos outros, apenas aquilo que queremos que se saiba. O que não é o mesmo do que "saber". A Helena escreve muito sobre o amor - ou a falta dele - e retrata, caricaturando, situações cliché do engate na idade adulta. Não nos conhecemos muito bem mas já gosto muito dela, agora que fazemos um bookcast, isto é, um podcast sobre livros, em conjunto. Adiante.
O amor na idade adulta é difícil e muito incoerente.
Faço parte do grupo que a Helena assume invejar, preocupada com creches e papas. Inveja...? Na verdade, preocupo-me em gerir o tempo que passam a ver televisão, a usar o Musicaly ou o Instagram. Modernices que passaram a fazer parte da nossa vida e das crianças. E são essas mesmas modernices que nos dão cabo da cabeça nisto das relações amorosas. Ou proto-amorosas porque, algumas, não chegam a ser. Os especialistas chamam-lhe amor líquido, porque a segurança das relações à moda antiga foi substituída pelo individualismo, e uma certa intimidade digital, em que tudo pode acontecer através destas ferramentas de mediação que transformam o ideal romântico da relação. Online sex e cenas…
Uma relação demora o seu tempo e, hoje, tornámo-nos especialistas em fazer esperar, projetando a ilusão de uma vida cheia, sem espaço para mais uma pessoa, que terá de se esforçar para marcar a sua presença. Perdemos mais tempo a fingir, nos jogos de toca e foge, responde e não-responde, do que a ser quem realmente somos. O tempo que se perde nisto é equivalente ao tempo que demoramos a apaixonarmo-nos por alguém o que, muitas vezes, não chega a acontecer porque nos cansamos do jogo. Swipe aqui, swipe ali e, quando damos por ela, ficamos reféns desse jogo em que rapidamente passamos da caça ao caçador.
Entre os mais odiados estão, provavelmente, o Messenger do Facebook, o WhatsApp e o Tinder. Mas também o Instagram, com aquelas fotografias que a Helena tão bem descreve: infantis, imaturas, egoístas. Subscrevo e faço de espelho porque o que se diz deles é válido também para elas. A caracterização destas publicações nos sites de redes sociais equivale à ausência de definição de algumas relações modernas. Não somos amigos nem namorados, somos uma coisa no meio, dificil de explicar. Definições para quê? Antes de lá chegarmos já mudámos de ideias e estamos "noutra". Queremos algo simples, fácil e prático, que possamos rapidamente substituir. Isso vende-se na Ikea e não se chama Amor, é provavelmente uma Bësta que dá dez vezes menos trabalho a montar do que o Amor, ou uma relação.
Entre homens e mulheres criou-se um vazio tão grande que será difícil voltar a preenchê-lo. Temos tanto medo de nos dar que nos fechamos sem arriscar. Eles idolatram-se em selfies enquanto elas arriscam no arrojo e levam um valente chega para lá porque, afinal, por mais tecnologia que possamos ter, tudo o que queremos é um belo namoro à moda antiga.
Paula Cordeiro é Professora Universitária de rádio e meios digitais, e autora do Urbanista, um magazine digital dedicado a dois temas: preconceito social e amor-próprio. É também o primeiro embaixador em língua Portuguesa do Body Image Movement, um movimento de valorização da mulher e da relação com o seu corpo.
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