As nossas avós não conheciam panrico ou panike, coca-cola ou ice tea. Também não tiravam selfies nem perdiam horas nesse desporto chamado scroll down que simula o real e nos atira para um mundo de fantasia.

Nesse tempo, a vida não era melhor mas era diferente, em sintonia com aquilo que, ainda hoje, entendemos como vida. Realmente, havia privação e fome no tempo da Guerra e durante o Estado Novo, realmente havia censura e muita ignorância científica mas a ideia de adoptar uma despensa parecida com a das nossas avós não visa reproduzir o que a técnica veio melhorar mas, apenas, recuperar práticas antigas, dos ingredientes sem embalagens e dos produtos não processados. Procura, igualmente, dar resposta à crescente necessidade de adoptarmos um estilo de vida mais simples porque, mesmo que teimemos em ignorar, tudo à nossa volta nos diz para parar, escutar e olhar, como antigamente, nas passagens de nível.

Quem é que ainda se lembra das passagens de nível e do tempo que perdíamos sempre que a passagem fechava para o comboio passar? Será que perdíamos tempo ou estávamos apenas a respeitar o tempo das coisas? Estaremos melhor, agora, com estradas sobrepostas, pontes e viadutos que desviam o trânsito para o comboio passar, fazendo-nos ganhar tempo para depois os ocuparmos com banalidades ou, pior, a trabalhar, porque sim, cada minuto conta?

O nosso estilo de vida está a matar-nos, a vida desenfreada nas grandes cidades esgota-nos e os dispositivos electrónicos que nos acompanham, definindo o nosso dia-a-dia, contribuem para esse estado de permanente ocupação, como se estarmos assoberbados em tarefas nos tornasse mais eficiente ou fosse sinónimo de sucesso. Lamento: não é.

Volto ao início e ao tempo das nossas avós porque, nesse tempo, havia algo que desapareceu e que condiciona totalmente as nossas escolhas: o tempo.

O tempo - e a falta dele - limita as escolhas: comemos mal porque não temos tempo para preparar refeições equilibradas. Compramos mal porque vamos apressadamente ao supermercado que está aberto até à meia-noite, facilita a vida de quem trabalha até tarde obrigando outros a trabalhar em turnos rotativos com poucas folgas, alguns dos quais sentados na mesma posição durante horas para que, nós, os que trabalhamos muitas horas possamos comprar os essenciais a desoras. Faz sentido?

Escolhemos mal porque não temos disponibilidade para procurar marcas amigas do ambiente e embarcamos naquela postura apressada perante a vida em geral e a nossa em particular, evitando pensar. Reutilizamos pouco porque não sabemos como dar uma nova vida às nossas roupas e objectos que fazem parte da nossa vida, porque se tornou mais fácil substituir do que arranjar ou recuperar. Principalmente, mais barato, o que diz muito sobre métodos de produção e um sistema profissional baseado em baixas remunerações. Circulamos de carro porque é mais rápido do que a pé ou transportes públicos (90% das vezes é mesmo) em cidades sobrelotadas e pouco pensadas para receber pessoas.

A lista continua e tudo se resume a algo sobre o qual perdemos, totalmente, o controle: a noção de tempo. De pouco adianta dissertar sobre o estafado “arranjarmos tempo”, “fazer disto uma prioridade”, “tornar um elemento da agenda”... Bullshit. Também já sabem e sabem melhor do que eu que, no dia em que quiserem mesmo ter tempo, arranjam-no. Até lá andam apenas a arranjar desculpas.

O tempo é finito e nós andamos a brincar com essa finitude, enquanto encavalitamos mais uma coisa na agenda e enquanto vamos placidamente aceitando mais uma reunião que poderia ser um e-mail. A frase não serve apenas para imprimir em bases de rato ou canecas com as quais passeamos chá ou café lá no escritório. Que seja um mantra e que nos faça voltar ao tempo das passagens de nível, e ao clássico:

pare

escute

e

olhe