Uma candidatura intocável no campo democrata teria há muito eliminado as hipóteses de Trump. Se os republicanos tivessem escolhido um candidato credível, Hillary dificilmente estaria agora na pole position.
Falta uma semana para conhecermos o resultado destas eleições americanas. Em causa está não apenas a escolha entre um candidato que mete medo e a candidata de quem se desconfia, mas também a maioria que controla o Congresso e condiciona as políticas da presidência.
É da tradição que nos últimos dias de campanha as sondagens mostrem redução de distâncias entre os dois campos e aumento de suspense. Os donos dos media americanos torcem sempre para que a dúvida seja máxima e assim faça puxar audiências e lucros. O “emailgate” relançado (o caso tinha sido encerrado em julho) pelo patrão FBI a 11 dias da decisão reaviva a sombra de não idoneidade que paira sobre Hillary e assim põe em cena a possibilidade de golpe de teatro na ponta final desta eleição.
O sistema eleitoral nos EUA prevê o voto antecipado e sabe-se que até ontem já votaram 22 milhões de eleitores, tendencialmente os mais fiéis em cada campo. Ao longo da próxima semana deverão votar mais de 100 milhões de eleitores. A maioria já fez a sua escolha presidencial e não é de crer que este caso abra um rombo substancial na votação em Hillary Clinton, até porque não há novidades explosivas: os eleitores que tinham apontado votar nela já antes sabiam que o correio eletrónico da candidata seguiu fora das regras do sistema do Estado e também já estavam a par de um sentimento de suspeita sobre a integridade da mulher que quer ser presidente. Não há nada de revelação explosiva na comunicação agora do chefe do FBI porque, de facto, ele apenas disse que há mais emails, para além dos que já foram vistos, e que vai analisá-los, não sabendo se são ou não significativos. Mas a sensação de suspeita fica avivada. Está a ser questionado que um comunicado assim, vago, mas causador de dano, tenha surgido a 11 dias do escrutínio. Até aqui, Donald Trump queixava-se de complot e eleição viciada, agora é Hillary Clinton quem se queixa.
É uma lástima que a eleição do presidente de uma nação que se apresenta como terra de sonho esteja convertida na escolha do mal menor. A eleição de Obama, há oito anos, deu asas ao American Dream – ainda que a presidência Obama, que não conseguiu libertar-se dos espartilhos políticos republicanos, tenha frustrado bastante as altas expectativas. Agora, não se vislumbra essa aspiração do sonho americano, embora a presidência Hillary até possa vir a revelar-se próspera, geradora de consensos e merecedora de elogios, o que seria impensável com Trump.
Há, também em Portugal, quem fique furibundo com a opinião de repúdio de Trump. Também haverá quem não goste de ver rejeitar Le Pen, Orban, Erdogan ou Al Sissi, gente com prática política cujo malefício está demonstrado. A opinião livre é um trunfo das sociedades democráticas.
Desde que nesta última semana eleitoral não surja alguma revelação de facto explosiva, Hillary Clinton vai ser eleita Madam President. No último mês, a sua candidatura foi progressivamente ganhando terreno, ao mesmo tempo que os republicanos definhavam, com muito desagrado dos moderados perante Trump. Essa tendência alimentou a possibilidade de progressos dos Democratas no Congresso, parecendo de admitir que viessem a conseguir a conquista de maioria no Senado. Há uma semana, isso era provável, agora, menos. A ser assim, os republicanos serão tentados para usar a sua maioria no Congresso como um tribunal permanente com sucessivos e paralisantes inquéritos à nova presidente. Será a repetição de um filme já visto na presidência de outro Clinton, o marido, Bill. Que até é reconhecido como um bom presidente.
É uma desgraça que nesta eleição presidencial de agora não se sinta entre os candidatos a superioridade moral e que os eleitores tenham a escolha reduzida ao mal menor.
Também a ter em conta:
Na Turquia, o regime autocrático de Erdogan avança na repressão da oposição e da liberdade de imprensa: o novo diretor do influente jornal Cumhuriyet está detido, há buscas domiciliárias e detenção de 13 jornalistas. Os abusos sobre jornalistas são prática recorrente.
A Venezuela é outra lástima. Também não está fácil para quem tem o ofício de contar.
Os tremores de terra estão a ser um calvário em Itália.
Será que também vai chegar a Portugal a tendência para, em casos de reserva de mesa num restaurante, haver cobrança antecipada? Já agora: será o pequeno-almoço a ocasião ideal para reuniões e decisões?
Quatro primeiras páginas escolhidas hoje: esta, esta, esta e esta.
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