A presidente do parlamento espanhol, a socialista Francine Armengol, poderia ter marcado a votação da investidura já para o final da semana que vem. Escolheu apontá-la para 26 de setembro. É uma opção certamente em harmonia com o líder do PSOE, Pedro Sánchez. Os socialistas julgam que ao darem tempo ao líder do PP para tentar juntar os apoios que lhe faltam estão a deixá-lo a queimar-se em lume brando. Acreditam que os esforços de Feijóo não têm qualquer viabilidade de êxito.

O PP tem o apoio notável de 172 deputados (137 do PP, 33 do VOX, um da CC e um da UPN), mas faltam-lhe quatro para conseguir a maioria absoluta positiva no parlamento. Feijóo vai ousar tentar a abertura aos nacionalistas do PNV (já responderam que conversam mas só por cortesia, recusam apoio a um partido também apoiado pelo VOX) e aos independentistas catalães do Junts  (Puigdemont é imprevisível, mas o preço de alguma concessão de Junts é certamente impossível para o PP).

Nenhum dos dois pretendentes, Feijóo do PP e Sánchez do PSOE, tem maioria parlamentar para formar governo.

O rei Filipe VI, depois de ouvir os partidos parlamentares (exceto os independentistas bascos e catalães que não vão ao cerimonial do rei) fez o que lhe competia na falta de pactos para maiorias efetivas: encarregou o primeiro a cortar a meta eleitoral (Feijóo) de tentar formar governo. Sabe-se que em caso de fracasso, como é muito provável, atribuirá a seguir esse encargo ao segundo (Sánchez).

A investidura de Feijóo é quase impossível. O facto de o PNV ter eleições no País Basco na próxima primavera reforça a exclusão de qualquer reviravolta na já anunciada recusa de apoio. Entre os catalães, Puigdemont pôs na mesa negocial as condições do independentismo. Não se vê que Feijóo, por mais teatral que apareça, consiga conquistar um só dos quatro votos de que precisa.  Está confrontado com uma maioria absoluta de recusa.

Sánchez corre o mesmo risco, mas já mostrou, na eleição da presidência do parlamento, que tem na mão o esboço dessa maioria.

Ao mesmo tempo que Feijóo, Sánchez também estará a negociar, e poderá fazê-lo de forma discreta, com nacionalistas e independentistas. O líder socialista e presidente do governo em funções tem o trunfo prático de ser promotor do avanço da institucionalização da ideia de Espanha plural e de ter harmonizado a relação entre o poder de Madrid e a Catalunha.

Sánchez tem mostrado compreender a singularidade dos nacionalismos no complexo “puzzle” que é Espanha. Feijóo não tem condições para reconhecer essa pluralidade espanhola sem com isso perder o apoio espanholista.

A política implica negociar, ceder, concertar.

Na negociação com os de Puigdemont, Sánchez estará confrontado com a exigência de amnistia. Os socialistas poderão oferecer perdão, sem que a palavra amnistia choque com os limites constitucionais. Também colocarão sobre a mesa a “inteligente generosidade” que o governo progressista em Madrid praticou nestes últimos anos com a Catalunha. Em apoio a esta vontade de entendimento, os dois partidos centrais no bloco progressista ou das esquerdas (PSOE e Sumar) dispõem-se a emprestar deputados (votos) aos partidos nacionalistas e progressistas para que possam ter grupo parlamentar próprio no Congresso dos Deputados.

É assim que ganha probabilidade o cenário de, após a recusa parlamentar no final de setembro da investidura de Feijóo, ser Sánchez a submeter-se, entre 12 e 17 de outubro, à votação de investidura. Se a negociação tiver sido bem arranjada como foi a pactada para a presidência do parlamento, Sánchez receberá 178 votos (121 do PSOE, 31 do Sumar, 7 da ERC, 7 de Junts, 6 do Bildu, 5 do PNV e um do BNG) superará os 176 da maioria absoluta e formará governo. É um facto que será um governo sob alta pressão dos muito heterogéneos partidos apoiantes.

Se as negociações encravarem e a investidura de Sánchez fracassar tal como a de Feijóo, Espanha volta a eleições provavelmente em 14 de janeiro.

Mas, por estes dias, o que se discute em Espanha é se o machismo instalado na cúpula do futebol vai permitir a Luís Rubiales continuar presidente de uma instituição de serviço público como é a Federação Espanhola de Futebol, apesar da indignação social pelo beijo roubado à futebolista campeã do mundo.