Temos visto ferozes discursos a defender a democracia contra o extremismo, os gloriosos valores do 25 de Abril, nobres e convictas investidas dos candidatos presidenciais e seus apoiantes contra a ameaça da tirania. No meio disto tudo tive medo que organizássemos umas eleições presidenciais à maneira! Foi um susto. Por momentos achei que a democracia funcionava às mil maravilhas. Graças a Deus, dias antes das eleições conseguimos dar a volta!
É preciso uma belíssima dose de sabedoria para falhar na organização destas eleições. Tivemos tempo de preparação, sabíamos as dificuldades causadas pela pandemia, estamos numa fase critica para a confiança dos cidadãos no Estado, numa altura quente nas disputas ideológicas, num momento de risco com a ascensão do populismo anti sistémico. Precisávamos de responder à altura. Tínhamos de mostrar aos Portugueses que não estamos em tempo de mimos e pieguices. Mas quase que agíamos da pior forma.
Quase que adiámos as eleições para evitar mais abstenção, valorizar o voto e proteger as pessoas de risco. Foi por um triz! Quase que acertámos na organização do voto por correspondência em respeito aos nossos imigrantes. Um susto! Mais um bocado e ainda aparecia algum maluquinho a sugerir o voto eletrónico, ideia perigosíssima em pleno confinamento! Era o que mais faltava agora, cada um escapar-se a levar a sua canetinha para a mesa de voto. Há quem leve o estojo todo, para ter o tipp-ex à mão no caso de se enganar e votar num candidato que não existe. Que seria, aliás, não ter um candidato fantasma só para ver se as pessoas estão mesmo atentas quando votam. Afinal o que é um teste sem uma rasteira? Não acertas, levas um voto nulo para aprenderes!
Nada disto seria possível sem a afincada dedicação e capacidade organizativa da jóia da coroa da nossa democracia: a Comissão Nacional de Eleições. Tem lutado ano após ano pela nossa abstenção, com grande sucesso. Tem-se dotado de meios imprescindíveis. Um website super giro do século passado. Um jovem e dinâmico presidente apoiado por uma série de gente dos partidos do mais alto calibre e com grande capacidade de inovação! Montes de iniciativas divertidas para promover a cidadania, incluindo a campanha Votar é Seguro (desde que não se enganem no candidato). E claro, com restrições financeiras para mostrar aos portugueses o que é poupar! Tudo como se quer. Competência, credibilidade e dinamismo! O que a democracia precisa.
Mudar isto tudo agora, em plena luta contra um populismo que se aproveita das fragilidades das instituições democráticas e da desconfiança dos cidadãos para com os dirigentes políticos não faria sentido nenhum. Perda de tempo… Pachorra agora!
Há quem, devido alguns errozinhos de nada aqui e ali, tenha vergonha do nosso sistema democrático ou se sinta embaraçado com a incompetência dos dirigentes. Ouvi até gente a profanar, dizendo que é ridículo, triste ou infantil. Já eu acho que não. Acho que estávamos mesmos a precisar de não saber organizar eleições. Agora sim, temos algo por que lutar.
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