Porém, é melhor não mergulhar de cabeça nesse caldeirão, que além de ser mais pequeno que o de Obélix - o que pode deixar marcas no mergulho… -, com frequência é desmentido pela realidade, como sucedeu nas últimas semanas. Mesmo que, em geral, a paisagem possa parecer mais bonita, uma aproximação à realidade portuguesa pode estragar tudo. E depressa. A única forma de prevenir o choque, e o consequente trauma, é estar preparado para o pior.

Um conselho que pode ser muito útil, para baixar expectativas, e evitar frustrações, nos dias que correm: sempre que, num momento de inexplicável optimismo acharem que a sociedade ocidental tem evoluído, que somos hoje mais inclusivos, menos racistas, homofóbicos, sexistas, enfim, que estamos no caminho que vai de encontro à Declaração Universal dos Direitos do Homem, abram um jornal desportivo. E caiam na realidade. É um bom exercício.

Podem ter a “sorte” de apanhar um dia mais morno, sem grandes manchetes ou histórias cabeludas. Mas é raro… Em geral, levam sempre um banho de realidade que tanto pode passar por uma agressão animalesca como por uma troca de insultos que envolvem toda a família dos envolvidos - ou, nos casos mais pitorescos, uma cuspidela que envolve líderes de clubes presumivelmente adultos e educados.

Sobre a famosa cuspidela, não adianta chover no molhado. Daqui a cem anos, quando os Historiadores andarem a vasculhar os media de 2016, vão certamente estranhar o interesse e a minúcia com que o tema foi explorado e debatido, numa obsessão quase doentia que, no limite, levou um dos protagonistas a ter o momento iluminado de explicar as cuspidelas dos jogadores em campo como um reflexo nervoso próprio do futebol…

Estávamos a fechar o capítulo “Saliva que se expele da boca” (cito dicionário, claro), quando a mesma imprensa desportiva revela que, num desencontro verbal entre Cristiano Ronaldo e Koke, durante o Atlético Madrid - Real Madrid, de sábado passado, ao ser chamado de “maricas”, Ronaldo terá respondido: “Sou maricas mas cheio de dinheiro”…

Repare-se na sofisticação e lógica da resposta: à ideia de “maricas” responde-se com… dinheiro. Podia ter sido “Sou maricas mas sou o melhor jogador do mundo” ou “Sou maricas mas tenho uma cadeia de hotéis com o meu nome”. Tanto faz. Trata-se de uma nova forma de associação que nos pode levar longe - eu chamo socialista ao adversário, e ele arruma-me: “sou socialista mas sou do Benfica!”; “sou louro mas sei cozinhar!”, e não tem fim o ridículo de conjugações que podemos encontrar.

E ficaríamos pela brincadeira parva não se desse o caso da resposta de Ronaldo - como o “insulto” de Koke - não revelassem que, apesar das leis, da boa vontade e das melhores intenções, nada mudou muito mais do que, como canta Sérgio Godinho, na “ilusão das aparências”. Quando chega a hora da verdade, quando o sangue ferve e o raciocínio deixa de ter filtro, a maioria de nós volta a ver tudo a preto e branco, mergulhada nos mesmos preconceitos, intoxicada pelo mesmo passado. Nessa medida, o mundo do futebol continua a ser um dos mais fiéis barómetros da nossa realidade social - e uma forma segura de baixarmos as expectativas e aceitarmos que continua tudo por fazer. Mesmo quando estamos cheios de dinheiro. O que nem sequer é o caso.

A ver…

Há cerimónias que conseguem fazer o pleno: os nomes envolvidos, o simbolismo, o momento. É comovente e muito forte este bocado final da Presidência de Obama com alguns dos nomes que felizmente vieram ao Mundo no nosso tempo…

Num daqueles seus regulares golpes de génio jornalístico, a revista Time publicou há dias uma edição especial dedicada às 100 fotos mais marcantes de todos os tempos. A escolha, como qualquer escolha que se preze, oferece discussão - mas a forma como a revista apresenta online, e em papel, a sua eleição, é um exemplo indiscutível de bom gosto. A não perder…

Mais original, actual e assertiva seria difícil, para um jornal como o The New York Times, fazer a cobertura da passagem de Donald Trump, já depois de eleito presidente, pelo jornal. Não desvendo o conteúdo: são menos de dois minutos que valem por si. E pelo que interpretam.

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