A faculdade até pode ser para ti. Talvez saibas desde os 3 anos o que queres fazer para a vida e o curso onde conseguiste entrar será porventura a única via de alcançares os teus objetivos. Ou talvez não. Há uma boa probabilidade de teres sido colocado no curso que a tua média medíocre permitiu, sem qualquer relação com a tua verdadeira vocação. Não te preocupes, que a faculdade pode não ditar aquilo que farás para o resto da vida, mas vai pelo menos estreitar as tuas opções. Sim, provavelmente vais ficar tão saturado e desmotivado com o teu curso que, no fim destes três ou quatro anos, vais manter todas as opções em aberto, menos a área de conhecimento em que dolorosamente te acabaste por licenciar. É uma ajuda.
Talvez tenhas entrado na 3ª ou 4ª opção. No menu das opções de vida acabaste por pedir uma omelete de queijo antes da cozinha fechar, porque não havia mais nada. Não tem mal. Entrar num curso só porque sim está para a vida profissional como os casamentos combinados estão para o amor. Ao início até parece giro por causa da festa, mas a partir do segundo mês vais querer voltar para casa dos pais, a chorar e a dizer que não merecias que te obrigassem que te sujeitasses a tamanha violência.
Hey, mas não deprimas! A faculdade não é só frustração das expectativas profissionais. Também é burocracia à antiga. Os serviços de secretariado das faculdades são geralmente reservas antropológicas do Paleolítico Inferior, geridas por duas quarentonas mentalmente classificadas como menir. E também é carneirismo do pior. Dir-te-ão, “se não fores praxado não podes ir aos jantares do caloiro”. É o chamado Paradoxo de Strogonoff: achar que um futuro licenciado deseja passar o mês de Outubro a encher a cara de bifinhos cancerígenas e sangria sulfúrica, no meio de pessoas a quem não dirá “bom dia” passados seis meses. Quanto à tuna, até podes tentar entrar, mas lembra-te de que, para seres admitido, tens de apresentar um Certificado Oficial de Loserness, caso contrário podem obrigar-te a estagiar uns meses nos escuteiros até ficares apto. São muito exigentes nesse capítulo.
Não duvides: vais conhecer a verdadeira decadência. Se vens estudar para Lisboa e julgas que vais habitar um domínio do esclarecimento e da cultura, desengana-te. Vais arrastar-te por um T2 num 5º andar sem elevador, em Arroios, com mais três macacos de Angra do Heroísmo, no meio de 24 tupperwares de sopa de agrião, 138 embalagens de Lasanha Alfredo e um sinal de cedência de passagem que trouxeste para casa depois da Festa do Caloiro do ISCTE, numa noite em que te estavas a sentir doidivanas.
Não raras vezes beberás álcool todos os dias da semana, ao ponto de chegares a Domingo, mandares abaixo uma de JP Azeitão e dizeres “já estava a precisar assim de uma noite mais calminha”. Passarás a vida em muitas e desorganizadas festas, onde tens malta de mestrado em Engenharia no IST a chamar o técnico da Super Bock com a 4ª classe porque não percebe como funciona a boca de imperiais. Em termos de tempo de espera com uma senha na mão, já desesperei mais no Gordão do ISEG do que na renovação do passaporte. Uma vez, em Direito, saiu tanta espuma do barril que tiveram de cancelar a Festa da Cerveja e substituir por uma Erasmus Foam Party.
Podes levar isto a sério. Ou podes pura e simplesmente ignorar malta que escreve textos a estandardizar algo que deve ser uma experiência não formatada. Eu sou a pessoa que menos sabe disto tudo, até porque sou um college dropout. Que é uma palavra americana para “gajo que cagou na faculdade”. Portanto, se ainda achas que uma carta tem a força para te orientar a vida nos próximos 3 anos, faz como eu. Ou não faças. Não cagues necessariamente na faculdade, não julgues como certo que vão ser os melhores anos da tua vida. O único concelho que te é legítimo dar é paradoxal: caga mas é nas cartas.
Recomendações
Hoje cumprem-se 16 anos (ou comemoram-se, se fores gestor de um site de teorias da conspiração) desde os Atentados às Torres Gémeas. Comecei a ler o “Homem em Queda”, de Don DeLillo, um dos livros mais aclamados sobre o tema.
Eu e Diogo Batáguas vamos fazer stand-up em Lisboa, no Teatro A Barraca, no dia 19 de setembro. O espetáculo é às 22h e as reservas fazem-se por aqui.
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