A resposta é simples: ninguém. Morrer é uma merda. Não há outra forma de ver o nosso fim, a falta de importância, a medida transitória da nossa existência que, afinal, se resume a ser uma partícula ínfima e sem grande monta. A resposta é igualmente simples para quem está em sofrimento ou com uma vida indigna desse nome. Existem pessoas que prefeririam não continuar uma espécie de vida que lhes traz sofrimento e pouco ou nada mais.

R teve um acidente de mota e ficou numa cama. Não se mexe, não fala. Entende o que lhe dizem? Os que lhe querem bem acreditam que sim. R tem trinta e poucos anos, uma mulher e uma filha pequena. Há uns dias, a mulher – cuja vida mudou radicalmente e que só consegue ir visitá-lo, à clínica onde está, uma ou duas vezes por semana – perguntou-lhe se teria preferido morrer no acidente. Ele respondeu que sim. Com a cabeça, com os olhos. A mulher já chorou tudo o que tinha para chorar e, ainda assim, continua a chorar.

Desculpem, ninguém quer morrer. Mas ninguém quer viver assim ou em situação similar. Eu não quereria. E mesmo que Cavaco Silva venha falar em atentado à Constituição, ou que a Igreja (as várias igrejas) advogue a vida acima de tudo, creio que o desumano é não ter a humanidade de perceber que existem situações em que a vida não tem valor. Além do sofrimento de R, considerem a mulher e a filha e depois preguem moralismos e afins, a ver se faz sentido para vós. A vida só é vida se vivida e, já agora, se não estraga a dos demais. Quem quer morrer? Ninguém. E quem quer viver sem viver? Ninguém. Esta seria a resposta. Tivemos o PSD a dizer que queria um referendo e temos em Belém um presidente que, tal como fez na interrupção voluntária da gravidez, vai fazer o que puder, para preservar uma ideia que rouba a liberdade de quem não tem condições para continuar a viver.

Faltam menos de dois anos para os 50 anos do 25 de Abril, e ainda não aprendemos o que é liberdade.