Só que agora o “Vai ficar tudo bem” está naturalmente desatualizado. O “Vai ficar tudo bem” referia-se ao tempo em que nos unimos como país e em que requisitámos um crédito de resiliência, um adiantamento de obstinação e um factoring de estoicismo. Hoje, não só já dificilmente nos sobra algum destes fundos, como as moratórias que adiavam a sua regularização acabam de vencer e já estamos a pagar toda essa força emprestada com juros. Agora será mais indicada uma expressão mais passivo-agressiva: “Tudo bem”. Mais umas semanas em casa? “Tudo bem”. Verão sem bebedeiras? “Tudo bem”.

O novo confinamento, necessariamente, será diferente. Não há confinamento como o primeiro. O primeiro vivemos com um misto de pânico sanitário e Euro 2004. Havia um medo do desconhecido - que, aliás, ainda se justificaria hoje - e, ao mesmo tempo, um sentimento gregário de sofrimento. Estávamos “nisto” juntos. Nada comprova mais o absurdo do tempo excecional que vivemos nesta primavera como o facto de, a certa altura, Rui Rio ter sido considerado uma figura consensual.

Agora, as coisas são um pouco diferentes. A coesão foi substituída por amargura territorial. Os novos casos são quase todos em Lisboa e Vale do Tejo, uma área que se estende da Nazaré até Sesimbra, mas que permite um aceitável preconceito direcionado contra a capital (atenção, sou sempre a favor de cascar em Lisboa, é um bom punching up que acho que merecemos). De facto, haverá poucas razões para um habitante de Tavira não poder ir beber um copo, a não ser que vislumbre matrículas de carros comprados na Santogal Lisboa nas imediações do bar onde quer ir.

Há ainda a questão dos planos especiais de confinamento, tendo em conta a especificidade dos novos focos de infeção. Por exemplo, considero que não seria descabido confinar uma parte específica da população que vivesse à custa dos outros, que gosta de andar de um lado para o outro, que circula amiúde com estupefacientes no bolso, que não paga impostos nem Segurança Social e que não gosta de ir à escola. Sabem de quem é que estou falar, não é? Dos jovens, claro. Parece-me uma grande incoerência do deputado do Chega. Se realmente estivesse preocupado com a saúde pública, já teria proposto uma rede de campos de trabalho (de casa).

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