Diário de quarentena, por Patrícia Reis. Dia 3
É sábado, aquela sensação de felicidade, de ficar até tarde na cama e levantar-me por ter má consciência, afinal o cão precisa de comer, precisa de ir à rua, essa sensação hoje não me assaltou.
Não vou ao mercado biológico perto do rio, não vou ao mercado de Alvalade (o melhor da cidade, na minha modesta opinião e não vivo naquele bairro). Não rumo à aldeia do meu coração, o Meco, para descansar e comer peixe como deve ser. Para ver os amigos. Não que não os veja, porque a tecnologia aproxima-nos de outra forma e tem sido maravilhoso ver como os amigos se organizam em grupos de mensagens para partilhar larachas, receios e até fotos dos seus locais de trabalho em casa. Estamos juntos virtualmente e sentir esse afecto importa-me muito.
Uma amiga, Carmen (como a ópera, é assim que costuma apresentar-se) vive em Düsseldorf e escreve-me para me dar notícias sobre a propagação do vírus e também para me mostrar os pratos que confecciona em casa. Estimula a minha imaginação e eu resolvo que este sábado será passado na cozinha. Rolo de aves com esparguete de courgette, salada de tomate e mangericão, lombo de peixe recheado com pasta de legumes? Uma coisa é certa, sábado não é dia de trabalho.
Revejo o curto vídeo que me chegou de Itália, na cidade de Siena as pessoas cantam uma canção popular, as ruas vazias, as janelas das casas abertas e as pessoas conferem um sentido do humano à vida através do canto. Volto a comover-me. Ainda não vi nenhum hashtag a dizer que somos italianos, mas somos. Devemos a Itália um património imenso, artístico, cultural, filosófico, poético, literário, musical e ser europeu é também ser-se um pouco italiano.
Nota: para quem queira ouvir boa música, Salvador Sobral oferece-nos hoje um concerto em live streaming, pelas 21:30. É estar atento às redes sociais do cantor. E agradecer quem nos pode dar o seu melhor à distância. Para quem gosta de teatro, veja a iniciativa do Teatro Viriato agora dirigido pela Patrícia Portela, se a montanha não vai ao teatro, vai o teatro à montanha. Iniciativas destas são para aplaudir.
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