A pandemia já nos deu vários exemplos de que estamos rapidamente a caminhar para um mundo mais “a la Black Mirror” do que aquilo que imaginamos. Um desses motores tem sido a crescente popularidade das criptomoedas e das tecnologias de blockchain que as suportam, que permitem mais funcionalidades do que a simples transação descentralizada de moedas digitais, nomeadamente na monetização de conteúdos.

Desde o início deste ano, vimos as criptomoedas Bitcoin e Ethereum atingirem valores recorde e também assistimos à febre das NFTs, ativos digitais que permitiram criar milionários através de clips de jogadas da NBA, tweets ou de uma colagem de imagens feitas no Photoshop. A história de hoje foca-se numa plataforma a tentar criar mais um canal de receitas para “criadores de conteúdo”, mas não só. Apresentamos a BitClout.

O nome não é uma coincidência A BitClout resulta da junção das palavras “bit” (um pedaço de informação num computador) e “clout” (poder ou influência sobre pessoas ou eventos). É uma rede social, construída numa blockchain, que tem como criptomoeda a BitClout (BTCLT), e na qual utilizadores podem especular com a reputação de uma personalidade como fazem com o valor de ações, ETFs e criptomoedas. A versão beta da plataforma, desenvolvida por um grupo de developers anónimos, foi lançada há menos de um mês, mas já conta com o apoio de fundos de venture capital com boa reputação como a Andreessen Horowitz, a Coinbase Ventures e a Sequoia Capital.

  • O que é a reputação? Baseado no Twitter, o algoritmo da BitClout foi feito para acompanhar seguidores, posts, gostos, comentários e outras características que servem de proxy para perceber se uma determinada personalidade é maioritariamente bem vista ou não. Apesar de o projeto ser open-source (pode ser acedido por qualquer pessoa), é fácil perceber que logo aqui poderão haver alguns problemas no valor que é colocado numa personalidade.

Como se negociam personalidades? Tal como em qualquer plataforma de trading, na BitClout é necessário criar uma conta e fazer uma transferência de um montante para que seja possível investir em ativos. No entanto, nesta plataforma existem duas particularidades: 1) a conta tem que estar associada a uma conta no Twitter e só é ativada depois de o utilizador fazer um tweet com o link do seu perfil na BitClout; 2) a plataforma só aceita depósitos em Bitcoin, que depois converte para a sua própria criptomoeda. Porque será?

Com o perfil criado, a forma como utilizadores podem investir em figuras conhecidas é através de “creator coins” ou tokens, moedas sociais associadas ao perfil de cada uma delas. O seu valor vai subindo ou descendo consoante as oscilações na popularidade destas personalidades. Se a Tesla criar um carro voador com imenso potencial, é provável que o preço das suas ações suba dadas as boas perspetivas que os investidores têm para o seu futuro. No mesmo exemplo, o sucesso do carro voador significará que o seu CEO, Elon Musk, gozará ainda de maior popularidade no mundo inteiro (com uma boa dose de tweets elogiosos), o que naturalmente levará mais pessoas a querer comprar a sua “moeda” na BitClout, causando uma subida no preço. Contudo não existem moedas infinitas para cada perfil:

  • De acordo com a BitClout, cada um terá sempre entre 100 a 1500 moedas, porque o algoritmo por detrás do preço de cada “creator coin” foi desenvolvido para que o seu preço aumente a um ritmo cada vez maior à medida que existem mais moedas em circulação, o que significa que a partir de um determinado nível seriam necessários milhares de milhões de dólares para comprar mais uma moeda.
  • Adicionalmente, na criação da cada conta, são atribuídas ao utilizador uma percentagem das suas próprias moedas, para que este possa potencialmente beneficiar da sua maior popularidade do seu perfil.

Não era notícia sem polémica No meio de toda a inovação, existem dois temas que levaram a algum ceticismo relativamente à plataforma e com alguma razão:

  • “Ponho dinheiro, mas não o posso tirar”: como a BitClout ainda não está registada em nenhum índice de criptomoedas, os utilizadores ainda não podem tirar os seus ganhos da plataforma, por não ser possível ainda uma conversão direta da BitClout para dólares. É uma diferença grande para os NFTs que, por serem desenvolvidos num sistema de blockchain com uma criptomoeda já estabelecida (a Ethereum) permitem que o processo seja bem mais simples.
  • “Mais vale pedir desculpa do que licença”: uma plataforma baseada na popularidade só resulta se… tiver pessoas conhecidas. Mas como pode o utilizador comum investir na Taylor Swift se a artista não criou uma conta na plataforma? Para resolver este problema, a BitClout tomou uma decisão no mínimo questionável. Pegou nos perfis das 15 mil pessoas mais populares no Twitter (sem a sua autorização) e, através da informação disponível nos seus perfis, fez uma espécie de pré-registo na sua plataforma que já permite que seja possível investir nas moedas destas personalidades. Os responsáveis da “cripto-rede-social” argumentaram que apenas fizeram isto para evitar que fossem criados perfis falsos destas figuras, mas o mais provável é estarem alguns processos em tribunal a caminho.

No futuro… apesar de todos os problemas, a BitClout pode ser uma alternativa a plataformas como o Patreon. Imagine um artista a fazer um álbum especial para 10 maiores acionistas da sua “moeda” ou a dar-lhes, mais cedo, acesso à compra de bilhetes para um concerto importante. E, claro, poderá ser mais uma forma de diversificar investimentos e de poder dizer a frase “tenho ações da Apple, um gif, duas casas e três moedas do Bruno Nogueira”.

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