O espaço é um enorme vazio gelado. É tão vazio como imaginarmos uma bola de futebol em Madrid, no centro da Península, e pensarmos que, em média, todo o resto de Portugal e Espanha sem qualquer outro adereço. É assim o vazio que nos rodeia.
Chega-se a esta conta absurda multiplicando dois fatores da ordem do infinitamente pequeno: se fôssemos postos ao acaso num qualquer ponto do universo, a probabilidade de estarmos dentro de uma galáxia seria muito mais baixa que a de ganharmos o Euromilhões; se fôssemos postos ao acaso dentro de uma galáxia, a hipótese de estarmos perto de uma estrela seria também muito mais baixa que a de ganharmos o Euromilhões. Conhece alguém que tenha acertado duas vezes no Euromilhões? Ou três, para fazermos as contas de forma mais rigorosa.
O espaço é um vazio. Não absoluto, que há alguma matéria interestelar. Hidrogénio, sobretudo, dimanado do Big Bang. Numa concentração reduzidíssima, mas, ainda assim, existente.
Matéria atrai matéria, ensinaram-nos na escola. E algumas ‘nuvens’ de moléculas têm partículas suficiente para iniciar um processo de formação, um processo de interação que vai resultar em algo maravilhoso. Tudo isto, novamente, na imensidão do espaço interestelar.
Se a matéria começar a dançar com matéria, haverá movimento, e o primeiro andamento de um processo criativo pode estar em marcha. Haverá, por via da atração gravitacional, mais matéria a juntar-se ao baile e possivelmente haverá movimento circular por via de toda esta azáfama. Se tudo correr de feição, haverá um disco de matéria a girar, e se esse disco tiver matéria suficiente, irá agregar mais matéria no centro. Se tudo isto acontecer, teremos aqui um disco protoplanetário. Em ciência, chama-se «colapso gravitacional» ao que desencadeia este fenómeno.
A matéria no centro irá tornar-se mais densa, muito mais que a da periferia do disco. Se tudo continuar a correr conforme o processo de criação que abordamos, o amontoado de matéria será suficiente para gerar um corpo, e esse corpo, se tiver matéria suficiente, irá acumulá-la ao ponto de dar início à fornalha da fusão nuclear – nasce assim uma estrela.
O resto do disco protoplanetário tem matéria, mas densidade mais baixa. Provavelmente, irá gerar-se um fenómeno de acreção (do tal matéria atrai matéria) e alguns outros pontos de massa, não tão densos como a estrela do centro e por isso incapazes de começar os processos de fusão nuclear, poderão ganhar forma – nascem assim os planetas.
É uma ocorrência relativamente comum. Há, contudo, muitas ocasiões de dança de matéria que originam não uma, mas duas estrelas. Outras ainda três ou mais, e chegamos assim aos sistemas múltiplos.
A geração de novos mundos
No universo da atualidade, com 13,7 mil milhões de anos, é este o processo de geração de novos mundos. Como dizia Carl Sagan, são «dolorosamente belos» no meio do nada que forma o universo.
As estrelas são obviamente conhecidas desde a antiguidade. A ideia peregrina de serem sóis distantes (ou de o Sol ser igualmente uma estrela, só que muito mais próxima), foi proposta por Anaxágoras há 2500 anos.
Dois mil anos depois, alguns astrónomos do Renascimento supuseram então planetas em torno destas estrelas. Claro que a noção de exoplaneta era muito diferente da atual, que ganhou forma teórica no começo século XX por via de medições mais precisas dos movimentos estelares e forma prática na década de 1990, quando foram efetivamente descobertos os primeiros – pensemos na dificuldade de discernir pequenos pontos que não emitem luz ao pé de uma esfera enorme e ardente em processos de fusão nuclear – nunca foi fácil encontrar um planeta a orbitar uma estrela que não o Sol
Está aqui um resumo do que foi então toda esta empreitada de sonho. Nos nossos dias, com telescópios no espaço, e desde há quase três anos com o formidável James Webb, estas descobertas, sem serem uma novidade quase diária, tornaram-se rotineiras.
São efetivamente descobertas maravilhosas, mas a questão da vida noutros planetas exige toda a cautela. As moléculas orgânicas, se forem complexas, e a complexidade é condição necessária para a vida, exige muito mais que as condições propícias para pensarmos, de supetão, que temos vizinhos aqui perto que querem falar connosco.
Os fatores da geração de vida serão outros e a eles podemos voltar brevemente. Afinal, quem é que não gostaria de dar um abracinho ao seu irmão interestelar? E, se pensarmos um pouco nesta hipótese, não será esta a ideia mais arrojada que nos pode passar pela cabeça?
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