No dia 11 de maio, a empresa responsável pela Sancuarty, uma das aplicações de astrologia mais famosas do mercado, recebeu um investimento de três milhões de dólares do fundo BITKRAFT Ventures e de seis investidores, KEC Ventures, Greycroft, Azure Capital Partners, Advancit Capital, Gaingels, e Uncommon Denominator.
A injeção de capital na empresa ressuscitou um debate que foi intenso em 2019 - e que está bem condensado neste artigo do The New York Times, da jornalista Erin Griffith, e que, curiosamente, também tem a Sancuarty como protagonista - sobre se é ou não é legítimo financiar este tipo de empresas, sob pena de estar a alimentar algo que não é baseado numa ciência exata.
Josh Wolfe, colunista e editor da Forbes e cofundador da Lux Capital, um fundo de investimento direcionado para tecnologia e para a ciência, foi umas vozes mais críticas: “A sério: vergonha para quem investir ou encorajar esta treta. Não tenho dúvidas que há procura - mas isto não é entretenimento, é encorajar um disparate de banha de cobra. Devíamos desejar uma sociedade informada, educada e racional e não ingénua e supersticiosa”.
A Sancuarty está envolvida em algumas batalhas jurídicas devido ao facto de a legislação de alguns estados não permitir a prática de uma série de atividades de forma comercial, como é o caso da astrologia. No estado de Nova Iorque, por exemplo, onde fica a sede da empresa, o ato de ‘adivinhar o futuro’ é punível por lei, a não ser que este ocorra para fins de entretenimento.
É precisamente essa a finalidade que o CEO da Sancuarty, Ross Clark, argumenta para a aplicação. “Acima de tudo, as nossas leituras são fornecidas para fins de entretenimento”, afirmou em declarações à Fortune [artigo pago], sublinhando que acredita que a atividade produzida não encaixa nos trâmites que a poderiam tornar ilegal.
Além disso, o CEO afirma que as leituras fornecidas pela app procuram “conectar-se com a energia de um cliente, uma situação, um relacionamento ou um evento apenas no tempo presente; tudo no futuro é determinado pelo livre arbítrio. Uma leitura concentra-se em disponibilizar essa energia para que os nossos clientes tenham uma conversa sobre essa energia e capacitá-los a encontrar a sua própria verdade, ajudá-los a entender as suas próprias questões e energia, e onde isso os levará no futuro”.
Ao TNBI, o fundo de investimento português Indico Capital disse não ter conhecimento de movimentações no mercado português nesta área. “Não são áreas típicas de investimento. O que mais se aproxima são aplicações que promovem o bem-estar mental, a meditação e outras terapias associadas - aí sim há muito investimento, no qual se encaixa a nossa participada Zenklub, líder no mercado brasileiro”, afirma Stephan Morais, General Manager Partner da Indico.
Já sobre a polémica à volta de investimentos como o realizado na Sancuarty, Stephan diz que existem duas dimensões a considerar por um fundo. “Primeiro, existe o plano do que é permitido e legal, de acordo com a lei e de acordo com a tese de investimento legalmente acordada com os investidores. Segundo, existe a sensibilidade dos sócios da sociedade gestora do fundo e será aqui que reside a questão. Este tipo de investimentos a Indico muito dificilmente os faria, mas não podemos criticar outras gestoras que os façam por que não são ilegais em principio”.
Períodos de maior incerteza, como aquele que hoje vivemos devido à pandemia de covid-19, levam mais pessoas a querer esclarecer-se sobre o futuro. Assim, numa altura de crise iminente, o tema deverá voltar para cima da mesa, sobretudo nos EUA, onde existem várias aplicações ligadas à astrologia e que oferecem desde consultas a leituras personalizadas. Face um eventual aumento da procura, não é surpreendente que tenham lugar mais investimentos deste género, alimentando o debate sobre a ética deste tipo de apostas, onde é ténue a linha que separa aqueles procuram entreter-se e os que efetivamente precisam de ajuda.
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