Os Capitão Fausto são Tomás Wallenstein, Francisco Ferreira, Domingos Coimbra, Manuel Palha e Salvador Seabra. Depois de percorrem o país entre festivais de verão e salas de espetáculo, esta quinta-feira, sobem pela primeira vez ao palco de uma das salas mais emblemáticas do país, o Coliseu de Lisboa. Ao terceiro álbum, “Capitão Fausto têm os dias contados”, a banda de “Amanhã Tou Melhor”, é hoje um dos maiores fenómenos musicais do pop rock nacional.
Fomos tentar perceber melhor quem são os Capitão Fausto. A opção mais fácil seria tentar chegar à fala com os próprios, mas optámos por lançar o desafio a quem já os viu muitas, não demasiadas, vezes. Henrique Mota Lourenço tem 21 anos, estudou jornalismo e escreve regularmente sobre música e literatura. De momento está a estudar guionismo e por isso diz que hoje vive um bocado “entre a ficção e o jornalismo”. Já viu os Capitão Fausto 27 vezes e hoje estará novamente no Coliseu.
A primeira vez foi num festival no Lx Factory, em 2012, ainda “eram muito novinhos”, e a última na edição deste ano do Mexefest.
Como tudo começou. A primeira vez que os ouviu estava no liceu. Ainda numa fase muito inicial, o primeiro disco não tinha sido lançado sequer. Viu alguns vídeos na internet e achou a banda interessante, “sobretudo pelas letras”. “Tinham alguma coisa para dizer”, começa por nos contar Henrique.
Mas havia ali mais qualquer coisa. “A banda no início tinha uma sonoridade um bocadinho colada a algumas bandas do indie rock. Hoje já não. Acho que partiu para outra onda, talvez um psych pop ou uma coisa que não está tão colado ao indie mas tem um lado pop”.
Havia ainda um sentido literário associado à rebeldia. Usando metáforas ou expressões literárias ou influenciadas por autores de uma forma rebelde e num contexto de maior liberdade. Para Henrique, os Capitão Fausto não sentiam a “necessidade de se armar ao pingarelho”. “Nas letras deles nunca senti isso, ‘eu vou escrever isto porque vai ficar bem, eu vou escrever isto porque de facto são as coisas que sinto’”, explica.
De Baudelaire a Álvaro de Campos, as referências literárias que reconhece nas letras dos Capitão Fausto são várias. Acha piada a “um certo elitismo literário” associado à rebeldia.
Ao longo de três álbuns, há uma evolução tanto nas letras como nas melodias: “de disco para disco não conseguem ser iguais, não conseguem manter a mesma estrutura nas canções”. “É uma banda que vai mudando consoante os gostos” das pessoas que dela fazem parte. Isso agrada a Henrique, “não é uma questão de modas”, conseguem mostrar nas músicas aquilo que ouvem. Há musicas que “têm mais de Beach Boys que de Tame Impala”, banda com a qual a maioria das pessoas os compara.
Nas letras “’O Pesar o Sol’ é um disco claramente mais introspetivo-contemplativo, ou seja, as tais coisas do Álvaro de Campos ou do Baudelaire estão aí e é muito mais literário do que este último”. Já no que diz respeito ao mais recente trabalho “é a assumção literária de uma só ideia, a ideia do ‘estou a crescer, vou ter de largar a minha casa e os meus pais’”.
Henrique já teve oportunidade de os entrevistar várias vezes. Conhece os Capitão Fausto, conhece cada um dos músicos. Não acompanhou os primórdios da banda, a sua fase de liceu, quando assumiam outros nomes, como “os IC19”, mas acompanhou sim uma fase posterior e sente que “cresceu com eles”.
Concertos marcantes são vários, pela importância que tiveram para si ou para a banda. Entre eles contam-se os dos lançamentos dos discos, o da edição do Super Bock Super Rock de 2012, quando subiram ao palco principal do festival e tocaram na íntegra o álbum de Syd Barrett “prestando tributo a quem tanto lhes deu”, no Lux, ou neste verão no festival Paredes de Coura, “onde estavam onde queriam estar”.
Mas o mais importante mesmo foi o concerto organizado por si, em Setúbal. Na altura quando teve a oportunidade de o organizar pensou: “nem que tenha de tirar dinheiro do meu próprio bolso, vai acontecer”. Levar a banda de que gosta a um sítio onde daria a possibilidade às pessoas que conhece de a ouvir foi uma sensação de realização que o deixou bastante feliz.
Mas que tipo de fã é Henrique? “Sou um péssimo fã no sentido clássico”, brinca, “eu não decoro letras”. Não passa o concerto a cantar, mas gosta “muito de tentar compreender a banda”. “Sou um fã diferente porque sou amigo deles”, remata. E isso muda alguma coisa? Pouca. Muda apenas a forma como vê a banda, como a segue “sem fazer loucuras”. O que o leva a já ter visto 27 vezes é o “facto de gostar da música”. “O facto de ir a um sítio, ouvir umas canções de que gosto e voltar para casa satisfeito” faz toda a diferença para Henrique. “Mas nunca iria a Viseu de propósito”, brinca novamente. “A Lameira” está na lista das músicas da banda que mais gosta de ouvir nos concertos.
Na sua opinião, os Capitão Fausto vão marcar uma geração, a sua, mas dúvida que tenha o mesmo efeito com outras. “Eles sabem que pertencem a uma geração e estão a fazer músicas para essa geração”, explica, e por isso não os pensa “como uma banda de culto”.
A linha que separa o amigo do fã. São dois lados e são “indissociáveis”. “Aquilo que tenho de fã é ir aos concertos”, mas “há um lado, por ser amigo, que me diz vou ao concerto porque gosto de ti”. Há ainda o lado de jornalista, que é importante para Henrique referir: “estou por cima disto tudo, a olhar para esta situação, a olhar para pessoas como eu e a olhar para uma indústria que continua dividida em relação aos Capitão Fausto”. “Alguns jornalistas de música não gostam dos Capitão Fausto”, afirma.
Chegamos ao final da conversa e confessa que os Capitão Fausto não são a sua banda preferida em Portugal. Mas o que é que isso importa, não precisam de o ser e Henrique vai continuar a ir aos concertos, sem saber todas as letras e a admirar a banda. “Os Capitão Fausto são um marco musical, lírica e musicalmente”, remata.
Então, bom concerto, Henrique.
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