Quatro anos depois de ter posto em palco, também no D. Maria II, em Lisboa, “Ensaio para uma cartografia” — peça premiada e que regressou ao teatro um ano depois — a encenadora e atriz volta a este teatro com as mesmas mulheres para, ao som da 7.ª Sinfonia de Beethoven, abordar a memória e os materiais e todo esse trabalho de ensaio que permanece.
Com música tocada ao vivo, em “Carta”, as atrizes, que voltam a estar nuas em palco, vão, pela primeira vez, trabalhar a voz como instrumento, acrescentou a encenadora à agência Lusa.
Partindo sempre de uma tentativa de abordagem da 7.ª Sinfonia de Beethoven, “Carta” é “mais do que nunca, um exercício de resistência e de esperança de outro dia”, disse Mónica Calle.
“Deste campo de resistência, de superação, de fraternidade, de humanidade no fundo”, frisou.
Num momento em que o mundo se confronta com uma pandemia que já dizimou perto de dois milhões de pessoas, Mónica Calle frisou que este espetáculo “só acontece” por estarem juntas.
“Por nos tocarmos, por nos suportarmos umas às outras, por tentarmos e concretizarmos as coisas em conjunto; não separadas, mas ligadas”, enfatizou.
Num trabalho que remete para o estar junto e para o toque físico, a encenadora destacou a importância dessa “resposta e dessa resistência”.
“Um lugar de utopia e de afirmação de que só existimos enquanto indivíduos na ligação com os outros”, afirmou.
“Carta” é uma “nova etapa e uma consequência” do trabalho iniciado em 2014 e que em 2017 se materializou em “Ensaio para uma cartografia”.
Neste espetáculo, 20 mulheres dançavam nuas em palco ao som de “Bolero”, de Ravel, como se construíssem um caminho ou uma casa comum.
Um trabalho que, como disse na altura a encenadora à Lusa, tinha a ver com “a duração no tempo”.
Neste caminho percorrido em conjunto ao longo de sete anos, as atrizes foram construindo um lugar de pertença.
“Como quem supera os limites da imperfeição na busca do absoluto e do transcendente”, disse Mónica Calle na altura.
“Carta” é a última etapa de um trabalho iniciado por Mónica Calle a partir de “Os sete pecados mortais” de Bertolt Brecht.
Um espetáculo que, para a encenadora, é também “a construção de uma família, a procura de uma ‘religação’, através do erro, da falha, da insegurança, da inevitabilidade da imperfeição, da fragilidade e da transformação do corpo, mas também da força, da exigência e do rigor”.
Um espetáculo com o qual Mónica Calle sempre pretendeu “celebrar a vida”.
“Como é que se continua? Como resistimos e como nos superamos, individual e coletivamente? E como, nesse processo, é possível resgatar a alegria, o prazer?” são questões levantadas por Mónica Calle neste processo de trabalho ao qual às atrizes se juntam agora doze músicos profissionais.
Dirigido por Mónica Calle, “Carta” tem interpretações de Ana Água, Ângela Flores Baltazar, Beatriz Almeida, Berta Vidal, Brígida Sousa, Bruna de Moura, Carolina Varela, Cire Ndiaye, Cleo Tavares, Eufrosina Makengo, Inês Pereira, Inês Vaz, Joana Campelo, Joana Santos, Joana de Verona, Kristina Van de Sand, Lucília Raimundo, Madalena Rato, Mafalda Jara, Mafalda Tuna, Maria da Rocha, Maria Inês Roque, Mariana Correia, Mariana Sardinha, Marta Félix, Miu Lapin, Mónica Calle, Mónica Garnel, Roxana Ionesco, Sara Miguel, Sílvia Barbeiro, Sofia Dinger, Sofia Duarte Carvalho, Sofia Miguel Castro, Sofia Santos Silva e Sofia Vitória.
A direção musical é de Martim Sousa Tavares, o desenho de luz de José Álvaro Correia e a assistir na encenação está José Miguel Vitorino.
“Carta” é produzida pela Casa Conveniente / Zona Não Vigiada em conjunto com o Teatro Nacional D. Maria II.
Com estreia prevista para quinta-feira — a peça terá antestreia terça e repetirá na quarta, às 19:00, face à possibilidade de um novo confinamento -, a peça estará em cena de quinta-feira a 24 de janeiro, com espetáculos de quarta-feira a sábado, às 19:00, e, aos domingos, às 16:00.
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