A notícia foi avançada pelo jornal Público na quarta-feira, no final de uma reunião entre a ministra da Cultura, Graça Fonseca, e diretores dos museus, palácios e outros monumentos da Direção-Geral do Património Cultural (DGPC), sobre a proposta de decreto-lei para a autonomia destes equipamentos.

Contactado hoje pela agência Lusa, António Filipe Pimentel, que lidera o Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA) há nove anos, indicou que a decisão foi tomada já há algum tempo, e "tem a ver com o esgotamento de um projeto que tinha em vista mostrar as potencialidades da instituição".

Criado em 1884, o MNAA é um dos museus com maior número de obras classificadas como tesouros nacionais, e é um dos mais importantes museus públicos devido ao seu espólio dentro do património histórico do país.

"Não faz sentido, nem tenho condições para continuar, e sobretudo politicamente não existe uma filosofia que apoie o museu", disse o responsável, apontando, nomeadamente, a falta de recursos humanos, numa "pressão constante", que tem obrigado ao encerramento temporário de várias salas ao longo dos anos.

O trabalho do António Filipe Pimentel, de 59 anos, neste período enquanto diretor, incluiu o lançamento inédito de campanhas públicas para a angariação de fundos para adquirir novas obras para o museu, a renovação de várias galerias, nomeadamente de têxteis, pintura e escultura portuguesas, e a realização de parcerias com privados para a realização de exposições internacionais.

A juntar-se a esta situação, sobre a qual, disse, "existe um entendimento diferente entre os museus e a tutela", vai juntar-se a aposentação do diretor-adjunto do museu, José Alberto Seabra Carvalho, historiador de arte de 66 anos.

"Será uma perda irreparável", comentou o ainda o diretor do MNAA, vincando, que, face a este panorama "de progressiva degradação das condições de trabalho", não está disposto a renovar ou a voltar a concorrer ao cargo.

Ao mesmo tempo, deixará o cargo de subdiretor na DGPC, que ocupa por inerência, com a mesma comissão de serviço.

Questionado pela Lusa se poderia reconsiderar a posição, caso a tutela lhe desse as condições que tem pedido para continuar a dirigir o museu, respondeu: "Continuaria com imenso gosto. Isto não se trata de uma birra, mas de uma divergência de opiniões sobre o que deve ser o trabalho no museu. Eu continuaria com outras condições, mas se até agora não me foram dadas, não veja que haja perspetiva disso".

Questionado ainda sobre se a saída está também relacionada com o novo diploma para a autonomia de museus, palácios e outros monumentos, disse que as suas reservas sobre o projeto "são conhecidas".

O novo regime jurídico de autonomia de gestão dos museus, monumentos, palácios e sítios arqueológicos, deverá abranger as 30 designadas unidades orgânicas tuteladas pela DGPC e pelas Direções Regionais de Cultura (DRC).

O documento tem sido criticado por vários diretores de museus e organismos representantes do setor, sobretudo quanto à falta de uma autonomia fiscal e jurídica.

A proposta de diploma foi apresentada em junho aos diretores de museus e entidades representativas e, entre os objetivos, constam a delegação de competências nos diretores dos museus, a redução da burocracia e o maior acesso aos recursos próprios gerados.

De acordo com a proposta de diploma, a que a agência Lusa teve acesso, na altura, preconizam-se várias alterações, nomeadamente a abertura de concursos para diretores de âmbito internacional, e não apenas nacional, para comissões de serviço de cinco anos, com a limitação máxima de dez anos, alterando o regime atual de três anos, sem limite de renovação, feita através da Comissão de Recrutamento e Seleção para a Administração Pública.

O ponto essencial do novo regime é a delegação de competências nos diretores das designadas "unidades orgânicas", que será muito mais alargada, através da celebração de um contrato-programa a cinco anos que os poderá autorizar a assinar despesas de aquisição de bens e serviços, pequenas empreitadas e contratações temporárias, mas o limite do valor terá de ser negociado para ser autorizado.

A proposta de diploma de 17 páginas, com 30 artigos, tem como objetivos "que o património cultural beneficie de uma maior autonomia de gestão para concretização de projetos que importem mais-valias para a cultura, o património, a economia e o turismo, fomentando-se o estabelecimento de parcerias entre museus, monumentos, palácios e sítios arqueológicos com outras entidades, públicas e privadas, e com a sociedade civil, valorizando o seu papel enquanto instituições com ligações estreitas ao território e às comunidades onde se inserem".

É intenção do Ministério da Cultura que esta proposta de diploma – uma das suas prioridades de governação - venha a representar "uma verdadeira mudança de paradigma", gerando "um novo dinamismo na gestão dos equipamentos culturais", a partir deste ano.