"O 'politicamente correto' surgiu para fechar a boca das pessoas", disse, em entrevista à agência Lusa, o escritor e jornalista residente em São Paulo, cuja obra literária é reconhecida há várias décadas a nível mundial.
O autor de "Zero" (1975) e "Não Verás País Nenhum" (1981), entre cerca de meia centena de livros de diferentes géneros publicados desde a juventude, participa até domingo na III Festa Literária da Morada do Sol (FliSol), cujo patrono é o próprio, nascido há 88 anos naquela cidade do interior do estado de São Paulo.
Ignácio Loyola Brandão questionou "o papel da literatura neste caos" do mundo, na era das novas tecnologias e das redes sociais.
"Também não sei. É pouca a gente que lê livros e a censura está voltando novamente", criticou.
No seu entender, "a gente agora está altamente ameaçada", mas "a sociedade se revolta" quando alguém "abre os olhos".
Para o membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), a corrupção nas diversas instâncias do poder e a criminalidade violenta são os principais problemas que afetam atualmente o seu país.
"Temos o pior parlamento [Congresso Nacional, bicameral] de todos os tempos da história do Brasil", lamentou.
Nascido em Araraquara, no interior do Estado de São Paulo, em 1936, Ignácio de Loyola Brandão estreou-se nas Letras em 1965, com o livro de contos "Depois do Sol", mas foi com o romance "Zero" e o seu "realismo feroz", como a crítica o descreveu, que se destacou. A obra foi proibida no Brasil, mas publicada em países como Alemanha, Espanha, Estados Unidos.
Cronista no jornal Estado de S. Paulo, editor da revista Planeta na década de 1970, durante a ditadura, a sua obra literária soma cerca de quatro dezenas de títulos, nos mais diferentes géneros, entre romance, conto, crónica, teatro, biografia, livros de viagens e literatura infanto-juvenil.
Membro da Academia Brasileira de Letras recebeu, entre outros prémios, o da União Brasileira de Escritores e o da Associação Paulista de Críticos de Arte, o Prémio Fundação Biblioteca Nacional e o Prémio Machado de Assis da Academia Brasileira de Letras, pelo conjunto da sua obra, além do Prémio Jabuti.
Em 2019, quando Jair Bolsonaro iniciava a sua presidência do Brasil, numa deriva autoritária, Loyola Brandão, em entrevista à agência Lusa, defendeu que os escritores e outros profissionais da área da Cultura deviam posicionar-se politicamente.
"[O papel do escritor] é escrever, tentando lucidez. Tentando mostrar para o seu leitor - cada um mostrar para o seu leitor - o que estamos vivendo. Não só escrever, mas falar também. [Os escritores] precisam de ir para todas as feiras literárias, para todas as aulas, como fizemos durante a ditadura", ponderou.
"Na ditadura não falávamos de literatura, falávamos de política. Eu, por exemplo, levava todos os textos proibidos e lia, porque eu tinha [os textos] na mão. O escritor tem também de resistir, também falar. Também [devem fazer isto] o ator, o diretor [o encenador], o cineasta, o entrevistador, o jornalista, todo mundo. Temos de tomar cuidado, porque estamos ameaçados", concluiu na altura.
Este ano, na FliSol, por proposta do patrono, a festa literária homenageou a escritora, académica e feminista negra brasileira Djamila Ribeiro, radicada em Nova Iorque por razões profissionais.
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