Em entrevista à agência Lusa, durante a 44.ª Festa do “Avante!”, no Seixal, RAP definiu a diferença entre esquerda e direita e criticou quem acha que o seu quadrante político tem “superioridade moral” sobre o outro.

“Não, não penso (entrar na vida política)... O meu trabalho é fazer pouco do primeiro-ministro (PM). Eu não aceitaria ser despromovido a PM. Acho uma vida muito menos interessante do que a minha, ainda por cima, suspeito de que se ganha pior”, disse o antigo militante do PCP, que há 20 anos trabalhava no recinto do certame político-cultural da Quinta da Atalaia.

O fundador do grupo Gato Fedorento e protagonista de numerosas rábulas como a do popular “gajo de Alfama” confessou não ter “a mínima vocação nem interesse em entrar na vida política”, embora desfrutando, “enquanto cidadão, de todos os direitos, incluindo os de apoiar ou não determinados partidos”, coisa que já fez “várias vezes”.

Ao contrário de outros dissidentes comunistas, RAP é muito acarinhado no “Comunistão”, talvez por ser das únicas vozes no espaço público que defende, aqui e ali, “o Partido”.

“Nunca escondi a minha orientação ideológica. Não tenho razão para isso. Sempre me defini como uma pessoa de esquerda, entendendo a diferença entre esquerda e direita da seguinte maneira: é um modo de olhar para as coisas e é uma proposta de organização social”, afirmou.

Para RAP, “outra coisa diferente é considerar que há uma superioridade moral das pessoas de esquerda relativamente às de direita e vice-versa”.

“Sempre que oiço alguém, de qualquer dos quadrantes, a considerar que o seu é moralmente superior ao outro, para mim, fica definido. As pessoas de esquerda acham que as pessoas são mais iguais do que desiguais e, por isso, a sociedade deve fazer um esforço bastante grande para tentar reproduzir essa igualdade”, definiu.

Por seu turno, “as pessoas de direita têm um entendimento diferente, acham que as pessoas são bastante desiguais e que, para ser justo, dentro de certos limites, é natural que a sociedade reproduza algumas dessas diferenças”.

Questionado sobre a atualidade política, nomeadamente a hipótese de repetição dos acordos entre o Governo do PS e os partidos à sua esquerda, o humorista preferiu não assumir uma posição concreta.

“Espero que eles (políticos) produzam bastantes momentos embaraçosos porque eu preciso de trabalhar, as minhas filhas precisam de comer, portanto, sinceramente, do ponto de vista profissional, não sei se a reedição de uma ‘geringonça’ é possível. A única coisa que eu espero é que eles digam várias vezes uma coisa hoje e outra amanhã, coisas flagrantemente contraditórias, para que eu tenha material para fazer pouco deles”, desejou.

Neste seu regresso, sábado, à Festa do “Avante!”, RAP provocou o primeiro evento realmente de massas numa edição marcada pelas restrições de público em virtude da pandemia de covid-19.

O debate sobre humor e política, no espaço Festa do Livro, começou mais tarde devido a problemas técnicos, mas, sobretudo, por causa da enchente de perto de 500 pessoas que o quiseram ouvir.

A organização do PCP teve mesmo improvisar, colocando bancos no meio da estrada de circulação interna, e houve momentos em que as distâncias sanitárias foram completamente ignoradas, tal o entusiasmo para assistir à discussão com a dirigente comunista Margarida Botelho.