Ao longo de 48 capítulos e mais de 900 páginas, esta edição conjunta da Tinta da China e da Fundação Francisco Manuel dos Santos promete uma "rigorosa radiografia" do passado e presente da democracia portuguesa e deixa "pistas para o futuro", em diferentes análises das áreas da sociedade acompanhadas pelas conclusões dos 68 investigadores internacionais e estrangeiros.
O livro foca aspetos positivos e negativos da democracia, concluindo que "parece existir uma tensão entre as enormes aspirações da sociedade portuguesa em relação ao regime democrático e as realizações desse mesmo regime".
"Essa tensão manifesta-se no enorme ceticismo que os portugueses sentem em relação à classe política ou no facto de sermos um dos poucos países europeus onde a aceitação de formas não-democráticas ou mesmo autocráticas de governo por parte da população aumentou desde o início do século XXI", refere o livro, numa passagem que servirá de mote na conferência "5 décadas de democracia: o que mudou?", que irá decorrer simultaneamente com o lançamento do livro.
Outra das críticas apontadas pelos investigadores é a de que "Portugal tem uma das estruturas administrativas mais centralizadas da Europa, uma das que mais resistiu às tendências de descentralização política e fiscal que foram seguidas por outros países".
Somos um país que praticamente não tocou na sua organização territorial; onde a desproporção entre as competências locais e centrais é quase única; e onde a assimetria entre as competências legalmente atribuídas ao poder local e os recursos disponíveis para as levar a cabo é enorme. Esta confluência entre os níveis de desertificação do interior do país e o grau de centralização política é uma peculiaridade portuguesa", lê-se no texto.
Apesar de considerar que o país se tornou "uma democracia idêntica à grande maioria das democracias avançadas contemporâneas, da Europa e da América do Norte", o livro aponta "desafios estruturais muito semelhantes aos de muitas outras democracias mais antigas, tais como o envelhecimento da população, a desindustrialização e a integração num mundo economicamente globalizado" .
Um estado-providência que se consolidou mas que "vive hoje, tal como muitos outros, sob pressão de contenção de custos na área da saúde, da segurança social e da assistência à terceira idade", é outro dos problemas identificados.
No campo político-institucional, os investigadores concluem que o sistema semipresidencial não distingue o país, uma vez que "o semipresidencialismo é, hoje, o sistema de governo mais comum entre as democracias europeias".
"O parlamento português teve de se adaptar à crescente centralidade do executivo e da figura do primeiro-ministro, à crescente dependência dos tribunais para a resolução de disputas políticas, assim como aos processos de europeização das políticas públicas – isto é, a Assembleia da República, tal como outros parlamentos de estados-membros da UE, acaba por ter muito menos poder do que tinha antes da adesão", referem.
Quanto aos níveis de participação eleitoral, o livro considera serem "semelhantes aos de outras democracias europeias". "Verifica-se um declínio da participação eleitoral — apesar do que sucedeu na eleição legislativa mais recente —, que é acompanhado por um aumento de quase todas as outras formas de mobilização não-convencional (como a assinatura de petições, o boicote de certos produtos/marcas, ou a presença em manifestações)".
Quanto à educação e saúde, os investigadores detetaram um "resultado ambivalente" no período democrático, "com os padrões da saúde a melhorarem mais dos que o do ensino e a desigualdade a permanecer a um nível relativamente alto".
"A dinâmica demográfica também se alterou muito durante este período", tendo Portugal passado "de um padrão de emigração em massa para outro de imigração, e de elevada taxa de natalidade para uma taxa muito reduzida, o que o transformou num dos países com o envelhecimento mais rápido do mundo", lê-se no texto.
Com a chancela da Tinta da China e da Fundação Francisco Manuel dos Santos, "O Essencial da Política Portuguesa", tem coordenação dos políticos e investigadores António Costa Pinto, Pedro Magalhães e Jorge Fernandes.
Entre os investigadores contam-se nomes como o da atual ministra da Defesa portuguesa, Helena Carreiras, sobre as Forças Armadas, do académico Carlos Farinha Rodrigues, sobre desigualdade social e económica, dos politólogos Carlos Jalali, Pedro Magalhães e António Costa Pinto, mas também dos investigadores estrangeiros Robert Fishman, sobre os países do sul, ou ainda Ricardo Marchi, sobre a a direita e a extrema-direita em Portugal.
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