Inserido no programa “Pianomania”, o recital começa às 10:00 e só terminará cerca da meia-noite, sem qualquer interrupção, o que representará uma prova de esforço físico e artístico para a pianista.

“Há uma preparação fora do piano que é muito intensa, porque não é possível treinar tantas horas de seguida. Estou a preparar o corpo para este momento de imobilidade, desacelerando o metabolismo para poder aguentar”, explicou à agência Lusa.

Esta é a segunda vez que Joana Gama, 34 anos, interpretará “Vexations”, depois de a ter tocado em 2016, durante 15 horas, no festival Jardins Efémeros, em Viseu.

A peça “Vexations” foi escrita por Erik Satie possivelmente em 1893, depois de um desgosto amoroso, e só foi descoberta postumamente. Junto das quatro linhas de composição, Satie deixou a indicação de que teria de ser tocada 840 vezes de seguida e de forma lenta.

Joana Gama diz que esta é uma obra muito particular do repertório de Satie, escrita num tempo em que estava fascinado pelo gótico e por uma certa solenidade. Remete para a introspeção e para a ideia de permanência e repetição.

Apesar de só ter uma página de pauta, que se repete horas e horas, a pianista diz que “não é uma peça fácil de assimilar, nem para quem toca”.

“Não a consigo tocar de cor e isso faz com que esteja sempre atenta à partitura durante as 14 horas. Não dá para divagar, embora isto esteja próximo da meditação”, disse.

Da experiência de ter tocado “Vexations” em 2016 em Viseu, Joana Gama recorda-se que durante as 14 horas alguém lhe fez uma massagem nas costas, comeu dois quadrados de chocolate e borrifou a boca com água para não desidratar.

Ficou com dores nas mãos e nas costas, mas isso não a impediu de repetir agora a experiência, que descreve como uma prova de alta competição. Desta vez fará uma massagem antes de se sentar ao piano, levará frutos secos e chocolate negro, caso precise de repor energias.

Tal como em Viseu, a presença de público em Lisboa deverá variar ao longo do dia.

Joana Gama permanece no universo de Erik Satie, no qual entrou há alguns anos. Em 2016, a propósito dos 150 anos do nascimento de Satie, deu uma série de concertos em Portugal, coordenou uma edição especial da partitura “Embryons desséchés”, fez palestras em escolas, lançou os álbuns “Harmonies”, com Luís Fernandes e Ricardo Jacinto, e “Satie.150″ e fez um recital para crianças.

“O que eu acho interessante em Satie é que ele, através da música, dos escritos, permite pensar em vários domínios. É infindável”, disse.