Estreado mundialmente no Festival de Locardo no ano passado, e com passagem pelo Indie deste ano, o filme é a terceira longa-metragem do realizador luso-suíço Basil da Cunha, que volta a filmar no bairro onde reside, assim como a maioria dos atores — a Reboleira, no concelho da Amadora.
A personagem do filme, Rosa, uma jovem cabo-verdiana que adora cantar e deixa os filhos no arquipélago africano enquanto tenta a sua sorte em Portugal, encontra no seu percurso “uma sociedade patriarcal, dominada por homens brancos”.
Em declarações à Lusa, Basil da Cunha contou que o filme revela os “mecanismos de solidariedade” entre as mulheres cabo-verdianas que ali vivem, elas que são “a base do bairro”.
“É um musical diferente dos outros, feito com atores não profissionais, na Reboleira, acerca das mulheres cabo-verdianas, da força das mulheres cabo-verdianas e com uma homenagem tremenda à música de Cabo Verde”, disse.
E prosseguiu: “Aquilo que mostramos é outra forma de ser mulher, é outra força feminista que está presente e é importante. O cinema serve também para isso, para criar mitos e exemplos nos quais as pessoas se possam reconhecer e é importante dar voz às mulheres negras em Portugal e mostrar a forma, a resiliência que elas têm e a força”.
Nascido na Suíça, Basil da Cunha assinou “Até ver a luz” (2013), que participou na Quinzena dos Realizadores de Cannes, e “O Fim do Mundo” (2019), que estreou em Locarno.
“Manga d’Terra” mostra a realidade do bairro, onde “a principal ameaça ao equilíbrio vem de fora, da polícia, das intervenções policiais, o racismo…”.
Além do drama, o filme tem muita comédia e música. Rosa, a personagem principal, depara-se com um conjunto de obstáculos para ultrapassar e conta com a solidariedade das mulheres, que “têm uma força tremenda”.
“As mulheres no bairro são a base do bairro, é um bairro matriarcal, onde as mulheres têm uma força tremenda. Às 06:00 as mulheres levantam-se, vão trabalhar. Às vezes têm dois, três trabalhos. Em casa, elas é que organizam e estruturam a vida da família e a voz dessas mulheres tem um peso enorme. Elas é que seguram a barra e todos estão muito conscientes disso”, observou.
O realizador sabe do que fala: “Os nossos filmes são feitos de dentro. Eu moro na Reboleira, a maior parte das pessoas do elenco são meus amigos, que conheço há muitos anos. É um filme que vem de dentro e mostra uma perspetiva diferente”.
Basil da Cunha espera agora ver nas salas de cinema portuguesas que vão passar “Manga d’Terra” os cinéfilos, mas também “a diáspora e as várias comunidades africanas em Portugal”.
“Não é fácil fazer um filme assim, com pouco financiamento. Não foi fácil levá-lo às salas e agora o desafio é mantê-lo. A concorrência é forte e há cada vez menos espaço para o cinema português. O nosso cinema é português, mas diferente do que se faz, é falado em crioulo, num bairro, os protagonistas são pessoas pouco representadas a nível nacional e é essencial as pessoas apoiarem este filme, não só pela qualidade que o filme possa ter, mas também pela representatividade”, disse.
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