"Para um Presidente que prometeu trabalhar pela unidade, não tem feito outra coisa senão dividir a nação", diz Lurdes da Silva, jornalista portuguesa diretora de "O Jornal", uma órgão de comunicação social publicado em Massachusetts. A jornalista diz que "o comportamento impulsivo [de Trump] já mostrou que pode acarretar sérias consequências dentro e fora das fronteiras e, como tal, ele deveria analisar mais ponderadamente os potenciais efeitos da sua retórica e dos atos que comete."
A jornalista referia-se, por exemplo, à restrição de cidadãos de sete países de viajar para os EUA e o bloqueio temporário da vinda de refugiados, que causou medidas retaliatórias de alguns dos países. "Em vez de continuar a usar uma estratégia de ataque, Trump precisa de exercer um pouco mais de diplomacia e de tentar trabalhar com os outros ramos do poder de modo a atingir consensos em prol da nação", explica Lurdes da Silva.
"Mais do que nunca, precisamos de pontes para unir e não de muros para separar", acrescenta.
Para o conselheiro das comunidades portuguesas, Gabriel Marques, "não há dúvida de que o primeiro mês de mandato do Presidente Trump foi muito difícil" e que o maior problema "é que a administração tem muitos altos cargos ainda vazios, aguardando a sua confirmação ou simplesmente sem nomeados."
"A situação cria um sentimento de incerteza no governo e, mais importante, cria uma falta de liderança em dezenas de departamentos que prestam serviços críticos aos cidadãos. Vimos um claro exemplo desta falta de liderança com a implementação da ordem executiva de imigração. Milhares de funcionários do governo foram deixados livres para interpretar a ordem por conta própria, deixando milhares em limbo até uma retração embaraçosa", explica.
Ainda assim, o conselheiro diz que algumas medidas políticas estão a funcionar, e aponta para o comportamento positivo da bolsa de valores, por exemplo. "A economia tem estado muito forte devido à intenção de Trump de reduzir regulamentos para negócios, reformar o código do IRS e também vimos um aumento nos investimentos por parte das empresas que, de outra forma, consideravam deixar o EUA", explica.
O conselheiro diz que "a maioria das pessoas espera que a incerteza se acalme depois dos cargos mais importantes estarem preenchidos", mas muitos duvidam "que isso realmente aconteça."
Incerteza, instabilidade e um "grito" dos americanos
A Câmara do Comércio Americana em Portugal dá também conta de um sentimento de incerteza e de instabilidade das empresas portuguesas face à nova realidade política dos Estados Unidos, com a eleição de Donald Trump. “Em termos práticos ainda passou pouco tempo mas há uma diferença em relação à forma de olhar e um sentimento de incerteza e de instabilidade. É necessário esperar para perceber como é que as coisas vão funcionar daqui para a frente”, disse à agência Lusa a secretária-geral da Câmara do Comércio.
Graça Didier contou que a instituição aguarda com expetativa os efeitos da nova administração norte-americana, depois do aumento das exportações portuguesas para os EUA nos últimos anos. “Tudo leva a crer que efetivamente vai verificar-se um fechar da economia americana ao comércio internacional”, referiu, adiantando que “nas últimas semanas têm sido visíveis movimentos adversários aos acordos do livre comércio”. A “posição ainda não é clara”, esclareceu.
Para a secretária-geral da Câmara de Comércio Americana, os Estados Unidos podem vir a “fechar-se” aos produtos estrangeiros, havendo, no entanto, dúvidas sobre o protecionismo. “Em relação aos produtos chineses parece claro, mas ainda há incertezas em relação aos produtos europeus”, disse referindo que a União Europeia deve fazer chegar à nova administração norte-americana a vontade de continuar a trabalhar e manter a relação entre os dois blocos nas vertentes económica e comercial.
A responsável pela instituição com sede em Lisboa recorda que os Estados Unidos já têm tradicionalmente políticas restritivas mas “pode ser que a situação venha a ser ainda mais notada” porque muitos contratos a nível estadual e federal [nos Estados Unidos] são fechados e dirigidos a empresas norte-americanas.
Segundo Graça Didier, nos últimos tempos verificou-se um aumento “significativo” das exportações portuguesas para os Estados Unidos que passaram a ser o país, fora da União Europeia, para onde as empresas portuguesas mais exportam.
Os Estados Unidos estão em quinto lugar na lista global dos países recetores das exportações portuguesas, ganhando lugares relativamente aos últimos anos sendo que o crescimento das exportações quase duplicou, em muitas áreas, nos últimos anos.
“Havia uma dinâmica percetível de Portugal para os Estados Unidos que está relacionada com o empenho dos empresários portugueses em termos de exportações e também pela valorização do dólar face ao euro que tornou os produtos europeus, e também os portugueses, mais apetecíveis e concorrentes”, nota Graça Didier.
A instabilidade de outros mercados a nível internacional fez também como que os empresários portugueses tivessem encarado o mercado norte-americano, mais seguro em relação a outros destinos.
Passadas quatro semanas sobre a tomada de posse de Donald Trump, “não há ainda nada em contrário”, diz a responsável adiantando que existe “expetativa” em virtude das declarações da nova Administração. “É preciso ver como é que o relacionamento se pode desenvolver no futuro”, conclui.
Para o presidente da Associação Amizade Portugal-EUA,António Neto da Silva, a eleição de Donald Trump para presidente dos Estados Unidos da América veio despertar o interesse internacional do país e foi um "grito" dos americanos, .
“Esta Administração acaba por provocar um abanão naquilo que era uma paz natural que estava estabelecida. A nossa leitura é que, com mensagens completamente distintas - quer no caso de Obama, que era um homem fora do circuito normal, quer no caso da eleição de Trump, que é também um homem fora do circuito normal – os americanos deram um grito dos americanos contra coisas de que não gostavam”, disse António Neto da Silva.
“Trump é um empresário, não é um político. Ele está a aplicar princípios de empresas a uma nação. Vamos ver as consequências porque as nações não são empresas. Mas, não há dúvida nenhuma que em termos de declarações feitas - porque na prática, salvou duas ou três fábricas que iam fazer investimentos no México e que agora vão para os Estados Unidos - ainda não é visível nenhuma consequência”, adianta.
Sobre as medidas restritivas impostas à emigração defendidas pelo chefe de Estado norte-americano, o responsável pela associação diz que faz uma avaliação pragmática. “Há uma coisa que parece certa: o receio de todos os povos do Ocidente sobre o que é uma emigração descontrolada porque esta emigração contém, infelizmente, elementos extremistas e do Estado Islâmico e acaba por funcionar como um ‘Cavalo de Troia’”, diz acrescentando que, no entanto, as proibições “demasiado imediatas” tiveram consequências.
“O que é certo, é que Donald Trump sempre disse que a democracia e as instituições americanas são extraordinariamente fortes. Tem pesos e contrapesos que não permitem ao presidente fazer aquilo que quer e, portanto, ele já viu nesta sua primeira ordem, de restringir a entrada de pessoas de alguns países, que as instituições não o vão deixar fazer aquilo que quer”, sublinha.
A Associação de Amizade Portugal-Estados Unidos, com sede no Porto, tem mais de duzentos associados e organiza seminários, colóquios e visitas no quadro da defesa “dos valores do Ocidente” e do aprofundamento do conhecimento “das bases da democracia norte-americana”.
Só 40% dos americanos aprova o trabalho de Trump
Segundo uma sondagem da Gallup, as taxas de aprovação de Trump estão 21 por cento abaixo da média para presidentes há um mês no poder. Cerca de 40 por cento dos americanos aprova o trabalho do seu novo presidente, contra 64 por cento que aprovava o desempenho de Barack Obama na mesma altura em 2009.
Segundo a mesma sondagem, Donald Trump gera opiniões muito polarizadas: 75 por cento dos inquiridos aprovam muito fortemente, ou desaprovam muito fortemente, o desempenho do presidente.
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