“Não é que nos faltem problemas em todas as áreas e que havemos de enfrentar com determinação cívica, através de respostas adequadas e que poderão, legitimamente, variar com a alternância e as alternativas democráticas”, referiu, discursando, em Braga, na cerimónia militar comemorativa do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.

Para os tempos atuais, destacou a importância de Portugal dar resposta ao “exigente” desafio do mar.

“Um desafio que vem de sempre e que, nos dias de hoje, se torna mais exigente. É o desafio do mar, do mar, inseparável da sensibilidade dos portugueses, o desafio do mar com a zona económica exclusiva e os seus recursos a aproveitar”, disse.

Jorge Miranda sublinhou que a história de Portugal tem “muitos motivos de júbilo, a par de alguns de desgosto e de tristeza”.

Revisitando a história, enumerou, entre os motivos de júbilo, a revolta popular em Lisboa, os descobrimentos, a Constituição de 1822, a independência do Brasil sem derramamento de sangue e a primeira travessia aérea do Atlântico Sul, de Lisboa ao Rio de Janeiro.

A abolição da pena de morte em 1867 e a consagração da fiscalização jurisdicional da constitucionalidade das leis pela Constituição de 1911 foram outros aspetos apontados.

Como “causas de desgosto e tristeza”, apontou a expulsão dos judeus, a Inquisição, a escravatura, o tratamento dado a muitas populações e o estatuto do indigenato.

Aludiu ainda às “crueldades” do Marquês de Pombal, o surto laicista radical dos primeiros anos da República, o longo regime autoritário de 1926 a 1974, com censura, polícia política, perseguições, prisões, deportações e a “total incompreensão que ele teve das mudanças no mundo desde 1945, levando a três guerras sem sentido, com milhares de mortos”.

Jorge Miranda referiu-se depois ao pós-25 de abril, com Portugal a entrar, com a Constituição de 1976, as suas revisões e a sua jurisprudência, “num período de estabilidade sem paralelo desde meados do século XIX”.

Falou em “avanços importantes” na igualdade entre homens e mulheres, ao Serviço Nacional de Saúde, ao ensino obrigatório até aos 18 anos, à generalização do abastecimento de água e do saneamento e ao desenvolvimento da fiscalização da constitucionalidade.

A adesão ao Conselho da Europa, à Convenção Europeia dos Direitos do Homem e aos seus protocolos adicionais, a adesão às Comunidades Europeias, antecessoras da União Europeia, a reconciliação com os povos africanos, a transferência negociada da soberania de Macau, a independência de Timor e a formação da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa foram outras “conquistas” elencadas por Jorge Miranda.

“Não negamos o nosso passado. Assumimo-lo serenamente no confronto dos outros povos. Assumimo-lo no presente e voltados para o futuro”, referiu.

Para evocar o 10 de junho, Jorge Miranda recorreu às palavras “Portugal”, “portugalidade” e “patriotismo”.

“E não falo em nacionalismo pelas conotações que o termo poderá comportar”, explicou, referindo que nos dias de hoje “grassam nacional-populismos radicais e que chegam mesmo a fazer guerras de invasão”.

Uma palavra para os atropelos à Língua Portuguesa

O presidente da comissão organizadora das comemorações do 10 de junho, Jorge Miranda, criticou ainda, em Braga, os frequentes “atropelos” de que a língua portuguesa é alvo, sublinhando que “internacionalizar não pode significar desnacionalizar”.

“Não posso deixar de reagir contra os atropelos que [a língua portuguesa] vem sofrendo entre nós”, disse Jorge Miranda, no discurso da cerimónia militar comemorativa do Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas.

Entre os atropelos, apontou os “constantes” erros de sintaxe na comunicação social, o ensino em escolas superiores portuguesas por professores portugueses a alunos portugueses em língua estrangeira, a denominação de algumas escolas superiores também em inglês e o “alastramento” de denominações comerciais de empresas portuguesas operando em Portugal em inglês.

Destacou ainda a “adulteração” do Erasmus, programa de intercâmbio cultural de jovens universitários.

“Internacionalizar não pode significar desnacionalizar”, referiu.

Para Jorge Miranda, o uso da língua portuguesa constitui um “direito fundamental dos cidadãos portugueses e brasileiros, tal como dos cidadãos de Cabo Verde, da Guiné-Bissau, de São Tomé e Príncipe, de Angola, de Moçambique, de Timor”.

“O direito de falar, de ouvir, de escrever, de ler, de receber mensagens, o direito de comunicar em português. Um direito e também um dever”, reforçou.

No seu discurso, Jorge Miranda disse não conhecer nenhum outro país que eleve a celebração a dia nacional de um seu poeta, designadamente Camões, “que ergueu a língua portuguesa ao máximo esplendor”.

“Todavia, Portugal e a língua portuguesa não se confundem. Ela pertence não só a Portugal, pertence ao Brasil e pertence aos cinco estados africanos e a Timor que a declaram sua língua oficial”, concluiu.