Makayla parecia bem quando foi para o seu quarto numa noite em janeiro, depois de assistir a um filme da série "Harry Potter". Mas quando a mãe, Shannon, entrou no quarto, na manhã seguinte, encontrou a jovem parcialmente sentada, apoiada contra a cabeceira da cama, com fluido laranja a sair do nariz e boca.

"Ela estava rígida. Abanei-a, chamei-a pelo nome e liguei para o 911 [o equivalente ao 112 em Portugal]", conta Shannon Doyle, de 41 anos, à AFP, na sua casa em Virginia Beach. "Os meus vizinhos vieram cá e fizemos manobras de ressuscitação cardiopulmonar, mas era tarde demais. Depois disso, não me lembro de muita coisa", continua.

A crise dos opioides nos Estados Unidos atingiu proporções catastróficas, com mais de 80.000 mortes por overdose no ano passado, principalmente causadas por sintéticos ilícitos, como o fentanil.

Este número é sete vezes maior do que o registado há uma década.

"Esta é a epidemia mais perigosa que já vimos", afirma Ray Donovan, diretor de operações da agência antidrogas norte-americana, a DEA. "O fentanil não é como os outros narcóticos ilícitos, é instantaneamente mortal", salienta.

As mortes estão a aumentar de maneira particularmente rápida entre os jovens, que obtém medicamentos nas redes sociais, com recurso a receitas falsificadas. O que compram é misturado ou feito de fentanil.

Em 2019, 493 adolescentes morreram de overdose. Em 2021, o número foi de 1.146.

Drogas e emojis

Os traficantes de drogas chegam aos adolescentes através do Snapchat, do TikTok, do Instagram e outras aplicações, usando emojis como códigos.

A Oxicodona, outro opiáceo, é por vezes publicitada como uma banana meio descascada; o Xanax, uma benzodiazepina usada para tratar a ansiedade, como uma barra de chocolate; o Adderall, uma anfetamina que atua como estimulante, como um comboio.

O número de norte-americanos que usam drogas permaneceu o mesmo nos últimos anos, mas o grau de letalidade mudou, de acordo com Wilson Compton, vice-diretor do Instituto Nacional de Abuso de Drogas dos EUA.

Uma chavena de heroína equivale a uma colher de sopa de fentanil, e menos de um grama pode significar a diferença entre a vida e a morte.

A maior parte do fentanil ilícito que circula nos Estados Unidos é fabricada nos laboratórios clandestinos dos cartéis de drogas mexicanos, usando produtos químicos enviados da China.

Como o fentanil é muito mais potente, é necessário muito menos para encher uma pílula de medicamento, o que significa mais lucros para os cartéis.

Um quilo de fentanil puro pode custar até 12.000 dólares (11.628 euros) e ser transformado em meio milhão de comprimidos que serão vendidos a 30 dólares cada (cerca de 29 euros), valendo milhões de dólares, explica Donovan.

Além disso, é mais fácil traficar comprimidos.

No ano passado, a DEA apreendeu quase sete toneladas de fentanil, o suficiente para matar todos os americanos. Sendo que quatro em cada 10 comprimidos apreendidos continham quantidades letais de fentanil.

"Um comprimido pode matar"

Num corredor da sede da DEA estão expostas fotografias intituladas "The Faces of Fentanyl" [As caras do fentanil, a imagem que ilustra este artigo]. São de dezenas de pessoas que perderam a vida recentemente por causa desta droga.

"Makayla. 16 para sempre", diz uma delas.

O comprimidos azuis encontrados na cama desta excelente estudante e "líder de claque" eram 100% fentanil. A polícia está a investigar, mas ainda não foi feita nenhuma detenção.

A DEA lançou uma campanha no ano passado chamada "Um comprimido pode matar", com o objetivo de aumentar a conscientização sobre os perigos do fentanil.

Também há esforços em todo o país para tornar a naloxona, uma droga que pode reverter a overdose de opioides, mais acessível.

Shannon criou uma fundação em nome de Makayla para ajudar a prevenir tragédias como a da sua filha. É a sua maneira de lidar com o luto.

* Por Maria DANILOVA

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