Vinte e cinco anos depois da morte de Escobar, o esqueleto ao abandono do edifício "Mónaco" mantém-se de pé pela última vez, após resistir à explosão de um carro-bomba em 1988. A ação terrorista, a primeira deste género no país, originou uma violenta guerra entre cartéis.
Ícone da opulência e do poder da máfia colombiana, os oito andares abandonados do bunker que protegeu a família do narcotraficante nos anos 1990 vão cair num espetáculo aberto ao público em fevereiro do ano que vem.
"O 'Mónaco' tornou-se num 'anti-símbolo', um lugar onde se faz apologia do crime, do terrorismo (...) Mais do que demolir um edifício, é demolir uma estrutura mental", disse à AFP Manuel Villa, secretário da Câmara Municipal de Medellín.
Diariamente, são vários os turistas que visitam o forte construído em El Poblado, um dos bairros mais exclusivos da cidade. Nos "narcotours", estrangeiros e locais observam, deslumbrados, o que em poucos meses será um parque dedicado às milhares de vítimas do narcoterrorismo dos anos 1980 e 1990.
Há 25 anos, a 2 de dezembro de 1993, os meios de comunicação revelavam a imagem do corpo de Pablo Escobar, espraiado num telhado e rodeado de agentes da polícia sorridentes, que exibiam o seu cadáver como um troféu. 16 meses depois depois de se ter escapulido da prisão La Catedral - criada especificamente para acomodar Escobar - o narcotraficante tinha sido apanhado a esconder-se no bairro Los Olivos, sendo morto pelas forças especiais colombianas enquanto se tentava fugir.
Desde então, o aniversário da sua morte divide a sociedade entre o repúdio e a admiração, a dor e a gratidão.
A vida de Escobar
O princípio e o fim do lorde narcotraficante - católico e esotérico - esteve marcado pelo mesmo mês: dezembro.
Nascido a 1 de dezembro de 1949 em Rionegro, próximo a Medellín, morreu a 2 de dezembro de 1993 na capital de Antioquia, e foi sepultado em 3 de dezembro na cidade que converteu no seu espaço de operações, num enterro que contou com a presença de milhares de seguidores.
Escobar apareceu durante seis anos consecutivos (1987-1993) na lista dos homens mais ricos do mundo da Forbes.
Na sua primeira aparição, a publicação calculava que o seu fluxo de caixa alcançava os três milhares de milhões de dólares à época, e seu património líquido chegava a mais de dois mil milhões. A sua fortuna, então, era equivalente ao PIB anual atual de países como Serra Leoa ou Suriname.
No momento de a sua morte, quando as autoridades ofereciam 11 milhões de dólares pela sua cabeça, o seu património líquido rondava mil milhões de dólares, entre mansões, obras de arte, um jardim zoológico e automóveis. Boa parte da sua fortuna foi entregue pelos Escobar aos seus inimigos para salvaguardar as suas vidas.
Vinte e cinco anos depois, ainda é recordado o vaticínio do astrólogo colombiano Mauricio Puerta, que a partir do mapa astral do traficante - Sagitário com ascendente em Peixes - assegurou que ele teria uma morte súbita por fatais conjunções dos astros.
Escobar interessou-se pela previsão e tentou marcar uma reunião com Puerta, que nunca se concretizou. O astrólogo interpretou as dificuldades de se encontrarem como "um recurso de proteção dos astros para que nada interferisse num destino, que já era inexorável", segundo o livro "Pablo Escobar: ascensão e queda do grande traficante de drogas", de Alonso Salazar.
Os sobreviventes
Ángela Zuluaga não chegou a conhecer o seu pai. Estava ainda na barriga da mãe quando, em outubro de 1986, sicários a mando de Escobar atacaram o carro onde estava a família. Mataram a tiro o juiz Gustavo Zuluaga e deixaram a sua esposa ferida.
A razão para o atentado? O narcotraficante sentenciou Zuluaga à morte por ter lançado uma ordem de captura contra ele e seu primo Gustavo Gaviria. Embora tenha recebido ameaças e tentativas de suborno durante três anos, Zuluaga afirmou que preferia "morrer a fraquejar".
Hoje, para os Zuluaga, demolir o edifício "Mónaco" é combater "a cultura do tráfico" e dar espaço aos que foram calados pela ficção.
"Ter um espaço para lembrar é ter um espaço para tentar ressarcir, simbolicamente, os que são vítimas deste flagelo do narcoterrorismo", diz Ángela.
Entre 1983 e 1994 houve 46.612 mortes violentas como consequência da guerra dos traficantes colombianos, segundo a câmara de Medellín. Este números compreendem tanto políticos como civis e pessoas ligadas a Escobar e outras organizações criminosas. Destes números, Juan Pablo Escobar, ou Sebastián Marroquín, como é conhecido o filho do chefe do extinto Cartel de Medellín, calcula que 3000 tenham sido 3.000 homicídios mandados por seu pai, fontes policiais citadas pela revista Semana calculam a cifra em 5.500 assassínios.
Os defensores
Luz María Escobar troca a lápide do seu irmão no cemitério Jardines Montesacro, na cidade que foi quartel-general do traficante. Ela redigiu a inscrição que acompanhará a sua campa partir deste aniversário. Por entre as lágrimas, lê em voz alta para um grupo de turistas.
"Para além da lenda que hoje simbolizas / poucos conhecem a verdadeira essência da tua vida", recita. Uma jovem de Porto Rico, comovida, pergunta se pode abraçá-la.
Para Luz María, apesar do seu irmão ter cometido muitos erros, o seu lar deve continuar de pé. "A história de Pablo, demolindo o edifício 'Mónaco', não vai ser derrubada", confessa a irmã mais nova dos Escobar Gaviria.
Contudo, a prefeitura tem enfatizado a inviabilidade do seu pedido. O custo da remodelação e adequação do imóvel supera os 11 milhões de dólares; derrubá-lo e construir o parque custa cerca de 2,5 milhões.
Pablo, o "herói"
Os moradores do bairro Pablo Escobar vivem esta data com nostalgia. O "Robin Hood colombiano" tirou-os dos bairros de lata e lixo de Medellín onde sobreviviam e deu-lhes casas, 443 no total, numa montanha da cidade.
"Para mim, primeiro Deus e depois ele. Vejo-o como se fosse um segundo deus", diz María Eugenia Castaño, uma dona de casa de 44 anos, enquanto acende uma vela no pequeno altar decorado com uma fotografia do traficante.
Yamile Zapata trabalha no salão de cabeleireiro El Patrón, um pequeno estabelecimento dedicado à beleza e ao marketing em torno da imagem de Escobar.
"Pablo confunde muito as pessoas. Se se basear no que tinha de bom, ele era muito bom. Se procurar o que tinha de mau, ele era muito mau", diz Yamile, amiga de Marroquín.
Entre três e quatro segundos, é o tempo que deverá demorar para o edifício "Mónaco" se transformar em escombros. A sua estrutura opulenta mostra a vontade de Escobar de ascender socialmente. "Irá doer (...), mas vai ser a única forma de começarmos a curar uma ferida", afirma Villa, que em poucos meses estará diante da contagem para a implosão do edifício
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