"Hoje passam 45 anos da revolução de Abril. Os cravos nos nossos peitos devem ser mais que um enfeite na lapela. A esperança que voltou a sair à rua com a solução governativa alcançada em 2015 olha para estes cravos e pergunta o que faremos nas decisões fundamentais", afirmou o deputado do BE Jorge Falcato na sessão solene comemorativa do 45.º aniversário do 25 de Abril de 1974, na Assembleia da República, em Lisboa.

A questão da Lei de Bases da Saúde não foi esquecida pelo BE nesta cerimónia e Jorge Falcato questionou se "o Serviço Nacional de Saúde pode voltar a andar de cravo ao peito, como [António] Arnaut e [João] Semedo o sonharam, ou manterá a porta aberta para o negócio dos privados em cedência à pressão presidencial".

"A Lei de Bases da Habitação chegará a ser uma realidade, plena e de cravo ao peito, ou o direito à habitação ficará a depender da vontade dos especuladores imobiliários", perguntou ainda.

Celebrar Abril, defendeu o deputado do BE, "não pode ser uma cerimónia anual" uma vez que se trata de "um compromisso permanente e muito há para fazer".

"As lutas a que hoje assistimos mostram que o espírito de Abril está bem vivo, que não aceitamos que nos digam não, que rejeitamos os impossíveis e as inevitabilidades. Que acreditamos, como no passado, que o poder pode mudar de mãos", lembrou.

Jorge Falcato considerou ainda que "Abril é sinónimo de conquistas", mas, sublinhou "engana-se quem afirma que não é sinónimo de lutas".

"Os interesses instalados moviam-se para impedir os avanços nos direitos e organizavam-se para lançar o terror na sociedade, por vezes com a conivência das forças de segurança, como todos os dias sou forçado a não esquecer. Foi uma bala da PSP que me colocou nesta cadeira por ter protestado contra a realização de uma manifestação da extrema direita", recordou.

O deputado do BE ficou paraplégico em 1978 e utiliza uma cadeira de rodas para se deslocar, tendo o parlamento implementado um sistema que permite que Jorge Falcato suba até à tribuna para discursar, tal como aconteceu hoje.

"Não me silenciaram. Nem a mim, nem ao nosso povo. Construímos a Segurança Social universal, a escola pública e o Serviço Nacional de Saúde. Garantimos do salário mínimo ao direito à greve. Aprendemos que nada é oferecido, tudo se conquista", destacou.

Quarenta e cinco anos depois do 25 de Abril, "há ainda muitos cidadãos e cidadãs de segunda" em Portugal, acrescentou, pessoas "a quem são negados direitos humanos unicamente porque são diferentes e que são sujeitas a uma opressão e exclusão social porque têm uma deficiência" ou pela "cor da pele".

"E, se a minha presença aqui serve para alguma coisa, é para afirmar que é possível vencer esta opressão e exclusão. Que o futuro não nos pode continuar a ignorar, que não deixaremos que isso aconteça", disse.

Na sua intervenção, Jorge Falcato começou por lembrar "o país cinzento e triste" que Portugal era quando nasceu, a que "mais tarde a guerra colonial acrescentaria terror a uma realidade de repressão e censura".

"Esse país acabou a 25 de abril de 1974. Aos movimentos de libertação das colónias, aos ativistas políticos, aos movimentos estudantis, ao movimento operário, aos capitães, a todos e todas que nunca desistiram: o nosso obrigado", enalteceu, perante aplausos de outras bancadas e não apenas a do BE.

Por isso, disse, leva no "peito a memória desse dia inteiro, dessa torrente transformadora quando a esperança andou à solta".